Água viva

Água viva Clarice Lispector




Resenhas - Água Viva


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Alane.Sthefany 24/07/2022

Água Viva - Clarice Lispector
Devo admitir que fiquei bastante confusa lendo esse livro (muito natural, ao ler Clarice ?), mas esse foi em um nível inimaginável, fiquei com a sobrancelha franzida por tanto tempo, que ao finalizar a leitura, minha cabeça estava doendo. Pretendo reler o livro e ver se a experiência de leitura mude com o passar do tempo, mas o que eu tenho a dizer por enquanto é: Confusão.

Eu gostei bastante da ideia da Clarice querer escrever tudo o que se passa no "instante-já", no momento em que ele ocorre, mas que já não o é mais, quando tenta descrevê-lo:

"Estou tentando captar a quarta dimensão do instante-já que de tão fugidio não é mais porque agora tornou-se um novo instante-já que também não é mais."

Li uma resenha, em que uma menina dizia que o livro incomodaria pessoas organizadas, por não possuir uma ordem, muito menos uma lógica racional.

Pelo fato do livro ser escrito através da narrativa de uma pintora, e que iremos nos perder em meio às palavras, pensamentos e devaneios dela.

É um livro que tenta expor e explicitar o que se passa dentro da mente no instante-já.

Em busca de algo inalcançável. Pois como a própria Clarice diz: que de tão fugidio não é mais porque agora tornou-se um novo instante-já que também não é mais.


Trechos Preferidos ?????

Tinha que existir uma pintura totalmente livre da dependência da figura ? o objeto (...)

Tenho um pouco de medo: medo ainda de me entregar pois o próximo instante é o desconhecido.

Estou tentando captar a quarta dimensão do instante-já que de tão fugidio não é mais porque agora tornou-se um novo instante-já que também não é mais.

O instante-já é um pirilampo que acende e apaga. O presente é o instante em que a roda do automóvel em alta velocidade toca minimamente no chão. E a parte da roda que ainda não tocou, tocará em um imediato que absorve o instante presente e torna-o passado.

Mesmo que eu diga ?vivi? ou ?viverei? é presente porque eu os digo já.

Não sei captar o que existe senão vivendo aqui cada coisa que surgir (...)

Quero é uma verdade inventada.

Não sei sobre o que estou escrevendo: sou obscura para mim mesma.

Eternidade: pois tudo que é nunca começou. Minha pequena cabeça tão limitada estala ao pensar em alguma coisa que não começa e não termina ? porque assim é o eterno.

Há muita coisa a dizer que não sei como dizer. Faltam as palavras. Mas recuso-me a inventar novas.

Para onde vou? e a resposta é: vou.
Quando eu morrer então nunca terei nascido e vivido: a morte apaga os traços de espuma do mar na praia.
Agora é um instante. Já é outro agora.

O que não vejo não existe? O que mais me emociona é que o que não vejo contudo existe. Porque então tenho aos meus pés todo um mundo desconhecido que existe pleno e cheio de rica saliva.

Mas há perguntas que me fiz em criança e que não foram respondidas, ficaram ecoando plangentes: o mundo se fez sozinho? Mas se fez onde? em que lugar? E se foi através da energia de Deus ? como começou? será que é como agora quando estou sendo e ao mesmo tempo me fazendo? É por esta ausência de resposta que fico tão atrapalhada.

Antes do aparecimento do espelho a pessoa não conhecia o próprio rosto senão refletido nas águas de um lago. Depois de um certo tempo cada um é responsável pela cara que tem. Vou olhar agora a minha. É um rosto nu. E quando penso que inexiste um igual ao meu no mundo, fico de susto alegre. Nem nunca haverá. Nunca é o impossível. Gosto de nunca. Também gosto de sempre. Que há entre nunca e sempre que os liga tão indiretamente e intimamente?

O futuro é o que sempre existiu e o que sempre existirá.

Estou prestes a morrer-me e constituir novas composições.
Estou me exprimindo muito mal e as palavras certas me escapam.

Terei que morrer de novo para de novo nascer? Aceito.
Vou voltar para o desconhecido de mim mesma

Que música belíssima ouço no profundo de mim.

Nada existe de mais difícil do que entregar-se ao instante.

