Lina DC 03/01/2014O livro é, de modo geral, dividido em três momentos. No prólogo, o autor nos leva à Grécia Antiga para observamos a maldade de uma pessoa e o castigo que Zeus concedeu.
"Os acontecimentos terrenos que se relacionam com as fases da Lua caminham por gerações através das crenças populares. Muito antes da ciência, esse astro era usado como guia de tempo, direção e colheita. A influência da Lua, por mais confusa que possa parecer, merece sua devida atenção". (p. 23)
O segundo momento ocorre a partir do ano de 1893, quando Bastiano Cesari e sua família, formada por sua esposa Clemenzia Giardini Cesari e suas seis filhas chegam ao porto de Santos. Bastiano é um imigrante italiano, e como tantos outros imigrantes da época veio em busca de uma vida melhor. Trabalhador, honesto, um pai e marido amoroso. Uma família que vive a felicidade plena, mesmo com a vida simples que levam.
Após conhecermos Bastiano e a sua família, a história dá um novo pulo no tempo e vamos parar no ano de 1920, na Vila Socorro, no interior de São Paulo.
Mortes violentas estão ocorrendo e o alcaide da vila, seu Ronaldo Magalhães não sabe mais o que fazer. Várias teorias são elaboradas, das mais simples até as mais fantasiosas, mas ninguém sabe exatamente quem ou o que é o responsável pelas mortes.
"De acordo com o livro de Plínio, os Cynocephali foram uma das criaturas mais monstruosas de sua época e residiram nas montanhas da Índia até a sua extinção. Apesar de viverem em sociedade, com certo grau de organização, muitos dos seus costumes eram selvagens. Latiam para se comunicar uns com os outros, vivam em cavernas, vestiam peles de animais como roupa e caçavam utilizando ferramentas primitivas". (p. 67)
A vila é composta de personagens peculiares, como seu Sebastião, um senhor de 70 anos anos e coveiro da vila, Carlos George, um dos cidadãos abastados da vila, mas que possuí uma personalidade vil, ainda inconformado com a libertação dos escravos e amante de caçadas. Seu filho, Vicente de Arruda Barros, um bom moço, muito correto mas com uma personalidade um pouco branda. Temos ainda Flávia, a melhor amiga de Alana, além da própria Alana e Álvaro.
Alana é filha do médico da vila, considerada um bom partido e seu pai já tem planos para o seu matrimônio. Álvaro, um rapaz simples, calado e muito introspectivo, não tem alto status social nem família, vive do cultivo de hortaliças. Poderia esses dois ter uma chance de um amor duradouro?
E quem é o seu Valêncio, um senhor misterioso que têm teorias bem firmes sobre as mortes, que segundo ele próprio expôs aos moradores, ocorre sempre em noites de lua cheia.
Antes de falar do lado sobrenatural em si, é importante destacar a construção dos personagens presentes na Vila Socorro. Desde aquele que exerce um papel pequeno e humilde na trama, como o coveiro, até aqueles que por serem da alta sociedade são mais influentes nas decisões, todos possuem personalidades fortes e bem delineadas. A construção do caráter de cada um, demonstra ao leitor diversas facetas que sempre existiram na humanidade: cobiça, inveja, ganância, avareza, compaixão, bondade. É essa complexidade dos personagens que contribui para que a trama seja bem desenvolvida.
O lado sobrenatural da trama traz ao leitor uma visão mais selvagem do lobisomem. A vontade da besta contra o homem. Não existe um lado racional na composição do animal, ele é apenas instintos. Graças a isso, algumas cenas são fortes e impactantes, mas muito bem escritas e descritas. Não existe um ar romanceado em torno do mito.
Em relação à escrita, trata-se de uma escrita fluida e dinâmica. O autor soube impor um ritmo agradável, onde o leitor percebe o dinamismo nos momentos de ação, mas também tem a sensação de calmaria nos momentos em que a Vila começa um novo dia.
Um outro personagem que irá ter destaque na trama é Ulisses Canaã, um enviado da capital. Ele traz consigo um tom arrogante, prepotente, um ar de superioridade.
Em relação à revisão, diagramação e layout foi realizado um ótimo trabalho. Existem alguns detalhes no início dos capítulos que enriquecem a trama e a capa possui um ar sombrio que combina com a história.
Um ótimo livro de terror, com personagens marcantes, uma trama trágica e um final surpreendente.
"Acredito que, quando somos pequenos, temos medo do desconhecido; arbustos se transformam em monstros no jardim, sombras se tornam fantasmas nos cômodos da casa, qualquer vento que passa por uma fresta aberta da janela vira um assobio de defunto. Já quando ficamos velhos, temos medo de morrer ou de ficarmos sozinhos. Acho que o medo nunca some, só é transferido das coisas imaginárias às coisas reais que precisamos enfrentar em cada etapa da vida". (p. 32)
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