Jackson 07/03/2012
Um das obrigações da academia =( "RESENHA DE “ANÁLISE DE DISCURSO”, DE ENI P. ORLANDI"
A obra “Análise de Discurso: princípios e procedimentos” se caracteriza como uma proposta de reflexão sobre a linguagem, sujeito, história e a ideologia. Desde seu lançamento em 1999, é um dos manuais mais utilizados no meio acadêmico, principalmente nos componentes curriculares que levam a denominação do seu título.
A professora Eni Pulcinelli Orlandi, pesquisadora 1A do CNPq, se consagra como uma das mais importantes linguístas de sua época mediante a recorrente utilização de suas publicações no seio dos diversos cursos de Letras existentes no Brasil.
A obra em questão contém 100 páginas e está dividida em três seções / capítulos (fica a critério do leitor esse tipo de designação), cada um desses com abordagens pertinentes ao campo de investigação de Análise. A autora lança mão de prefácio e conclusão para um melhor encadeamento das reflexões dos leitores.
No primeiro capítulo intitulado “O Discurso”, a autora situa o terreno das discussões, caracteriza seu objeto de estudo e trata de designar e teorizar questões que serão importantíssimas para o curso do entendimento da abordagem. Aqui, Orlandi (1999, p. 17ss) considera, então, as condições de produção de um determinado discurso que compreende os sujeitos, a situação e a memória. Para tanto, diferencia a análise de discurso da análise do conteúdo, dizendo que esta última procura extrair sentidos do texto, enquanto a outra considera que a linguagem não é transparente e vê o texto como uma materialidade simbólica própria e significativa.
O segundo capítulo, “Sujeito, História, Linguagem”, através do próprio título indicia as discussões que são alçadas. Aqui, são demarcadas a conjuntura (percurso) intelectual e a questão de sentido que envolve a Análise de Discurso (doravante AD), os dispositivos de interpretação, bem como os objetos simbólicos que produzem sentido do contexto de leitura/análise. Nesse ínterim, a autora faz um apanhado das Condições de Produção e do eventualmente venha ser Interdiscurso. São consideradas, então, as condições de produção de um determinado discurso que compreendem os sujeitos, a situação e a memória. Esquecimentos, paráfrase e polissemia, formações imaginárias, formação discursiva, ideologia, sujeito e sua forma histórica, são outros conceitos básicos responsáveis pela construção de sentidos que são mobilizados pelos sujeitos que produzem qualquer enunciado.
Também no segundo capítulo, é discutida a noção de ideologia, pontuando sobre como está é concebida pelas ciências humanas e sociais. As digressões da obra faz-nos refletir que na ideologia, não há ocultação de sentidos, mas apagamento do processo de sua constituição. Para Orlandi (1999, p. 49), “o trabalho ideológico é um trabalho de memória e do esquecimento, pois é quando passa para o anonimato que o dizer produz seu efeito de literalidade, a impressão do sentido-lá”. Ela ainda completa argumentando que “é justamente quando esquecemos quem disse ‘colonização’, quando, onde e por que, que o sentido de colonização produz seus efeitos”.
O terceiro capítulo, sob o título “Dispositivo de análise”, é discutida a necessidade de volver o olhar ao fazer analítico e retoma aos pressupostos teóricos que abarcam a questão da construção do dispositivo de interpretação. Também, há uma retomada ao funcionamento ideológico e as características dos sentidos linguísticos.
Em outras palavras, nesse capítulo são apresentados métodos para ordenar o processo de análise de discurso e organizar as aplicações feitas dentro desse processo. É importante ainda considerar que no momento de análise não se deve apresentar uma posição neutra diante dos fenômenos constatados, mas relativizada diante da interpretação. Para isso, Segundo Orlandi (1999, p. 61), é necessário que invista “na opacidade da linguagem, no descentramento do sujeito e no efeito metafórico”. Ou seja, é preciso que o analista considere o trabalho da ideologia, sem se tornar vítima dos efeitos produzidos por ela.
Em sequencia, Orlandi (1999, p. 64) ainda realiza digressões a respeito de procedimentos referentes à constituição e delimitação do corpus, afirmando que este é resultante de uma construção do pesquisador. No tópico “Função–autor”, para distinguir a função enunciativa do locutor e a do enunciador, a autora evidencia o importante papel de Ducrot, enaltecendo que enquanto o primeiro é aquele que se representa como “eu” no discurso, o último é a perspectiva que esse “eu” constrói.
São alçadas, também, as contribuições de Foucault dentro dos estudos da AD. Este, diz que a função autor se limita a um quadro restrito e privilegiado de produtores originais de linguagem. Com base nisso, Orlandi procura estender a noção de autoria para o uso corrente, enquanto função discursiva do sujeito, distinta da de enunciador e de locutor.
Orlandi (1999) argumenta, no momento de sua conclusão, que o percurso percorrido na obra proporciona ao leitor uma fundamentação mínima para uma leitura em Análise de Discurso. A partir disso refletimos sobre o que levaria a autora realizar uma publicação de uma obra que venha se constituir de forma incipiente?
No decorrer da obra, são colocadas classificações e denominações que condizem ao exercício da análise de discurso, bem como os procedimentos passíveis de realização neste contexto. Falta ao livro exemplos práticos, analíticos e demonstrativos. Orlandi, como outros autores, não pode contar com o entendimento fácil e estanque de leitores em formação ou até mesmo com a constante destreza dos docentes que utilizam esse material em suas salas de aula.
De qualquer forma, entendemos que o que foi apresentado pela autora e a forma como esta discutiu e exemplificou os princípios teórico-analíticos da Análise de Discurso, poderá - após um árduo processo de leitura e entendimentos dos preceitos expostos - possibilitar de forma concreta e eficaz que nós leitores nos situemos melhor no confronto com a linguagem e, com ela / por ela, entender o mundo de ideias que esta (per/dis) corre.