Segurar passarinho na concha meio fechada da mão é terrível, é como se tivesse os instantes trêmulos na mão. O passarinho espavorido esbate desordenadamente milhares de asas e de repente se tem na mão semicerrada as asas finas debatendo-se e de repente se torna intolerável e abre-se depressa a mão para libertar a presa leve. Ou se entrega-o depressa ao dono para que ele lhe dê a maior liberdade relativa da gaiola. Pássaros ? eu os quero nas árvores ou voando longe de minhas mãos. Talvez certo dia venha a ficar íntima deles e a gozar-lhes a levíssima presença de instante.

Neste mesmo instante estou pedindo ao Deus que me ajude. Estou precisando.
Precisando mais do que a força humana. Sou forte mas também destrutiva. O Deus tem que vir a mim já que não tenho ido a Ele. Que o Deus venha: por favor. Mesmo que eu não mereça. Venha. Ou talvez os que menos merecem mais precisem.

O girassol é o grande filho do sol. Tanto que sabe virar sua enorme corola para o lado de quem o criou.

Realizo o realizável mas o irrealizável eu vivo (...)

É uma infâmia nascer para morrer não se sabe quando nem onde.
ajsjad 24/07/2022minha estante
Tenho essa mesma sensação quando leio Clarice. Os personagens dela são bizarros no que diz respeito à construção psicológica em si. Alguns contos são pura nóia aos meus olhos de estudante de ensino médio ignorante a amadora. Mas ainda assim é isso que faz a escrita dela mais distinta e singular


Alane.Sthefany 24/07/2022minha estante
Luana,

Sim, por isso que eu amo a escrita dela. É muito única, e você encontrará apenas lendo os livros dela, por isso pretendo ler tudo que ela já escreveu.??

Vi que você também está lendo ela, ainda mais o compilado de todas as suas obras. ?


ajsjad 25/07/2022minha estante
Siim. Na verdade, o compilado só junta os contos dela. Mas de qualquer forma, tem um ÓTIMO custo benefício se vc comparar com o gasto que se teria ao comprar os contos separadamente


Alane.Sthefany 25/07/2022minha estante
Luana, Siiim ???

Imagina pagar por cada livrinho de 70 a 100 pág toda hora ? ?

Espero que esteja gostando, o bom que parece ser na ordem de "publicação".

Amo demais ler algo dessa mulher. Como você disse, ela é muito singular na escrita ??


Mikaely7 27/03/2023minha estante
tô assim mulher, mas Clarice sendo Clarice, eu tenho esse livro como começo agora e sinto como se fosse uma experiência de um momento q foi um momento, mas agora se torna outro momento, os intervalos do momento (não sei se consegui explicar aiakakk


skuser02844 23/05/2023minha estante
Quando não conseguir entender o que ela diz, tente sentir, eu faço isso e dá super certo já li até o conto "O ovo e a Galinha"


Sergio.Gouveia 22/07/2023minha estante
Foi exatamente essa impressão que tive! Me causou grande estranheza no início, mas, depois consegui entender a dinâmica por traz de sua escrita e o que a autora queria transmitir.
Então, é isso!
"Estou tentando captar a quarta dimensão do instante-já que de tão fugidio não é mais porque agora tornou-se um novo instante-já que também não é mais."


Carolina 16/11/2023minha estante
Clarice é sentir


MilenaSales00 25/11/2023minha estante
Quando eu lia Clarice mais jovem, não fazia sentido. Lendo hoje em dia, mais velha, eu sinto e tudo se faz sentido dentro de mim.




Giovanna1242 17/05/2021

Acho que em toda a minha vida nunca li um livro tão lindo como esse. Clarice consegue trazer sentimentos e pensamentos que nos acompanham sempre, mas não conseguem ser materializados ou descritos. Essa é a beleza de água viva: um livro sentido, e não apenas lido.
Um livro sem narrativa, mas com tanta coisa a ser dita. Então, aos que me perguntarem sobre o que se trata o livro, deixo o trecho em que a própria autora tenta explicar:
?Não sei sobre o que estou escrevendo: sou obscura para mim mesma. Só tive inicialmente uma visão lunar e lúcida, e então prendi para mim o instante antes que ele morresse e que perpetuamente morre. [...] Ouve apenas superficialmente o que digo e da falta de sentido nascerá um sentido como de mim nasce inexplicavelmente vida alta e leve. A densa selva de palavras envolve espessamente o que sinto e vivo, e transforma tudo o que sou em alguma coisa minha que fica fora de mim.?
Leticia 17/05/2021minha estante
eu sempre quis ler esse livro!!


