Thiago Barbosa Santos 18/01/2018
É sobre contar uma história de lobisomem e ser original
As histórias de assombração, do mito do lobisomem, atravessaram gerações e são frequentes no imaginário popular, na tradição do conto oral, na literatura de cordel, enfim, são histórias contatas e recontadas excessivamente ao longo de todo esse tempo. Portanto, o autor que decidir voltar ao assunto, corre grande risco de ser repetitivo, contar uma história já batida. Definitivamente não foi o caso de Marcos de Brito.
O cineasta e roteirista estreou na literatura com "À sombra da lua", um romance que resgata o mito do lobisomen de uma forma original, com um enredo extremamente interessante, que prende o leitor desde as primeiras páginas na história trágica da Vila Socorro, um vilarejo do interior de São Paulo condenado a conviver com a fera amaldiçoada, que nas noites de lua cheia promove a sua carnificina e aterroriza os moradores.
A Vila Socorro é reduto da imigração italiana, recebeu várias famílias, que chegaram ao lugar em busca de uma vida melhor. Entre os imigrantes, a família Cesari. O patriarca é um homem de bem, trabalhador, que ama a esposa e os filhos, mas sofre com uma maldição desde que chegou à adolescência. Nas noites de lua, ele dorme fora de casa, na floresta, para buscar suas vítimas e ao mesmo tempo poupar os familiares de um possível massacre quando está possuído pela fera.
As mortes vão se acumulando na Vila Socorro e a população está em polvorosa querendo uma solução para o problema.
Voltando para a família Cesari, em uma manhã, o cenário encontrado na casa dos italianos foi devastador. A esposa e as seis filhas mortas, dilaceradas, sangue e membros por toda a parte, apenas o pequeno Álvaro, o caçula, vivo, mas sendo perseguido por Cesari, com um machado na mão, tentando atacar o menino (no fim do livro este episódio misterioso foi revelado), salvo pelo padrinho, que chegou na hora e evitou uma tragédia ainda maior. As mulheres foram enterradas, o chefe da família tido como louco e morto pela população. O menino Álvaro foi ficando por lá, cresceu e morou na mesma casa da tragédia, sozinho.
Os anos se passaram e as mortes nas noites de lua cheia continuaram atormentando a Vila Socorro, que tentava buscar explicações para todo aquele terror, e o principal, eliminar o assassino cruel. A fera já era outra, Álvaro, o filho, herdou a maldição do pai.
O livro mostra também um triângulo amoroso entre Álvaro, Alana e Vicente. Este último é um dos homens mais empenhados na Vila em colocar um fim nas mortes. Caçador de mão cheia, ele busca assassinar o ser (desconhecido por todos) que promove as matanças. Alana se apaixona por Álvaro e tem um relacionamento com ele, mas por pressão familiar, acaba aceitando o casamento com Vicente. Álvaro fica magoado ao ser trocado e, ao sofrer a mutação, invade o quarto da moça e a mata cruelmente, devorando sua carne.
O acontecimento gerou uma comoção ainda maior e os esforços para descobrir o segredo deste fenômeno maldito se intensificam, até que o alcaide local pede ajuda na capital, que envia uma importante autoridade de segurança. Uma espécie de exército é formado para combater esse ser assassino. Neste meio tempo, um ex-padre da cidade se dedica a pesquisar este fenômeno do lobisomem e tenta convencer a cidade de suas teorias. A população o ridiculariza, mas depois todos descobrem, da pior maneira, que ele estava certo.
Com o mistério desvendado, Álvaro foi preso e morto no corpo de lobisomem. A Vila Socorro finalmente viveu momentos de calmaria...até a próxima lua. Como foi morto transformado na fera, a maldição não foi totalmente desfeita, tanto que na noite em que a bela lua despontou no céu, a besta retornou em forma de espírito e dizimou a população. Poucos sobraram na manhã seguinte. Os que sobreviveram abandonaram a cidade. O ex-padre fez uma oração no túmulo de Álvaro para tentar livrar o rapaz de vez desta maldição.
A narração vibrante foi uma bela estreia de Marcos de Brito na literatura. Uma história muito bem desenvolvida e que seduziu centenas de leitores a voltar ao mito do lobisomem e sentirem, ao final da leitura, que se depararam com uma trama original, apesar de o tema ser consolidado.