Vagner46 23/03/2015Desbravando O Duelo dos ReisEssa resenha contém spoilers dos livros anteriores.
E finalmente chego ao fim da trilogia A Primeira Lei. Confesso para vocês: não terminava uma série há MUITO tempo. A gente vai lendo e lendo vários volumes de várias séries diferentes e esquece de terminar uma por vez. Acontece com a maioria dos leitores, acredito eu...
"- Aprendi todo tipo de coisas com meus muitos erros - comentou Cosca, que esticou o pescoço e o coçou. - A única coisa que nunca aprendi foi a parar de cometê-los."
Só para relembrar alguns fatos do final do 2º livro: ao Norte, a fortaleza de Dunbrec foi recuperada pelos guerreiros da União e agora Bethod foge mais ainda para o norte, procurando um local propício às suas armadilhas. Cabe a West e os nórdicos que se juntaram a eles (como o grupo de Cachorrão) irem atrás dele e terminar de uma vez por todas com a ameaça de Bethod. Um reencontro muito esperado acontece nesse livro, já aviso, além de velhas ameaças ressurgirem, como é o caso do gigante Fenris, o Temível.
Na Borda do Mundo, Bayaz e seu grupo chegaram aonde queriam, mas não encontraram a tal Semente (Abercrombie desgraçado, só trollou os leitores). Resta voltar a Adua e tentar encontrar uma solução para o avanço dos gurkenses. Gurkenses esses que, por sinal, retomaram o controle de Dagoska logo depois do nosso torturador Glokta ter escapado de lá a mando do arquileitor Sult.
"Grandes jornadas começam com pequenos passos, como o pai de Logen sempre dizia."
Nesse desfecho, finalmente entendemos mais sobre o que é a Primeira Lei e quais são as suas consequências, sendo elas boas ou más. Tudo depende do ponto de vista, é claro. Novas perspectivas da magia são apresentadas, fantasmas do passado aparecem para atormentar a vida de alguns e os demônios do Outro Lado parecem estar voltando. Bayaz seria a pessoa mais indicada a mexer com esses poderes sobrenaturais. Ou não? Leia e descubra! ;)
Uma boa parte desse livro concentra-se na Ilha do Mundo, onde a capital Adua sofre com a morte do rei atual e prepara-se para uma briga ferrenha nos Conselhos Aberto e Fechado para que se possa escolher o próximo governante. Tudo é jogo político, amigo. Adicionado a isso o iminente avanço das tropas gurkenses contra a União, que parecem não ter gostado de ficar somente do lado de lá do oceano e agora viram suas lanças para a capital Adua.
Mas quem acaba roubando a cena, como sempre acontece, são os personagens Sand dan Glokta e Logen Nove Dedos/Nove Sangrento. Os dois são exímios personagens, extremamente bem construídos e com qualidades e defeitos de um ser humano comum (mais defeitos, por sinal).
Glokta é a personificação pura do humor negro, é impossível não dar risada com os pensamentos dele (grande sacada do Abercrombie ao colocá-los em itálico durante a narrativa) e não sentir dor no próprio corpo quando o torturador sobe alguma escada ou tenta mexer as costas. Isso é algo intrigante e diferenciado nas obras atuais, acostumadas a nos trazer personagens clichês demais.
Logen é um brutamontes nascido para matar, odeia estar no comando (porque sabe que só coisas ruins acontecem nessa hora), mas não foge de uma boa disputa. Sua outra personalidade, o Nove Sangrento, aflora nos momentos mais tensos, e o problema é justamente esse. Quando todos precisam do Nove Sangrento ele está lá, pronto para matar... o que estiver pela frente. As consequências dos atos do Nove Sangrento são monstruosas.
- Brinque de ser o homem bom se quiser, o homem que não tem escolha, mas nós dois sabemos o que você é de verdade. Paz? Você nunca terá paz, Nove Sangrento. Você é feito de morte!
Mas e o Jezal dan Luthar? Ah, aquele guri mala e mimado lá do primeiro livro (O Poder da Espada)... Nada que uma porrada de maça na sequência não resolva alguns dos seus problemas de civilidade!! Preparem-se para se surpreender muito com esse personagem e com os rumos que ele acaba tomando. Foi algo que eu nem imaginava, diga-se de passagem.
Não posso esquecer de comentar sobre a Ferro também, uma personagem forte e decidida, buscando apenas um objetivo: vingança. Mesmo que isso a faça abandonar as (poucas) coisas boas que aparecem na sua vida. Ardee West, irmã de Collem West, acaba tendo um destino inusitado (alguns irão gostar e outros não, mas enfim), ao contrário do seu irmão, que provou ser um dos personagens mais ambíguos e inconsequentes de toda a trilogia.
Percebe-se claramente a evolução de Joe Abercrombie em toda a trilogia, refinando a sua escrita e tornando a leitura muito agradável. Com colocações pontuais a respeito da mitologia por trás de todos os magos e cidades envolvidos na trama, Abercrombie consegue nos brindar com um livro melhor que o outro, mostrando que tudo pode ser melhorado. O único porém foi o autor ter usado um pouco demais o tell nos seus livros. No caso, apenas contar o que aconteceu e não mostrar-nos 'ao vivo'. É aquela máxima do show, don't (just) tell, o que acaba deixando uma sensação de vazio em algumas partes. Certamente umas 50 páginas a mais por livro fariam muita diferença.
Gostei do destino de vários personagens e não curti tanto o de outros, ficando com aquela sensação de que a narrativa poderia ter continuado só um pouquinho mais, já que ainda parece haver coisas para se contar e se revelar (benditas pontas soltas). Muitas coisas intrigantes acontecem nesse 3º livro, algumas delas acompanhadas de revelações surpreendentes, capazes de deixar o leitor mais desavisado de queixo caído. E, não esquecendo de comentar, teremos várias traições por todos os lados possíveis. Um temperinho a mais para acirrar os ânimos no Círculo do Mundo.
A trilogia certamente agradará àqueles fãs de fantasia que gostam de um mundo mais real, mais verossímil, com personagens cinzas e passíveis de punição. Fica a recomendação!
"O poder torna todas as coisas certas. Essa é a minha primeira lei e a última. É a única lei que eu reconheço." - Bayaz, o Primeiro dos Magos
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