JP 28/05/2011
Estereótipos e inovação na linguagem
Hoje a história parece repetitiva, afinal, nos últimos anos, os seriados de televisão e o cinema têm sido bombardeados por histórias envolvendo a guerra pelo controle sobre o comércio de drogas nos morros cariocas. Mas vale lembrar que "Inferno" foi publicado em 2001 e as favelas ainda eram um terreno quase intocado no universo da ficção. Como quase todos os livros de Patrícia Melo, "Inferno" é violento, tenso e cheio de construções marcadas pela consisão.
Sua linguagem foi considerada inovadora por inserir onomatopéias sem o menor pudor. Termos como "ploc" e marcas de produtos como iogurte e tinta pra cabelo aparecem nas frases e (acreditem) dão coesão ao texto. Há um capítulo em que ela dedica uma página inteira a citar o que há dentro de uma geladeira.
Saindo da análise sintática, "Inferno" narra a história de José Luiz Reis, o Reizinho, garoto pobre, morador de uma favela na cidade do Rio de Janeiro, filho de uma empregada doméstica, que de olheiro aos 12 anos de idade passa a chefe do tráfico do morro em que nasceu. O livro apresenta momentos tensos, hiperrealistas, trabalhados com tintas fortes onde a única intenção parece ser chocar o leitor, como o momento em que Reizinho encontra o pai dormindo embaixo de um viaduto no centro do Rio, ou quando ele diz não sentir o menor afeto pela mãe devido à quantidade de surras que recebeu durante a infância.
O livro traz ainda uma série de personagens que se agregam à trama principal, como Juliana, a patroa da mãe de Reizinho e uma prostituta que vai para a Alemanha depois de se casar com um estrangeiro e retorna ao Brasil em boa situação.
Vencedor do Prêmio Jabuti na categoria melhor romance em 2001 (perdeu apenas para "Dois Irmãos" de Milton Hatoum), este livro demonstra um amadurecimento na literatura de Patrícia Melo e a intenção de explorar as possibilidades de seu estilo narrativo até a exaustão.