Giovanna1242 17/05/2021minha estante
Amiga leiaaaa!! Serio, é incrível


Leticia 17/05/2021minha estante
acho que vou comprar!! tá vinte reais na amazon kkkkkk


Leticia 17/05/2021minha estante
comprei kkkkkkk


Giovanna1242 17/05/2021minha estante
Pse!! Comprei ele numa promo dessas tbb kkakakakkkkk tudooo


Amanda 19/05/2021minha estante
KKKKK incentivou o consumismo da Vivianne


Giovanna1242 19/05/2021minha estante
Thats my goal




Marcilio Duarte 22/08/2023

Divagações poéticas e pictóricas que formam um todo coeso
O mais próximo que um livro chegou da pintura concreta/abstrata. Água Viva é uma verdadeiro livro-pintura, uma aquarela fluida, criativamente improvisada do início ao fim. Clarice consegue com sua genialidade levar a experiência do modernismo ao extremo, quebrando ainda mais as convenções estilísticas e literárias. Escreve sem pensar pensando, no instante-já, no pensar-sentir, agindo no ato-imediato da criação, como a pintura. O resultado é mais uma obra-prima, um livro memorável e de leitura obrigatória. ?
Marcia 22/08/2023minha estante
Um ótimo livro. Eu li faz algum tempo


Marcilio Duarte 22/08/2023minha estante
Quando os leitores entenderem que as divagações da Clarice são intencionalmente estéticas, vão deixar de achar sua literatura difícil e hermética... ?


Marcia 22/08/2023minha estante
Verdade. Quando eu li esse livro tive certa dificuldade, precisei reler alguns trechos.


Ana Winchester 22/08/2023minha estante
Esse tá na minha lista!


Marcilio Duarte 22/08/2023minha estante
Você não vai se arrepender ?




perfildesarivadi 26/03/2023

Clarice, você escreve o que sinto?
Essa é uma das primeiras obras que li da Clarice Lispector.
Fora as crônicas, já havia lido e sentido um pouco da genialidade de Clarice, como ela sempre faz você sentir algo tão intenso embora seja impossível se explicar o que acabou de ler.
É assim que me sinto agora que li Água Viva. Parecia que tudo que estava escrito se encaixava neste instante, é instante.
As vezes, bem vagamente lembro de como Clarice me fez ficar uma hora inteira refletindo por apenas uma frase, tão intensa, que causou um efeito estrondoso em meu ser.

'Terei que morrer de novo para de novo nascer? Aceito.
Vou voltar para o desconhecido de mim mesma.'

Talvez não faça tanto sentindo para alguns, eu não sei, qualquer um que tenha lido Clarice sabe bem o peso disso e ainda não consigo explicar o porquê, por que foi tão arrebatador ler isso? Terei que me reinventar sempre?
Tudo bem, Clarice. Você me fez sentir o melhor que não sentia a anos, ou talvez nunca chegue a sentir sem as suas palavras. Começar a ler suas obras nos meus 16 anos, foi a melhor decisão que poderia ter tomado.


Vou colocar alguns trechos que me marcaram em Água viva, ainda não consigo tirá-los da minha cabeça.

"Neste mesmo instante estou pedindo ao Deus que me ajude. Estou precisando.
Precisando mais do que a força humana. Sou forte mas também destrutiva. O Deus tem que vir a mim já que não tenho ido a ele. Que o Deus venhar por favor. Mesmo que eu não mereça, Venha.
Ou talvez os que menos merecem mais precisem."

"Só no tempo há espaço para mim."

"Para onde vou? e a resposta é vou.
Quando eu morrer então nunca terei nascido e vivido: a morte apaga os traços de espuma do mar na praia.
Agora é outro intante. Já é outro agora."

"É uma infâmia nascer para morrer não se sabe quando nem onde."

"Nada existe de mais difícil do que entregar-se ao instante."

"Tenho um pouco de medo: medo ainda de me entregar pois o próximo instante é o desconhecido."
Ana__ 26/03/2023minha estante
Amei! Vc me fez desenvolver um desejo enorme de ler Clarice Lispector.


Lanna R. 26/03/2023minha estante
Que lindo amei de verdade eu tenho 16, mas ainda não li nenhuma obra de Clarice, mas acho que me parece que vou começar possívelmente com esse livro. Ou vc tem algum outro dela para recomendar-me ?


perfildesarivadi 26/03/2023minha estante
Recomendo 'Laços de Família' ou 'Um Sopro de Vida' são obras igualmente impecáveis da Clarice, inclusive, também tenho que ler! Apenas vi recomendações e são os próximos da minha lista.
Recomendo também ler as crônicas, desenvolvi um pouco da minha paixão pela Clarice por elas e não me arrependo nadinha!


