Resenhas - A menina sem qualidades

Bruno F Bertoni 23/09/2013

Extraordinário!
Demorei um tempo para ler ele por inteiro, primeiramente pela falta de tempo, mas também por ser um livro que exige ser digerido. Não é uma leitura simples, e justamente por isso é um dos livros mais interessantes, inteligentes e transformadores que já li.

Escrito com todo o cuidado que eu consigo imaginar, A Menina Sem Qualidades é rico em referências de todos os tipos. A autora ilustra a humanidade como uma máquina, tanto que em várias passagens de sua obra, ela menciona computadores para reforçar essa analogia.

Ada é uma garota excepcionalmente inteligente e crítica que vive em uma sociedade cheia de falhas e sem propósito. As pessoas são frias e superficiais, enquanto a garota parece protagonizar neste cenário com a consciência e a visão de uma águia. Marcada por problemas pessoais, ela se posta naturalmente de forma crítica e passiva diante de uma sociedade sem valores morais, éticos e filosóficos, de forma que passa ela própria a querer mergulhar neste mundo, com seu colega Olev, para experimentar até onde pode ir a capacidade humana de se testar a fim de se transformar. Para isso, os dois tomam Smutek, um professor, como objeto de experiência em seu jogo sádico, frio e cru.

Muitas citações do livro me fizeram parar para pensar, repensar e relê-las. A Menina sem Qualidades é, sem dúvidas, uma esplêndida crítica a sociedade contemporânea na qual vivemos, promovendo um pensamento crítico transformador. Impossível ler e não mudar alguns conceitos dentro de si.

Se você está acostumado a leituras complexas, irá devorá-lo em semanas. Se, assim como eu, está habituado a leituras mais superficiais, terá um delicioso choque térmico em seu cérebro, e não conseguirá ler outra estória que não seja tão nutritiva.

P.S.: Não se deixe iludir pela série. O livro tem muito mais conteúdo e é muito mais interessante e cativante.

Badi 05/07/2013

A filosofia de uma sociedade sem valores
Uma narrativa artística acerca da ausência de valores, da perda da moral, da ética, da negação com-todas-as-palavras da alma: É disso que se trata "A menina sem qualidades", um texto altamente intelectual e filosófico que rechaça sem piedade a sociedade contemporânea.
Dois adolescentes, Ada e Alev, providos de inteligência acima da média - em que aliás a maior parte do tempo supera a de seus superiores, se não todo o tempo - fazem de Smutek, ex-refugiado polonês e professor do Ernst Bloch, vítima de seu jogo. O jogo em questão abrange as questões principais do livro: a moral e a ética. Até que ponto um professor é capaz de fazer aquilo que a sociedade considera impróprio, a fim de evitar uma possível tragédia pessoal e profissional que é polida através da chantagem contínua? Até que ponto uma adolescente é capaz de seguir com esse jogo, ignorando todas os valores sociais, a fim de, de certa forma, testar sua capacidade de não-ser e não-sentir?
Ada possui uma genialidade surpreendente, e suas palavras giram em torno de afirmações acerca de seu niilismo, sua falta de alma e de qualidades. Desde o início do livro, a autora reforça também a falta de beleza física de Ada. Ela pode ser descrita como um patinho feio perigosamente sarcástico e cheio de sabedoria. Alev é um adolescente igualmente inteligente, que compartilha de ideias semelhantes as de Ada, além de possuir a "sede por jogo" que dá forma a história do livro. É um personagem marcante, que carrega consigo o sadismo, a frieza e principalmente, uma capacidade exuberante de manipulação. Juntos, esses adolescentes formam uma parede de tijolos niilistas - ou, melhor dizendo, formam um exército de dois elementos formado pelos "bisnetos dos niilistas". A relação dos mesmos com Smutek, um ser profundamente humanista, inimigo do cinismo e do pessimismo - o que faz dele a vítima perfeita Do Jogo - coloca o cimento que falta para erguer o muro do Castelo Ausente, dilacerado pela falta, moldado pelo cinismo, sadismo e desejo sexual, e abraçado, ainda que no fim, pelo positivismo de um sentimento "de verdade" - ou somente positivo.
"Se os niilistas pelo menos ainda acreditavam que existia alguma coisa na qual podiam não acreditar, Ada e Alev, bisnetos dos niilistas, acusam até mesmo a inexistência de valores e de moral a desprezar". Essa é uma frase do Posfácio do livro, citada muitas vezes durante a história e que explica muito bem a natureza dos pensamentos de Ada e Alev. Eles formam o casamento da Ausência Generalizada em sua forma nua e crua.
Apesar da linguagem complexa, recomendo a todos os interessados em política, filosofia, psicologia, ou mesmo aqueles que somente buscam por um bom romance, a leitura de "A menina sem qualidades". É um livro que promove a reflexão, um texto cujas palavras bem trabalhadas cravam lugar em sua mente e trabalham, moldam, ensinam. Romance surpreendente e repleto de citações poéticas - assim como a obra "O homem sem qualidades" de Robert Musil, que é altamente citada no decorrer da história - que, assim como diz a sinopse "reflete o status quo da nova Europa".

