Os transparentes

Os transparentes Ondjaki




Resenhas - Os Transparentes


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Ana Sá 26/09/2022

Um romance complexo, mas revestido de levezas
Vencedor do Prêmio Saramago em 2013, o romance "Os transparentes" (2012), do angolano Ondjaki, retrata uma Luanda pós-independência a partir do protagonismo atribuído a um edifício de sete andares localizado na zona central e degradada de Maianga. Trazendo aquilo que é mais característico da escrita do autor, a narrativa é marcada por um ritmo humano frenético: com Ondjaki nos pegando pela mão, transitamos pelos cantos concretos e metafóricos de Luanda saltando de personagem em personagem, como quem caminha por uma feira cheia de gente e de vozes, sem saber por vezes para onde olhar nem que caminho tomar. Por sorte, em "Os transparentes", o prédio surge como lugar de acolhida não só para as personagens principais, como para o próprio leitor, que encontra nele o refúgio e a pausa na escrita sensível, e recorrentemente bem-humorada, que dá liga a seus tijolos. A peculiaridade da construção está nas águas frescas que misteriosamente mantêm inundado o seu primeiro andar, condição facilmente aceita e bem recebida pelos moradores do edifício. Há ali um conforto e um sentido de unidade trazidos por esse incessante vazamento. Em um dado momento, uma jornalista estrangeira parece fazer o questionamento que, cedo ou tarde, vai passear pela mente das leitoras. O diálogo é autoexplicativo e ilustra o estilo de escrita de Ondjaki:

"- então a água não é um problema?
- mas a água na sua terra é algum problema?".

É curioso atribuir protagonismo ao edifício, sendo que a obra é recheada de muitas personagens, inclusive de um protagonista stricto sensu, afinal há apenas uma pessoa que vai mesmo ficando transparente ao longo da história: Odonato. Doente, ele explica: "- o país dói-me...". Dói em Odonato o clientilismo, a corrupção, a modernidade desenfreada, e assim a luz começa a atravessar seu corpo. Diante de uma cidade (/um país) que conquista a independência para então acabar se transformando numa fonte de exploração de água e de petróleo, Odonato adoece das mazelas sociais e também de desencanto. E nas linhas de Ondjaki, preenchidas de muitas metáforas e alegorias, o prédio é Luanda inteira; Luanda é Angola inteira; e, assim, Odonato é toda a gente, justificando o título no plural: "transparentes". Mas esse "toda a gente" é muita gente mesmo, do contrário o tal "ritmo humano frenético" de que falei no início não faria sentido; para citar alguns: CientedoGrã, JoãoDevagar, MariaComForça, o Cego, o VendedorDeConchas, o Carteiro, o Ministro, o GaloCamões... Só os nomes das personagens valeriam uma resenha! E aí vem parte da complexidade do romance: embora o livro conte com personagens instigantes e bem construídas, Ondjaki não investe com profundidade em cada uma delas, ao mesmo tempo em que as articula perfeitamente ao todo do enredo. Elas é que parecem servir de cenário para uma história sobre Luanda/Angola e não o contrário.

Eu hesitei em escrever esta resenha, pois cheguei a me sentir incapaz de sintetizar "Os transparentes". Ainda me sinto assim. A partir do que eu escrevi até aqui, é bem capaz, por exemplo, que alguém pense: "legal, um livro de um escritor angolano que trata de questões sociais e políticas". Sim... mas não! Quem conhece Ondjaki sabe de sua incrível capacidade de lidar com humor, ironia, sátira, e com a oralidade... Então, em meio a tudo que descrevi, há passagens completamente hilárias (às vezes nonsense, às vezes insólitas), de uma perspicácia que leva a narrativa a um flerte com outros gêneros, como o teatro, a anedota ou a esquete, aliviando o peso das temáticas abordadas. E tudo de forma muito costurada, o que é surpreendente, já que é uma história de muitas histórias. Não há espaço para contar numa resenha a epopéia do Carteiro em busca de um veículo de trabalho, nem para mencionar o cinema mudo-falado-encenado que é instaurado no terraço, nem para comentar as brincadeiras que Ondjaki faz com o português brasileiro, português e angolano. É muita coisa acontecendo simultaneamente num livro breve, é difícil recortar. E aí vem a complexidade do romance novamente: a escrita de Ondjaki é sempre uma conversa boa de se ouvir, mas aqui seu projeto literário passa por uma "bagunça propositada", marcada pela falta de pontuação e de divisão de capítulos. Então, DO NADA, os acontecimentos mudam, o núcleo narrativo muda, os diálogos são outros. De início, é capaz de ter gente que suspeite de um erro de edição no ebook (como aconteceu comigo!) ou que cogite desistir por pensar "WTF tá acontecendo?". Mas o que posso dizer é: vale assumir o trabalho que é reservado à leitora e seguir. A meu ver, o Prêmio Saramago veio, para este livro, em honra à forma e ao conteúdo. Também arrisco dizer que as experiências e os níveis de leitura podem ser bastante distintos, pois o romance pode agradar e desagradar pelos mesmos fatores, mas em todos os caminhos de leitura eu vejo proveito. Eu tirei meia estrelinha porque não sei se gostei do modo como um ou outro estereótipo étnico foi trabalhado, mas isso aconteceu pontualmente, não estrutura a narrativa.

