Idea 07/04/2010
Avaliação de Roseli Braff de As Sete Sombras do Gato
O livro apresenta vários elementos do fantástico tradicional à La Poe: o violoncelo comprado na loja de antiguidades, o dia sempre chuvoso, o vulto sem rosto que aparece em sonhos, a maldição da
música que acompanha obsessivamente os personagens e o emparedamento a que o pobre apaixonado João usa como recurso para possuir eternamente sua amada. Penso que as mulheres presas no bojo dos violoncelos também sejam vítimas desse artifício tão engenhosamente descrito. Não faltam elementos do romance noir, a exemplo do submundo representado pelo bairro oriental em que circulam os cruéis irmãos China (duplos), além do gato (que tem 7 vidas metamorfoseadas nas 7 mulheres demoníacas) e das cenas de horror que Gioconda e suas amigas proporcionam ao delegado.
O que mais me impressionou, no entanto, foi a duplicidade (tema que
estudo há algum tempo e que considero fascinante). A narrativa circular propiciou a construção de vários casos de duplos, que, especularmente, derivaram outros, resultando na duplicação de Lúcifer, do violoncelo, das mulheres sedutoras, e na transformação
lenta e gradual de Silvestre, que assume não só a personalidade, mas apodera-se do corpo do delegado e amigo José. E o círculo macabro continua...
As noivas de Faust continuarão a enfeitiçar os desavisados amantes de Bach, que, como Fausto (tanto o de Goethe, como o de Thomas Mann), vender-se-ão ao demônio a fim de gozar o imensurável prazer da música.
Não se trata apenas de um suspense policial, como alguns apressados
batizariam o livro; ao contrário, a narrativa engloba uma riqueza de subgêneros: policial, noir, fantástico, suspense, que enreda o leitor em sua teia do início ao fim.
*** Esta avaliação foi feita por Roseli Braff, esposa do escritor Menalton Braff.