Ana__ 26/03/2023minha estante
Tipo de amigas que eu queria kkkk


Lanna R. 26/03/2023minha estante
Muito obrigada linaekiet vou buscar por esses livros na escola ?




amandnnes 11/02/2024

Esperava mais.
Clarice é minha escritora favorita, mas nesse livro ela me deixou a desejar. A leitura não me cativou tanto, mas ainda sim ela sempre tem um jeito de descrever coisas que eu penso e escreveria.

Foi uma leitura díficil e lenta, mas não quis abandonar.
Ocrecio 11/02/2024minha estante
alguma recomendação para iniciantes nas obras dela? Começei com "Perto do Coração Selvagem", ainda não terminei apesar de ter gostado do que li...


amandnnes 12/02/2024minha estante
Leia A hora ds Estrela. Até o momento essa é minha obra favorita dela.


amandnnes 12/02/2024minha estante
Leia A hora da Estrela. Até o momento essa é minha obra favorita dela.


Ocrecio 12/02/2024minha estante
Perfeito! Assisti ao filme e gostei, vou ler. Obrigada pela recomendação!




Amilton Costa 28/07/2021

Lindo poema em prosa
Cada palavra é poesia, os gestos e traços de todos os momentos instigam a relatos poéticos e encantadores. Uma sensível e subjetiva impressão da realidade, do cotidiano e suas intempéries, dúvidas e anseios. Um dos melhores livros de Clarice Lispector.
L. 29/08/2021minha estante
Leio e releio e leio de novo e tudo é novo e é vivo


Amilton Costa 29/08/2021minha estante
Perfeito! Meu livro preferido dela ??


L. 29/08/2021minha estante
Tenho uma tal simbiose com esta autora que parece que tudo que ela escreve, eu poderia ter dito ou pensado. Minha tríade é a hora da estrela, um sopro de vida e água viva...


L. 29/08/2021minha estante
Ficam ao lado da minha cabeceira pq sempre os abro aleatoriamente e mergulho em uma epifania qualquer. E viva clarice!




Tangerina 07/11/2021

Extremamente íntimo. Muito forte, denso e de uma beleza ímpar.

Me causou um certo desespero em algumas partes por conta de algo estritamente pessoal. Foi como um grande mergulho nos meus sentimentos.

?Ah, viver é tão desconfortável?.
Clarice deixa claro, e diz a todo momento em frases líricas, por vezes diretas seu desespero ao grande trabalho que é viver. Viver e conviver consigo mesma. Tão lúcida de si, caminha lado a lado com a loucura.

Posso estar muito enganada quanto as minhas interpretações, mas ouso dizer que a ligação entre ela e o leitor é chocante de tão direta. Perigosa, e tão atraente quanto a ideia de deixar de existir.
Sem rodeios na hora de falar da morte, sua escrita é transparente e amarga.
Os dias se passam, as ideias, teorias e pensamentos flutuam pelas páginas, alguns tão confortáveis quanto o som de um garfo raspando o fundo de uma panela, mas aqui a intenção não é ser bonito, e ser sincero.

Solidão, liberdade, o respiro da alma.
Denise Ximenes 07/11/2021minha estante
Bela resenha. Fiquei instigada. Amo B
Clarice!


Tangerina 08/11/2021minha estante
Muito obrigada! Leia sim, espero que goste tanto quanto eu.


Alberto.Tisbita 24/11/2021minha estante
Que linda resenha! O garfo me deu agonia, quase um arrepio.


Tangerina 24/11/2021minha estante
Hahaha, agradeço demais!




Roberth Glória 13/01/2021

Não acabou como um dos livros que mais gostei da Clarice, mas alguns pontos vou exaltar da obra: é incrível como a capacidade da Clarice na produção de fluxos de consciência ? senti, neste livro em particular, como se ela transcrevesse a realidade dos pensamentos. Assustador, mas de maneira positiva.

Clarice, aqui, faz mais que reflexões introspectivas, mas ela consegue se articular e falar sobre tudo, tocando no âmago da existência das coisas e descrevendo-as. Dentre as características que a Clarice me faz admirar num escritor estão o "falar pouco, mas profundamente" ? nesse livro, ela utiliza da personagem pintora que cria para alcançar mais nesse aspecto. Ninguém consegue "falar pouco, mas profundamente", como ela. Ninguém consegue fazer o que ela fez. Se alguém conseguiu escrever sobre os pequenos atos, complexos como os são em si, foi a Clarice.