Por fim, eu não quis dar spoiler, mas registro a ameaça de um: o início e o fim do diálogo principal entre o Cego e o VendedorDeConchas é, para mim, das coisas mais bonitas de se ler "devagarinho". O intertexto com a poesia da maravilhosa Paula Tavares (mulheres, leiam Paula Tavares!) é um abraço final. Ondjaki, uma referência também da literatura infanto-juvenil, veste em "Os transparentes" sua maturidade literária.

Obs.: o Ondjaki participa de muitos eventos literários no Brasil, sobretudo no Sudeste. Quem tiver a oportunidade de conhecê-lo, mesmo sem ter lido nada dele, deve aproveitar. Ele é uma pessoa muito gentil e agradável de se ouvir. Saímos desses encontros literários com vontade de nos tornarmos suas amigas!
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Toni 06/09/2021

Os transparentes [2012]
Ondjaki (Angola, 1977-)
Cia. das Letras, 2013, 408 p.

Vencedor do Prêmio Literário José Saramago em 2013, este é um romance de grandes e inesquecíveis personagens, cenas surpreendentes que ficam gravadas como se as houvéssemos testemunhado e, ainda assim, apesar desses contornos tão bem definidos, um romance que se liquefaz em alegorias chamejantes, e onde Luanda inteira parece respirar suas cores, acalentar duras histórias de vida, parir ideias, desafiar-se a si mesma.

A narrativa de Ondjaki corre solta sem pontos finais nas frases, passando como câmera de uma personagem a outra em cortes às vezes bruscos, às vezes sutis, sempre articulando, através desse registro, a fluidez das vidas e histórias que compõem o mosaico de Os transparentes. Grande parte da narrativa acompanha os moradores de um prédio em um bairro pobre de Luanda que, entre tantas outras idiossincrasias, tem o primeiro andar constantemente inundado por águas, um morador que aos poucos torna-se transparente, um cinema-teatro clandestino ao ar livre “de antiga modernidade” que se pretende “oitava arte”.

Política, história e poesia dão-se as mãos neste livro. “O país dói-me…” diz Odonato a certa altura, “a guerra, os desentendimentos políticos, todos os nossos desentendimentos, os de dentro e os que são provocados por aqueles que são de fora…” — e assim tocamos, com o olhar desse homem que começa a se tornar transparente porque deixou de comer para não tirar da boca de seus filhos, nossos próprios corações cansados da máquina de destruição social em que os endinheirados transformaram o mundo. Da exploração do capitalismo ao controle ideológico alienante, a Angola representada por Ondjaki fala também de nosso Brasil, onde “quem manda em tudo isto?” é “gente muito superior”: “– superior... como deus? – não. superior mesmo! aqui em Angola há pessoas que estão a mandar mais que deus”.

Odonato, Xilisbaba, Carteiro, MariaComForça, AvóKunjikise, VendedorDeConchas, o Cego e o Prédio (maiúsculo porque também personagem): todos em alguma medida transparentes e, por isso mesmo, nunca os poderei esquecer. Obrigado, @ondja_ki , por este livro infinito.
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Gláucia 26/06/2014

Os Transparentes - Ondjaki
Meu primeiro livro do autor e foi uma boa estreia. O livro não tem um personagem central, são descritos tipos variados vivendo numa Angola pós revoluções emancipacionistas. A história também não tem um foco bem definido, são tratados temas políticos sutilmente entremeados pelas singelas histórias pessoais de cada personagem.
A narrativa é um pouco poética e divertida, me fez enquadrá-lo num estilo que estaria entre Mia Couto e José Saramago. Também vi certa semelhança com aspectos fantásticos de Gabriel García Márquez. Não estou querendo dizer que houve intenção de se copiar um estilo, isso soaria muito artificial e pouco convincente e não foi o que aconteceu aqui. A leitura foi fluida e gostosa. E Luanda é o Brasil!!

