Gustota 26/06/2014O lado B da juventude japonesaJá vi romances de formação e já vi romances de junkies, mas acho que esse é o primeiro romance de formação junkie que eu li. Se você já leu Christiane F., assistiu Kids, Gummo, Drugstore Cowboy e variáveis, você conhece bem aquela vibe de grupos de adolescentes niilistas, filhos da geração hippie, vivendo uma vida sem eira nem beira entre uma overdose e um orgasmo. Azul Quase Transparente segue essa linha com todos os bons clichês do gênero, com o diferencial da sensibilidade japonesa da narrativa.
Ryu, o protagonista, parece ser um sujeito sensível imerso até o pescoço numa existência dolorosa de prazeres inconsequentes adolescentes que sucederam a era Flower Power. Desacreditados com a geração paz e amor e fortemente influenciados pela cultura americana que fingem desprezar, o grupo de Ryu vive à beira de uma base norte-americana, da qual não escondem um escancarado racismo e xenofobia. Entretanto, são eles que conseguem as drogas, sempre em troca de uma festa e dos corpos das jovens (e de alguns jovens também). Ryu é uma espécie de "dono da festa"; convence as meninas a irem, convidam os soldados negros, participa das orgias e usa o dinheiro para realimentar o ciclo vicio de drogas, ócio, rock psicodélico estrangeiro e monotonia da vida sem sentido deles.
No entanto, são os lampejos, líricos e existencialistas de Ryu que dão a beleza ao livro; a forma como observa sinestesicamente sua vida, onde consegue observar beleza até mesmo das variações de gradação do sangue de insetos esmagados (aliás, metáfora constante da narrativa, onde não dá pra saber mais quem é o inseto e quem é o humano, suas viagens com ácido, a beleza de uma chuva, de um avião do exército americano sobrevoando a estrada à noite, os únicos momentos de lucidez dolorosa do protagonista.
Esse livro é interessante para observar o lado b do Japão e ver também outro tipo de narrativa jovem, diferente de como Haruki Murakami, que é um grande ícone e expoente desse gênero o explora.