O livro não possui um enredo, é apenas Clarice Lispector escrevendo e sendo no texto.
Marcia 01/02/2021minha estante
Qual foi o livro que voce mais gostou? Comecei a me aventurar pelo mundo de Clarice, só li esse e A paixão segundo G.H.


Roberth Glória 09/06/2021minha estante
A paixão segundo G. H é o meu preferido! Outros que amo da Clarice são Laços de Família e a Hora da Estrela


Marcia 20/06/2021minha estante
Preciso reler A paixão Segundo G H pois acho que agora aproveitarei melhor o livro.




Fabio Shiva 13/05/2011

Clarice é irresistível! Bruxa sedutora e poderosa!
Cheguei na metade do livro. E já deu vontade de começar a resenha, pois em tão poucas páginas quantas coisas já me fez pensar!

Ao pesquisar na Internet soube que esse livro inicialmente se chamava “Atrás do pensamento: monólogo com a vida”, e que depois foi renomeado como "Objeto Gritante". Soube também que Cazuza leu “Água Viva” 111 vezes!

Fui pesquisar para saber qual veio depois, se esse ou “A Paixão Segundo G. H.” (e foi “Água Viva” mesmo). Pois a impressão maior é que Clarice continuou trilhando o caminho delineado em “G.H.”, ultrapassando as fronteiras que ela mesma havia expandido, audaciosamente indo onde escritor nenhum jamais esteve...

Ou quase. Sinto uma secreta irmandade entre Clarice Lispector, James Joyce, Hermann Broch, Ferreira Gullar e um ou dois dos heterônimos de Fernando Pessoa (o Alberto Caeiro e o Álvaro de Campos). Irmandade sentida, intuída na poderosa lucidez com que usam as palavras para expressar o que não pode ser dito com palavras...

...é de tirar o fôlego!


Livro Abstrato
Por alguns aspectos, achei “A Paixão Segundo G.H.” superior.

O fiapo de história que conduz essa obra é veículo mais que adequado para as reinações de Clarice. É impressionante o suspense que ela obtém com a repetição da frase no fim e no início de cada capítulo!

Em “Água Viva”, porém, nem esse fiapo existe! Clarice se propõe a escrever um livro como se fosse uma pintura totalmente abstrata, sem nenhuma conexão com algum objeto exterior. Essa proposta é explícita já na abertura do livro:

“Tinha que existir uma pintura totalmente livre da dependência da figura – o objeto – que, como a música, não ilustra coisa alguma, não conta uma história e não lança um mito. Tal pintura contenta-se em evocar os reinos incomunicáveis do espírito, onde o sonho se torna pensamento, onde o traço se torna consciência” – Michel Seuphor

Por essa citação mesma percebe-se que Clarice reconhece de partida que a “pintura abstrata” é, na verdade, impossível, uma meta inatingível. Pois a pintura é sempre figurativa, sempre faz uma referência ao objeto.

Imaginem então a ousadia de Clarice – menina travessa!!! – em escrever um livro que é como um quadro impossível de ser pintado!!!


Paixão Viva

Só por essa audácia o livro já vale a pena. Ocorre que a leitura gera uma certa estranheza no início (eu pelo menos senti), e até mesmo um questionamento da validade de prosseguir a leitura (pois seguindo essa proposta o livro poderia ter só 10 páginas, ou 1.000, e estaria expressando da mesma forma seu objetivo), justamente pela falta desse fiapo condutor.

Acho que Clarice mesma sentiu essa necessidade:

“De vez em quando te darei uma leve história – área melódica e cantábile para quebrar este meu quarteto de cordas: um trecho figurativo para abrir uma clareira na minha nutridora selva.”

O que importa é que, vencida a resistência inicial, Clarice opera a sua magia, abrindo aqui e ali vislumbres do intraduzível, que ela captura não sei por qual magia, não só com palavras, talvez com palavras e silêncios, ritmos, mensagens subliminares...

Não sei como Clarice faz isso. Mas há magia nesse livro!


Pérolas

“Quem for capaz de parar de raciocinar – o que é terrivelmente difícil – que me acompanhe.”

“Depois de certo tempo cada um é responsável pela cara que tem.”