site: https://www.youtube.com/watch?v=VGi-IKSwhes
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Valério 03/07/2015

Magistral
Nunca havia lido nenhum livro escrito por um angolano.
De cara, o que salta à vista é o uso do português de Angola, com várias gírias até então desconhecidas.
A magia de uma língua tão igual à sua, mas ao mesmo tempo tão diferente.
Similar ao que sentimos ao ler Saramago e demais autores portugueses. Mas diferente por ser inusitado.
Ondjaki utiliza as palavras com propriedade. Cada uma delas parece ter sido cuidadosamente encaixada para formar frases que soam como música. Não tanto como Saramago (aí já é querer demais também), mas ainda assim, uma leitura em que bebemos vagarosamente as frases, sentindo as palavras fluirem musicalmente.
Afora a maestria com as palavras, há o enredo. Aqui, há a leve mistura de realidade e realismo fantástico, presente em livros do Saramago (Memorial do Convento) e de Gabriel Garcia Marquez (Cem anos de solidão, entre outros).
Senti que o autor se inspira em Saramago, mas tem seu estilo próprio.
A história acontece em Luanda e tem episódios sofridos, episódios cômicos, episódios que tocam em nossas feridas e que nos aquecem o coração.
Centrado na história de várias famílias que vivem em um prédio e em um governo político que busca a exploração petrolífera.
Linda história. Imperdível e com desfecho fantástico. Até então havia sido o melhor livro que li em 2015.
Até eu ler o próximo livro: "O filho de mil homens", de Valter Hugo Mãe (que eu não sabia ser também Angolano), objeto de minha próxima crítica.
Emanuel Xampy Fontinhas 23/06/2016minha estante
Que coincidência! Estou lendo "Os transparentes" e a minha próxima leitura é "O filho de mil homens". :D




Andrezza.Braga 20/07/2022

Conhecendo
O autor foi me indicado, porém em um outro título?
Comecei com este, em alguns momentos me prendeu muito, mas depois o deixei de lado.
Tem passagens e escrita bem interessante, veremos o próximo, no mais leia para ter sua opinião!
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Priscila (@priafonsinha) 18/04/2017

Uma narrativa envolvente
"- mas quem manda em tudo isto?
- gente muito superior.
- superior... como deus?
- não. superior mesmo! aqui em Angola há pessoas que estão a mandar mais que deus."

Ganhei este livro do Ondjaki no Natal do ano retrasado, demorei um pouquinho pra ler (livros grandes a gente sempre vai empurrando um pouquinho mais pra frente rs), mas sempre com a sensação de que seria uma boa leitura e assim foi!
A história se passa em um bairro de Luanda (Angola), não há protagonista e sim vários personagens especiais com suas tradições, sonhos e esperanças e um governo que parece igual ao de muitos lugares, corrupto e desonesto.
Uma narrativa tão envolvente que nos sentimos vizinhos destes personagens, contada de forma leve e com humor.
Gostei muito, se puderem leiam e conheçam a escrita deste angolano que, com este romance, ganhou o prêmio Saramago em 2013.

"- a verdade é ainda mais triste, Baba: não somos transparentes por não comer... nós somos transparentes porque somos pobres."
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Thais.Carvalho 26/02/2022

No livro, os transparentes são os pobres, que aos olhos dos políticos e dos mais abastados não são vistos mesmo. Conta várias histórias de personagens que moram em um prédio. É muito rico.
DANILÃO1505 09/06/2022minha estante
Parabéns, ótimo livro

Livro de Artista

Resenha de Artista!




Paah 14/07/2017

Livro incrível! De maneiras surpreendentes, Ondjaki nos mostra o cotidiano de um grupo de moradores de um Prédio de Angola e como essas pessoas fazem para lidar com seu dia-a-dia e suas dificuldades. O Prédio é como uma entidade viva e por diversos momentos o autor cita características metonímicas nele, como se fosse mais um dos personagens da história, além do espaço central do livro. Sem pontuação, sem letras maiúsculas e com nomes inusitados, o autor com seu humor sarcástico nos entretém em uma história de personagens que estão lidando com os novos rumos que Angola, principalmente Luanda, estão tomando. Achei o livro muito divertido e me apresentou Angola de um jeito novo que eu não conhecia. Foi melhor do que eu esperava e me deixou aquele gostinho de "quero mais".
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Ladyce 31/08/2017

Gosto da linguagem poética encontrada nos livros de Ondjaki. Nossa língua usada por ele se veste de roupa nova com inesperadas figuras de linguagem, sutil delicadeza e delicioso sotaque angolano. Isso aconteceu tanto nas duas obras que li anteriormente, Os da minha rua e Bom dia, camaradas, como agora na leitura de Os transparentes. É inegável o poder sedutor da voz narrativa do autor. Além disso, Os transparentes tem dívidas a pagar com a obra de Gabriel Garcia Marquez, se não ao autor colombiano, certamente ao realismo mágico que caracterizou toda uma geração de escritores sul-americanos.

