Paulo Silas 05/11/2016Ah, a voz dada ao mito. O restabelecimento deste como forma de esclarecimento. A tragédia que se faz como tal apenas enquanto levado em conta o animalesco, o destrutivo, o imperfeito, o caos, o assimétrico. Razão e emoção devem ser uníssonas, pois assim o são enquanto arte, enquanto música, enquanto poesia, enquanto nós, seres humanos. Somente assim, apolíneo e dionisíaco, compreende-se e se estabelece, de fato, o nascimento da tragédia.
Primeiro livro de Nietzsche, onde a preocupação do filósofo se dá para com a metafísica da arte. Em que pese a autocrítica constante na introdução da obra, a qual é justificada por ter o livro se amparado na filosofia de Schopenhauer (que via o mundo como "vontade de representação), autor referencial de Nietzsche até quando da superação dessa primeira fase de sua própria filosofia, o escrito do filósofo toca num ponto importante acerca da interpretação da tragédia.
Nietzsche tece uma certa reconstrução histórica a fim de novamente dizer a tragédia, interpretando de uma maneira própria a cultura grega. A arte e o mito enquanto também formas de conhecimento - para muito além da outrora superação daqueles pela razão. Aliás, a razão, sedimentada por Sócrates, para Nietzsche, estagnou o campo necessário para a liberdade da arte, da poesia, da criação a partir do caos. Daí a necessidade, na forma como construiu nesta obra, de se levar em conta, para além da postura apolínea (pautada na razão, na ordem, na lógica), a posta dionisíaca (pautada na ampla liberdade a partir dos instintos, do caos, da desordem).
Nas palavras do filósofo, "teremos ganho muito a favor da ciência estética se chegarmos não apenas à intelecção lógica mas à certeza imediata da introvisão de que o contínuo desenvolvimento da arte está ligado à duplicidade do apolíneo e do dionisíaco, da mesma maneira como a procriação depende da dualidade dos sexos, em que a luta é incessante e onde intervêm periódicas reconciliações". Os impulsos, assim, são necessário para o criativo - condição necessária para a arte. A metafísica da estética, portanto, é o que expõe, num modo próprio, Nietzsche na presente obra.
Vale conferir!