“O que vai ser já é.”

Viva Clarice!!!

(e ainda estou na página 38!!!)

(11.05.11)


A alegria do it

Que sincronicidade Clarice falar tanto de it!

Passei a semana passada pensando sobre isso: não temos em português como expressar o que a palavra it expressa em inglês. Já sabia disso, é claro, mas voltei a pensar no assunto ao ver em um filme a mesma frase que li em um livro do Ed McBain, e dita nas mesmas circunstâncias. Está lá o casal, no bem bom do sexo, e lá pelas tantas a mulher diz para o homem:

“Give it to me! Give it to me!”

Não tem como dizer essa frase em português, com todas as suas possibilidades eróticas e escatológicas. O mais próximo disso fica bem longe, seria o nosso familiar: “Goza, benzinho, goza!”

Por incrível que pareça, dediquei algumas horas e sinapses refletindo sobre esse assunto. Pois perceber algo assim é notar como o nosso pensamento é engaiolado pelas palavras, pelo idioma que falamos, e como é preciso expandir nossa capacidade de pensar para além das palavras.

É claro que tomei como uma prova de que não sou um louco, e sim um sábio por pensar nessas coisas, ao ver a insistência com que Clarice bate nessa tecla do it, e aproximadamente pelos mesmos motivos!


Para entender “Água Viva”

A própria Clarice explica, sem mistério:

“Tente entender o que pinto e o que escrevo agora. Vou explicar: na pintura como na escritura procuro ver estritamente no momento em que vejo – e não ver através da memória de ter visto num instante passado. O instante é este. O instante é de uma iminência que me tira o fôlego. O instante é em si mesmo iminente. Ao mesmo tempo que eu o vivo, lanço-me na sua passagem para outro instante.”

Não é o fluxo da consciência o que Clarice persegue (embora sua prosa acabe de certa forma resvalando no fluxo). O que ela busca é o silêncio entre dois pensamentos. Você já parou para pensar nisso? Entre um pensamento e outro, existe uma interrupção, um salto, um solavanco. Perceber isso é se fazer a essencial pergunta: quem será esse “eu” que pensa meus pensamentos? Onde está esse “eu” no intervalo entre dois pensamentos? Refletir sobre isso liberta de muita ilusão.

Esse é o cerne, creio eu, desta obra tão sui generis!


Momento íntimo

Particularmente tocante é o momento em que Clarice torna o leitor/interlocutor em parceiro das agonias e êxtases de seu processo criativo.

Clarice põe-se nua, não uma nudez majestosa de revista Playboy, mas aquela nudez embaraçosa, que revela fraquezas e imperfeições. Ela ter escrito essas confissões com o peito tão aberto não surpreende. Mas sim ter corajosamente deixado esse trecho tão revelador ser editado e impresso, para todo mundo ler. Ninguém pode dizer que essa moça não é corajosa!

Ler esse livro foi uma aventura intelectual única! Experiência que só foi igualada (e, devo dizer, superada) por “A Paixão Segundo G. H.”, que considerei mais perfeito, mas não menos intenso ou autêntico que “Água Viva”.

Vale a pena passar por essa experiência!

Viva Clarice!

(13.05.11)


Comunidade Resenhas Literárias

Aproveito para convidar todos a conhecerem a comunidade Resenhas Literárias no Orkut, um espaço agradável para troca de ideias e experiências sobre livros:
.
http://www.orkut.com.br/Main#Community?cmm=36063717
Léia Viana 22/05/2011minha estante
A maneira como você descreve a emoção que um livro lhe passa me deixa extasiada!

Clarice é única. Tenho a sensação que ao reler novamente uma de suas obras descobriremos sempre mais, mais de tudo.
Linda resenha, muito bem escrita.


Fabio Shiva 22/05/2011minha estante
Oi querida!
Que bom compartilhar essa leitura tão maravilhosa com você!!!
Valeu pelo carinho e pelas palavras!


Matheus 15/01/2012minha estante
Parabéns pela resenha! Concordo com você em tudo que disse. Esse livro é único!




Lucas 05/06/2020

Instante-já
Esse livro me fez pensar a respeito do presente, o instante-já, sobre o que eu sou (essa foi difícil) e o que estou sentindo. Me fez perceber o quanto o presente é rápido, que mal noto sua presença de modo que nem consigo aproveitá-lo. A personagem percebe o mesmo, tanto que se angustia pelo presente que já é passado, e escreve seus instantes como se estivesse pintando: o pincel desliza pela tela como o lápis ou a caneta desliza pelo papel, apenas seu subconsciente se expressando, sem censura.
Iris 05/06/2020minha estante
Nunca li um livro da Clarice Lispector. Ouvi falar que a linguagem é difícil.. Esse é?