Esta é a história da sociedade de Luanda pós-independência. É uma delação. Mostra os erros, excessos e abusos no sistema político implantado. Francamente, não mostra nenhum benefício. Para retratar essa realidade, Ondjaki nos apresenta a um edifício de sete andares, no centro de Luanda, que exerce o papel de espinha dorsal da narrativa, pois é o lugar de residência de grande parte dos personagens. A ação se dá dentro e fora do edifício e compreende um grande número de tipos. Muitos deles são identificados por cognomes ou nomes curiosos como Amarelinha, AvóKunjikise e MariaComForça. Alguns o são pelas características de um grupo de pessoas de uma classe social, como O Cego, (que representa os deficientes) O VendedorDeConchas (pequeno comerciante)e O Carteiro (faz as vezes daqueles bem intencionados que trabalham para o governo). Mas o personagem principal leva um nome comum, Odonato, talvez para justificar a consequência incomum de sua condição: começa a ficar transparente. Essa habilidade, no entanto, só existe para as pessoas simples, sem qualquer poder de afetar ou resolver seus destinos. Na Luanda pós-independência, as pessoas podem se tornar transparentes pela fome, pobreza e desemprego.

Essa alegoria é um achado. Faz sentido, em Angola, aqui no Brasil e em muitos outros lugares: os pobres, os desempregados, os sem-teto são todos transparentes, invisíveis para a sociedade. E Ondjaki aproveita esse viés e nos mostra uma Angola cruel, fruto de um sistema político corrupto. A objeção que tenho, no entanto, se explica pela simplicidade com que essa mesma sociedade é retratada. O maniqueísmo, a dualidade sem nuances entre os bons e pobres desempregados em oposição aos ricos e maus governantes. Essa simplificação da sociedade achei singela e um tanto pueril. São visões simplificadas de realidades complexas que levam, eventualmente, à imposição de sistemas totalitários de direita ou de esquerda. Sociedades como a de Angola, Brasil, França, Turquia ou qualquer outro país são muito mais matizadas, heterogêneas. Na maioria delas grande parte da população está exatamente no meio, sem abraçar qualquer extremo e que mostram atitudes nem boas, nem más. Esperava mais desse autor tão sensível, um detalhamento social com maiores nuances. Nem todo sistema político é totalmente competente ou irrepreensível. Nem tudo é preto no branco, o cinza, aquele terreno social ambíguo, é complexo, mostrando-se em vários tons, abrigando uma multiplicidade de pontos de vista.

Por isso, quando chegamos ao final e percebemos que a esperança sobrevive, essa esperança não dá alento, porque através do texto, a complexidade social da cidade, do país, não foi retratada. As respostas parecem fáceis demais, imaturas. Talvez o conflito entre o novo e o tradicional pudesse ser mais trabalhado, retratado contextualizado. Uma vista d'olhos pelas alegorias clássicas, onde seres humanos são retratados com sentimentos ambíguos e por vezes contraditórios poderia ter fortalecido as ideias do autor.

No entanto, não posso deixar de dizer que o livro seduz. Há mágica e bom humor, mesmo que a teoria por trás esteja arraigada a uma dialética um pouquinho cansada, de classes dominantes contra oprimidos. Vale a leitura porque, acima de tudo, vem de um autor de qualidade, com enorme habilidade de encontrar na palavra certa, a palavra poética. Qualquer assunto fica bem tratado pelo hábil Ondjaki.
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Susan.Kelle 20/06/2021

Foi muito bom conhecer um pouco mais sobre a cidade de Luanda e os luandenses. Pra mim foi um livro triste e poético. Apesar de trazer inúmeros momentos descontraídos e inusitados, e personagens muito muito peculiares, o livro também traz cenas duras do dia a dia de um povo desassistido por seus governantes, assolados pela tristeza de conflitos passados, pela corrupção e pela pobreza. E mesmo com tantas dificuldades o povo ainda segue em frente com esperança e disposto a estender a mão.
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Valéria 08/04/2023

