Veneella 18/05/2014InspiradorImpressionante, real e terrivelmente humano. Esse foi um livro tão marcante que eu continuava pensando na história todas as vezes em que tinha de fechá-lo. Com uma desenvoltura incrível, Sue nos transporta a um período onde as pessoas se tornavam mercadorias por conta da cor de sua pele e de seu gênero, trazendo uma das questões que mais gosto de discutir fervorosamente: O que nos dá o direito de julgar o valor de uma pessoa?
Na história temos Sarah Grimké, filha de uma prestigiosa família escravagista, uma mulher que desde pequena almejava mais do que a sociedade lhe permitia. Branca, rica, livre no papel, mas fadada a ser reprimida por uma cultura que via a ela, e a todas as mulheres, como mais um objeto feito para servir ao homem. Sem voz e sem possibilidade de escolha, vemos seus sonhos serem destruídos, sua determinação quebrada e domada como a um animal, enquanto apenas um fio de esperança se mantém. Através dela, vemos que, muitas vezes, nossos grilhões estão na mente.
“… Por que Deus coloca desejos tão profundos em nós…se não dão em nada?” (…)
“Deus nos enche de todos os tipos de desejo que vão contra a normalidade do mundo. Mas o fato desses desejos com frequência não deem em nada, bem, duvido que seja obra de Deus.” Ela me penetrou com seus olhos e sorriu. “Acho que sabemos que isso é obra dos homens.”
pág. 239
Do outro lado da moeda temos Hetty “Encrenca”, uma jovem escrava que foi dada de presente à Sarah em seu 11º aniversário. A mãe da personagem, Charlotte, é uma escrava esperta que se recusa a aceitar seu destino e que, com o passar dos anos, passa o mesmo sentimento para sua filha. Hetty então se torna uma mulher forte e decidida, e uma das únicas amigas de Sarah. Dessa união incomum, ambas tiram forças para ir contra as correntes que as prendem, e se tornam revolucionárias a sua própria maneira.
Depois de um tempo, desci pro porão. Quando mamã viu meus olhos vermelhos, ela disse: “Ninguém pode escrevê num livro o quanto ocê vale”.
pág.101
Durante a leitura, nos vemos divididos entre dois tipos de prisões e questionamos o significado de liberdade. Com uma escrita marcante e característica, a autora nos traz uma história sobre superação, luta e determinação. Ambas as personagens se tornaram escravas da sociedade e, em certo momento, até mesmo acreditaram nisso. Se você ouve algo com frequência, acaba acreditado nisso.
Como se a história em si já não fosse surpreendente, ela ainda é baseada em personagens reais. Em suas notas, a autora fala sobre como descobriu a história de Sarah Grimké e sua irmã Nina, duas irmãs que foram revolucionárias nas lutas contra a escravidão e em prol dos direitos da mulher. Ela comenta ainda como nunca havia escutado falar das duas irmãs, mesmo morando na mesma cidade em que residiam, e em que se passa a história, e como isso ainda demonstra o quanto as conquistas femininas são repetidamente apagadas da história.
Uma leitura sensacional, real e inspiradora, A Invenção das Asas me fez refletir muito sobre vários aspectos pessoais e sociais. O quão longe dessa realidade nós realmente estamos? Que outras formas de prisões não inventamos e não mantivemos desde essa época? Será que evoluímos tanto quanto pensamos? Essas são apenas algumas das reflexões retiradas do livro e que agora permeiam meus pensamentos indefinidamente.
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