Nerd Geek Feeli 20/08/2014
Quando O Homem Morcego Ganhou Suas Asas
Como o texto presente em sua contracapa deixa bem claro, Batman: Xamã é outra daquelas histórias que complementam Ano Um, a clássica reformulação da origem do vigilante de Gotham concebida por Frank Miller e David Mazzucchelli. Nela acompanhamos o herói em início de carreira envolvido numa investigação sobre um assassino ligado a uma seita de fanáticos religiosos que realizam sacrifícios humanos em Gotham City, enquanto ainda está aperfeiçoando suas técnicas e métodos de combater o crime.
Dennis O’Neil é um dos grandes responsáveis por restaurar o Batman às suas origens mais sombrias e investigativas, e talvez um dos autores que mais profundamente conhece o herói e seu mundo. Tanto é que ele foi um dos primeiros que buscou integrar sua história à de Ano Um. As obras de O’Neil e Miller conversam entre si a todo momento em Xamã. É uma ótima experiência ler ambas na sequência, assim como O Longo Dia das Bruxas e Vitória Sombria (ambas da dupla Jeph Loeb e Tim Sale, das quais falamos aqui e aqui) e Ano Dois (da dupla Mike W. Barr e Alan Davis, que serviu de inspiração para o longa de animação Batman: Máscara do Fantasma, de 1993).
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O mistério que O’Neil constrói ao longo da narrativa é bem intrincado, e do tipo que exige um bocado da atenção do leitor. Pistas visuais são espalhadas, muitas vezes sem que percebamos numa primeira leitura, e revelam-se relevantes para solucionar os mistérios mais adiante. Com isto o autor explorou muito das capacidades de investigação, disfarce e espionagem do Batman, que aqui conta com métodos bem mais tradicionais, e é menos dependente de altas tecnologias, como vem ocorrendo nas histórias atuais. É tudo bem mais “pé no chão”: ele usa Alfred como motorista; monta seu primeiro laboratório criminal num dos cômodos da Mansão Wayne; e o primeiro uniforme que ele usa é costurado quase que de improviso pelo mordomo.
Outro aspecto interessante de Xamã é o paralelo traçado por O’Neil entre a missão do Batman e um mito indígena sobre a origem das asas dos morcegos, que revela-se uma alegoria do papel do herói em Gotham: soprar para longe a doença/criminalidade que acomete a cidade. Esta é uma das primeiras conexões criadas entre a origem do Batman e um mito indígena, que anos depois foi reimaginada por Grant Morrison durante as peripécias temporais do Homem Morcego na minissérie O Retorno de Bruce Wayne.
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Os desenhos de Edward Hannigan são bem discretos, e trabalham mais a favor do história do que em chamar a atenção para si. Sua narrativa visual é sóbria e precisa. Somados à arte-final de John Beatty e às cores de Richmond Lewis, os traços de Hannigan fazem a arte de Xamã referenciar o conjunto artístico de Ano Um. Por vezes Hannigan parece emular o traço de Mazzucchelli em Ano Um, mas sem que seus desenhos pareçam meras cópias dos de seu antecessor.
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Batman: Xamã pode não ser uma história muito aclamada, além de ser pouco conhecida, mas isto não desmerece a obra. Pelo contrário, é um trabalho bem cuidadoso, que ao mesmo tempo que desmistifica os primeiros passos do herói, torna-o uma extensão, evolução e, acima de tudo, uma personificação de um mito mais antigo que ele próprio. Como o subtítulo e a história sugerem, o Batman é o Xamã que Gotham criou para curar-se dos crimes que ameaçam consumi-la. Sem o Homem Morcego, a violência criminal entraria em metástase, e a cidade já estaria estágio terminal.
Leia a versão completa e ilustrada desta resenha no link abaixo:
site: http://nerdgeekfeelings.com/2014/06/05/quadrinhos-batman-xama-quando-o-homem-morcego-ganhou-suas-asas/