A poesia da vida cotidiana
Gostei muito do livro, mas ele não é pra qualquer um, é um daqueles livros sem trama específica que gira em torno do dia a dia dos seus personagens com as palavras organizada da melhor forma possível.
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V1tror 23/10/2023

Entrando fácil no Top 10 Vida
Simplesmente viajando por todos os cantos de Luanda com esse livro, impossível parar de ler e não dar risada com todas essas histórias.
Maluquice total, trouxe várias perspectivas pra analisar e ler de novo, muito incrível mesmo esse estilo de escrita do Ondjaki.
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Emanuel Xampy Fontinhas 26/06/2016

Amééé
É um livro todo permeado pela água, que está presente mesmo na ausência. O enredo se desenvolve em um prédio onde, ao contrário do que se vê na Luanda pós guerra, as águas jorram no primeiro andar, sem cessar. O prédio abriga uma variedade de personagens e visitantes que servem para enriquecer este romance que é ao mesmo tempo realismo e realismo fantástico. Os enredos e personagens estão unidos de uma forma espetacular, drama e humor em doses certeiras e a presença do Brasil em várias passagens extraídas principalmente de nossas novelas, como as garotas chamadas Ninon e Rosali. Daqueles livros aos quais se devora, sem sentir e que, ao invés de matar a fome, atiça o apetite.
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Samira Oliveira 30/08/2017

Crítica: Desdobramentos da Política e do Imaginário
A obra de Ondjaki se insere no quadro da literatura angolana pós-independência – e só assim poderia ser, pois o escritor nasceu apenas dois anos após a independência do país, acontecida em 11 de novembro de 1975 –, com publicações feitas no começo do século XXI. Afirmar isto não significa dizer que sua escrita desconsidera a produção literária anterior (do período de 1940 a 1975), colonial ou de “pré-independência”. De acordo com Cláudia Neves:

Ondjaki não rompe com a tradição literária angolana: em seus livros, podemos observar o mesmo compromisso com a construção da identidade nacional que é uma das características da literatura angolana(p. 25).

E seria mesmo difícil uma ruptura total; Após a independência, a população angolana tinha de pensar nos caminhos a seguir e construir, de fato, uma identidade nacional. Além disso e como reflexo dos tempos passados, os movimentos que lutaram pela libertação de Angola – MPLA (Movimento Popular de Libertação de Angola), apoiado pela URSS e por Cuba, FNLA (Frente Nacional para a Libertação de Angola) e Unita (União Nacional para a Independência de Angola), ajudados pelos Estados Unidos, pela França e pela África do Sul, por influência dos EUA –, ainda na época de transição de colônia portuguesa para nação independente, deram início em um conflito entre si, por não conseguirem estabelecer um projeto político comum para o país, que se desenrolou na guerra civil, com um fim apenas em 2002. O MPLA acabou assumindo o poder, de forma reconhecida pela então Organização da Unidade Africana (OUA), após derrotar o FNLA e a Unita com o apoio das tropas cubanas. Porém, enfrentou muitas dificuldades, entre elas, uma economia destruída em função do “colapso da autoridade portuguesa, a perda de vidas e a desordem provocada pela guerra civil, bem como o êxodo da maior parte da população europeia até finais de 1975” (WHEELER E PÉLISSIER, 2009, p. 362) e crises internas, que levou a uma tentativa de golpe de Estado em 1977. Com esforços diplomáticos internacionais para dar fim ao conflito – através do Conselho de Segurança das Nações Unidas (ONU) – como por exemplo, o reconhecimento do governo de Angola em 1993 pelos Estados Unidos e com a morte de Jonas Savimbi, líder da Unita, em 2002 – antes disso, no final da década de 1970, a FNLA já havia se dissolvido. Tais acontecimentos históricos de Angola não podem ser ignorados pois eles perpassam e vivem na escrita de Ondjaki, que “apresenta-se como um universo particular, mescla de um mundo em que ocorreram colonizações, disputas de poderes, guerras, lutas, desejo de liberdade, utopias socialistas, poesia, infâncias, árvores, mais-velhos, histórias e estórias”. É a luz dessa mescla que tentaremos uma interpretação de “Os Transparentes” no presente trabalho.

Leia o ensaio completo no Blog Dezoito em Ponto.
Escrito por Samira Oliveira, critica literária e estudante de Letras da USP

site: http://dezoitoemponto.com/2017/07/12/literatura-angolana-ondjaki-os-transparentes-desdobramentos-da-politica-e-do-imaginario/
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