Lucas 05/06/2020minha estante
Olha, eu considero a linguagem difícil mesmo, e eu estou apenas começando a ler as obras dela, então tenho algumas dificuldades, mas acredito que é questão de costume, sabe? E sim, o mesmo para esse livro, mas eu consegui compreender ele, é bem interessante. Detalhe: a Clarice brinca com as regras gramaticais no livro, me confundi em alguns trechos haha


Iris 05/06/2020minha estante
Vish.. Regras gramaticais.. Kkkkkkk to ferrada! Vou esperar mais um pouco pra lê-la ?




Lacrimosa 14/01/2022

sonhei que estava sonhando
uma narrativa profunda e íntima sobre as reflexões da protagonista (ou da própria clarice) e sua maneira singular sobre certos assuntos. fui fisgada pelas reflexões sobre espelhos - que loucura consciente foi aquela? -  e flores e nascimentos e bruxas e duendes e tanto em tanta pouca página que se mistura e entrelaça na minha mente. seu monólogo sobre amar o feio; "eu que odeio domingo por ser oco" - odeio domingos também - foram as partes que mais me tocaram porque eu me vi ali. exatamente ali.
  meu primeiro livro lido dela, uma escritora ao qual eu sempre tive interesse, e posso afirmar com toda a certeza que irei ler outros. a escrita dela... ?. eu amei. amei, amei, amei, amei. é exatamente o tipo de escrita que me toca, e inclusive, achei que teve uma aura de magia.

?°??. perfeito perfeito perfeito perfeito ?°?.
gabriella.malta 14/01/2022minha estante
Que invejinha dessa edição


Lacrimosa 14/01/2022minha estante
nem me fale, minina!!! minha mãe trouxe para mim de uma doação da biblioteca e eu me apaixonei ?


gabriella.malta 14/01/2022minha estante
Amo as edições do círculo do livro




Jorlaíne 24/04/2023

Uma aula de escrita!
Clarice ensina como escrever em fluxo de consciência. Uma escrita extremamente intimista que retrata o existencialismo.
Uma perfeição em forma de livro!
Mas não procure lógica, nem enredo. Aqui o ilogismo impera, assim como em nossa consciência.
Clarice é só A Perfeição??
aartemesalva-nat 24/04/2023minha estante
Quase comprei o livro de cartas dela ontem. Resisti a tentação. Hahaha


aartemesalva-nat 24/04/2023minha estante
Mass, ainda quero ler Claricee


Jorlaíne 24/04/2023minha estante
Você realmente tem que ler Clarice ?. Mas não comece por esse?. Os contos dela são melhores pra iniciar e depois vá de A hora da estrela??




Joana 13/12/2023

"Agora é um instante. Você sente? eu sinto."
"Nada existe de mais difícil do que entregar-se ao instante. Esta dificuldade é dor humana. É nossa. Eu me entrego em palavras e me entrego quando pinto."

Eu tenho a impressão que a Clarice, depois de escrever seus livros, ela relê-los e procura uma parte do texto que melhor se encaixa na definição do que o livro aborda. Água viva.

"água do riacho que treme sempre por si mesma."
"A harmonia secreta da desarmonia: quero não o que está feito mas o que tortuosamente ainda se faz."
"Meu estado é o de jardim com água correndo."

Bom.. acredito que esses trechos definem um pouco da mensagem que o livro quer trazer, mesmo que eles não tenham nenhuma conexão aparente, pois a vida é como uma água correndo em desordem, na harmonia secreta da desarmonia, mas é viva, é o mais puro instante.

"O mundo não tem ordem visível e eu só tenho a ordem da respiração. Deixo-me acontecer."

"Não quero ter a terrível limitação de quem vive apenas do que é passível de fazer sentido. Eu não: quero é uma verdade inventada."

" A verdade está em alguma parte: mas inútil pensar. Não a descobrirei e no entanto vivo dela."

"Mas se eu esperar compreender para aceitar as coisas - nunca o ato de entrega se fará. Tenho que dar o mergulho de uma só vez, mergulho que abrange a compreensão e sobretudo a incompreensão. E quem sou eu para ousar pensar? Devo é entregar-me. Como se faz? Sei porém que só andando que se sabe andar e - milagre - se anda."