site: www.ondevivemaspalavras.com.br

Cristiane 21/11/2022

A menina sem qualidades
Ada é uma adolescente tentando se adaptar a um novo colégio, ao divórcio da mãe e as mudanças que a sociedade alemã enfrenta. Conhece Olaf que faz parte de uma banda de rock Os orelhas. Ela é atacada no banheiro porque intimida as "patricinhas" do colégio. Não recebe apoio de Olaf. A relação com Olaf se deteriora depois que ela tenta ter relações sexuais no dia do aniversário dele. Coisa combinada com os amigos da banda.
O professor lindão de alemão organiza uma equipe de corrida. Vê Ada correndo e convida a aluna para fazer parte da equipe.
No ano seguinte surge Alef, um novo aluno, metido à besta que vai usar Ada. Primeiro vai cativa-la, até que ela se apaixone por ele. Depois irá propor um jogo: Ada conquistará o professor de alemão. Alef irá fotografar os dois juntos fazendo sexo e irá chantagear o professor. Aí o negócio começa a feder...
É um romance cheio de referência interessantes desde o clássico alemão: "O homem sem qualidades", Lolita do Vladimir Nabokov, as músicas de Evanescence e muitos outros...

Aline 28/05/2013

A Menina "com" qualidades.
Na verdade vim aqui não para resenhar o livro porque ainda não o li, mas para citar uma frase que escutei na adaptação para t.v. dessa história produzida pela MTV Brasil. Como não li o livro, não tem como eu comparar a série que estou assistindo com o original, criado por essa autora alemã. Achei essa frase bonita, não sei se está no livro ou não, mas gostei. Serve para os clássicos da literatura e para os livro modernos. Vamos lá, a frase é a seguinte: "Se vocês forem capazes de ler certos livros, serão capazes de ler qualquer coisa. Se conseguirem compreendê-los, poderão compreender tudo.Se forem capazes de falar sobre esses livros, poderão falar sobre qualquer coisa". A frase foi citada no 1° capítulo da série e expressa muito bem a força que alguns livros tem sobre nós. Sabe, aquele livro que te marca, que te faz refletir sobre suas atitudes e sobre o mundo? Então, esse livro. Inclusive, essa história é repleta de citações de histórias famosas e seus autores. Vou continuar acompanhando a série, que me pareceu bem interessante, apesar de ser um pouco perturbadora, e pretendo ler esse livro na primeira oportunidade que tiver, porque além de ter uma pilha de livros aqui em casa pra mim ler, existe outra pilha de livros em minha mente que pretendo comprar, e além de tudo isso, ainda achei o preço dele um pouquinho salgado. Bem que, com o lançamento da série, podiam baixar um pouquinho né? Mas, enquanto isso não acontece, vou lendo meus livros e acompanhando a série pela MTV ;)

Bruno 25/08/2013

Crepúsculo para pseudo intelectuais
A melhor definição para esse livro é um "Crepúsculo Intelectualizado".

A autora faz um pastiche de Nietzsche e cruza referências literárias. Há ainda o posfácio para tentar evitar que um leitor, ao final, chegue à conclusão de que a autora só produz entulho poético, literário e filosófico.
Mas uma coisa é certa, como a capa do livro diz é de fato uma crítica feroz à sociedade contemporânea na qual foi possível gerar alguém capaz de escrevê-lo.

Cristina Henriques 27/02/2014

Trechos do posfácio de Marcelo Backes:

"Trivialmente, ele (o enredo) poderia ser assim resumido: uma aluna precoce, Ada, de namorado impotente, Alev, seduz um professor de educação física gostosão, Smutek. O namorado impotente filma a cena para em seguida chantagear o professor. O dito professor, másculo e viril, acaba se apaixonando pela adolescente entediada e dá uma surra e tanto em seu namorado pornógrafo. Em seguida, o processo..."

"A menina sem qualidades é a história da relação obsessiva entre Ada e Alev, da disposição de ambos ao jogo nas fronteiras da moral, de sua compulsão à experimentação pérfida com as reações e sentimentos humanos."