Nem tudo precisa ser compreendido , só precisa ser, sentir. Acho que ler Clarice é exatamente isso. Sentir.
Confesso que não é uma leitura fácil, aliás é tudo menos do que fácil e é confusa na maior parte do tempo, acho que no final das contas terei que reler este livro várias vezes para tentar compreender o incompreensível.

"Não se compreende música: ouve-se. Ouve-me então com teu corpo inteiro."
xelaoloc 24/12/2023minha estante
quero mto ler clarice algum dia, ela parece uma diva


Joana 25/12/2023minha estante
A meta é ela virar minha escritora favorita


xelaoloc 26/12/2023minha estante
boto fe viu




Alanna Fernandes 26/12/2021

Dá sufoco só de imaginar o que é ser e sentir como Clarice.

Uma tsunami de profundidades e inteirezas somadas com questionamentos sobre a vida e aprendizados toma conta de nós, nos invade e nos devasta. Mas ainda estamos aqui.
Douglas Finger 28/12/2021minha estante
Esse livro é espetacular e profundamente poético!


Alanna Fernandes 28/12/2021minha estante
Eu to viciada em Clarice


Alanna Fernandes 28/12/2021minha estante
Kkkkkk




Glorinha 30/04/2021

Clarice Lispector: escrita que nunca foi. É.
Registros constam que Cazuza leu ?Água Viva? 111 vezes, inclusive, a música ?Que o Deus venha?, de Cazuza, é baseado neste livro! Surreal!! 111 vezes... Número expressivo se você não leva em conta a sensação que esse livro traz. Desnecessário dizer que é necessário dizer o quão Clarice é genial. Com esta obra não foi diferente.

Clarice discorre um fluxo de consciência surpreendente, vomitando palavas e emoções ao longo do livro, fazendo com que o leitor queira mais e mais e mais. O livro conta a história de uma artista plástica que resolve escrever uma carta para um amor que não deu certo. Mas não tem nada de superficial, ou clichê. A escritora utiliza recursos extremamente filosóficos e cria uma teoria que nos instiga a pensar, até a última página.

Clarice, com seu jogo de palavras impecável, lança um desafio para o escritor: absorver seus pensamentos variados, às vezes quebrados, na narrativa. Além disso, ela tenta fazer com que o leitor perceba a brevidade da vida ? o presente-agora ?. Muito além do ?Carpe Diem?, aproveitar o segundo que ao pensar, já passou.

Trecho importante logo na primeira página, para entender o quão complexa é essa obra: ?(...) Eu te digo: estou tentando captar a quarta dimensão do instante-já que de tão fugidio não é mais porque agora tornou-se um novo instante-já que também não é mais. Cada coisa tem um instante em que ela é. Quero apossar-me do é da coisa. Esses instantes que decorrem no ar que respiro: em fogos de artifício eles espocam mudos no espaço. Quero possuir os átomos do tempo. E quero capturar o presente que pela sua própria natureza me é interdito: o presente me foge, a atualidade me escapa, a atualidade sou eu sempre no já.?. S-U-R-R-E-A-L!!! O clássico é uma leitura obrigatória. Ao ler, ninguém sai ileso. Ninguém sai o mesmo.

Ao tratar da edição: incrível e recomendável. Além da obra ?Água Viva?, a edição conta com ensaios inéditos e uma carta pessoal de um amigo de Clarice. Os ensaios servem para que a gente entenda mais sobre a dimensão da obra e o motivo de Clarice não ter permanecido nem com o texto e nem com o título original, que veio antes de Água Viva. Além de tudo isso, a edição possui manuscritos inéditos da própria Clarice, com detalhes que ela mudou e/ou deixou de colocar, depois que reformulou o conteúdo atual de Água Viva. O livro é um presente. Clarice? Presente.
@freitas.fff 01/05/2021minha estante
O que de mais leve e sutil de Clarice você recomenda pra iniciar? Eu só li dela poucos contos espalhados, maravilhosos. Mas queria um livro inteiro, e são tantas opções.


Glorinha 01/05/2021minha estante
Acho que A Hora da Estrela é um bom começo. Esse livro foi meu primeiro contato com Clarice e fiquei apaixonada no mesmo instante!!


@freitas.fff 02/05/2021minha estante
Obrigado, Gloria, vou adicionar na estante! ?




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