"A menina sem qualidades focaliza a questão da (in)existência objetiva do justo e do injusto, balizada nas tentativas vãs do direito em fechar as portas para a injustiça num mundo que perdeu completamente a orientação. A pergunta central do romance é: em que medida a ação humana pode ser prevista e influenciada? E é essa a pergunta que constitui o fundamento do jogo de Ada e Alev, os personagens centrais da obra; e ela por sua vez acaba se desmembrando em outras perguntas: em que medida a vida pode ser contemplada como um jogo, quais os meios permitidos nesse jogo e onde o jogo pode acabar, ao final das contas?"


Fiquei assustada com a crueza desses personagens. É um livro duro, mas que faz entender muito das notícias diárias que você considera absurdas. A falta de moral dos personagens é vista diariamente nos crimes envolvendo jovens e adolescentes. Ada e Alev são retratos bem possíveis dos jovens atuais. Fazia tempo que não lia algo assim, que me trazia um desconforto, uma estranheza...
Não foi uma leitura fácil. É um livro de leitura lenta por ter várias informações subentendidas. Muito está nas entrelinhas. Mas muito está também escancaradamente claro, como a falta de vínculo com o mundo, com a sociedade e com a família.

"Que tal se para eles Bíblia, Constituição e Código Penal não tivessem mais validade na condição de manual e livro de regras para um jogo coletivo? Se eles entendessem política, amor e economia simplesmente como competição? Se "o bom" para eles fosse nada mais do que eficiência máxima sob o mínimo risco de perda e "o mau", ao contrário, nada mais do que um resultado subótimo? Se não entendêssemos mais suas razões, porque elas já não existem?"

"Se isso tudo for apenas um jogo, nós estamos perdidos. Se não - mais do que nunca."

Claudia Cordeiro 13/07/2013

Definitivamente um livro para quem gosta de filosofia. Como eu detesto, achei bem chatinho.

Bia 12/10/2020

Um livro denso, de leitura difícil e que me trouxe diversos sentimentos conflitantes.

O tema geral do livro poderia muito bem ter sido utilizado em um romance adolescente com bem menos páginas e menos complexidade; porém a autora utiliza esse tema, embasada em diversos questionamentos filosóficos e trazendo elementos de outras obras também da filosofia pra trazer uma história única e atual. A narrativa tem como pano de fundo a Europa no início do século XXI, e traz as questões históricas da época à tona (como os atentados terroristas e as guerras justificadas como respostas à esses atentados, por exemplo), só que podemos observar que esses assuntos continuam presentes em nossa vida até hoje, mesmo após 16 anos desde a publicação do livro.

Enfim, assim como quando vi a série, essa obra ainda vai permear na minha mente por pares de dias. Aliás, a série que é inspirada neste livro é extremamente fiel, e até os diálogos são os mesmos. Resolvi ler o livro por curiosidade, mas não havia necessidade pois apenas o capítulo final não fez parte da série.

Filino 25/12/2020

"vivaojogo"
Pelo título já nos remetemos ao "Homem sem qualidades", de Robert Musil. Eu (ainda) não li essa obra, mas "A menina sem qualidades" ora objeto de apreciação, em muitos momentos, vale-se desse livro de Musil como fio condutor.

Juli Zeh escreveu um relato "pesado", por assim dizer. Retrata os bisnetos dos niilistas, uma adolescente e um "adulto" de 18 anos (retratado como impotente e, de certo modo, multicultural) que demonstram maturidade, frieza e (sobretudo) uma ausência de valores que não se vê comumente por aí. Conflitos entre gerações, entre valores... em suma, embates entre mundos distintos é o que lemos nessas páginas. Acontecimentos que podem chocar os leitores mais sensíveis acontecem com certa frequência. Tudo isso recheado com questões filosóficas tipicamente pós-modernas.

Sobre a edição em si: a partir do trabalho de Marcelo Backes, o texto não é apenas traduzido para o leitor de língua portuguesa: ele também é explicado. Backes confeccionou não apenas um glossário em que explica suas opções de tradução (deixando entrever a riqueza desse trabalho), mas também explica determinadas passagens e remissões presentes no texto. Desde o "Cui bono", passando pelos "santos de gelo", até o Dream Theater.

Estranhamente não é um livro muito mencionado por aí. E mais alarmante é o fato de eu tê-lo adquirido numa liquidação, numa livraria, por uns vinte reais, quando o vi junto a outras obras de qualidade (muito) inferior.

Biblioteca Álvaro Guerra 19/09/2023

Em uma escola do extremo oeste alemão, na cidade de Bonn, se desenvolve a história de uma obsessiva dependência entre Ada e Alev, dois jovens estudantes que constroem uma relação de amizade capaz de ultrapassar todas as fronteiras da moral, da compaixão e das relações previsíveis.

Livro disponível para empréstimo nas Bibliotecas Municipais de São Paulo. Basta reservar! De graça!

site: http://bibliotecacircula.prefeitura.sp.gov.br/pesquisa/isbn/97885224583189788501079152