spoiler visualizarLz_siq 29/08/2023
Cave que lá Cosmea
Decidi falar um pouco sobre essa leitura que terminei recentemente e acabou se tornando o meu livro favorito, por enquanto. Alguns motivos são pessoais e não vou abordar muito aqui, mas esse livro mexeu muito comigo. Os personagens, as lições e ensinamentos que passa, o mistério, tudo até a última página foi uma experiência indescritível, mas que vou tentar descrever e passar, nem que seja minimamente, para quem estiver disposto a me ouvir, divididos em uma primeira parte da história (1) e outra da opinião (2).
1.
Esse livro fala sobre a história de Miles Halter, sobre um romance que ele vai viver no Alabama, em um colégio interno chamado Culver Creek. Miles vivia uma vida monótona na Flórida, sem muitas emoções, sem amigos verdadeiros.
Miles é estranhamente interessado nas últimas palavras de grandes personalidades da história. Aficionado por bibliografias, ele não necessariamente conhece as obras da pessoa que foi inspirado essas bibliografias, mas sim na sua história de vida e, principalmente, em suas últimas palavras.
Um trecho que resume bem seria esse que eu retirei:
?-Mas, na maioria das vezes, as pessoas morrem como viveram. Então suas últimas palavras me dizem muito sobre quem elas foram e o que fizeram em vida para merecer uma biografia. Faz sentido??.
Sabendo disso, Miles, guiado por François Rabelais em suas últimas palavras ? ?É por isso que estou indo embora. Para não ter de esperar a morte para procurar o Grande Talvez? -,
embarca em uma viagem de 880 km direto para Culver Creek.
Lá ele conhece seu colega de quarto, Chip Martin, chamado de Coronel. Coronel tem 1,52m de altura e vira o melhor amigo de Miles, que apelida carinhosamente de Bujão (ou Gordo, dependendo da versão do livro que você lê).
Coronel vem de uma família pobre e é obcecado por lealdade e honra, ele conhece as capitais e populações de todos os países do mundo. Ele também é o melhor amigo de Alasca, Takumi, que vão ser o grupo de amigos de Bujão, junto com Lara também.
Takumi é um japonês e faz um rap muito bom, Lara é romena e tem um breve namoro com Miles durante o livro, mas quem devemos falar mesmo é Alasca.
Alasca é uma garota descrita como selvagem, autodestrutiva, problemática, linda e enigmática, mas acima de tudo temperamental. Ela é descrita tendo belos e grandes olhos verdes esmeralda, cabelos castanhos escuros e com várias curvas pelo corpo. Seu nome Alasca foi ela mesmo que escolheu, aos 5 anos, segundo ela porque ?(Alasca no mapa) Era grande, como eu queria ser. E estava bem longe de Vine Station, Alabama, como eu queria estar.?
Um dos grandes enigmas que Alasca deixa para Miles nos seus primeiros encontros é o do Labirinto de Gabriel García Márquez, de O General Em Seu Labirinto, que retrata os últimos dias do General Simón Bolívar. Suas últimas palavras foram ?Como sairei deste labirinto??.
E junto com o Grande Talvez de François Rabelais, o Labirinto do General Simón Bolívar se tornam o enredo e os mistérios de toda trama.
?As palavras bebida e farra me deixaram receoso de que eu tivesse me envolvido com o que minha mãe chamava de ?as pessoas erradas?, mas eles pareciam inteligentes
demais para serem as pessoas erradas.?
Depois de chegar em Culver Creek e ser apresentado a um novo mundo, nova realidade, novos amigos, novos tudo, Miles começa a viver essa nova vida e vai gostando de ter amigos, das experiências que está vivendo, do amor que vai desenvolvendo por Alasca Young, das brigas que o seu grupo tem, principalmente o Coronel, com os Guerreiros de Segunda à sexta, que são basicamente os alunos ricos que estudam na escola mas durante o fim de semana vão para suas mansões na cidade. Também é contado sobre o lanche da escola, os bufritos, que são, como o nome sugere, burritos fritos e que, assim como toda comida do Alabama, segundo Miles, tem bastante fritura.
Além disso, conta sobre a primeira vez que Miles bebeu álcool, que foi quando passou o feriado de Ação de Graças sozinho na escola com Alasca, o primeiro trote que planejaram contra os Guerreiros de Segunda à Sexta, as brigas do Coronel e de Sara - namorada do Coronel, que surpreendentemente é também uma dessas guerreiras de segunda à sexta, fala sobre o time horrível de basquete da escola? Enfim, tudo nesse livro, todo esse universo eu me apaixonei e não conseguiria descrever pra quem está ouvindo tão bem quanto John Green descreveu todo esse livro.
Agora outro ponto que tenho que explicar é que o livro conta intervalo de dias, não necessariamente em ordem certinha, mas que começa com o ?Antes?, quando Miles estava na Flórida ainda, passa por 128 dias, e vai até o ?Depois?, que é quando algo acontece suficientemente grande para dividir o livro em Antes e Depois, sucedendo por mais 136 dias.
Bem, acontece que no dia anterior do ?Depois?, Coronel, Alasca e Miles estavam reunidos no quarto de Alasca após um trote bem sucedido que deram no grupo rival deles na escola.
Coronel e Alasca estavam bebendo bastante enquanto Miles só lia, até que Alasca sugere que brinquem de verdade ou consequência. Alasca desafia Miles a ficar com ela e eles ficam. Depois de se beijarem algumas vezes e prometer continuar depois, Alasca cai no sono e acorda só na próxima manhã, quando vai telefonar para Jake, seu namorado, quando depois entra no quarto chorando e gritando com os garotos que precisa ir embora. Eles dão cobertura do Águia para Alasca ir embora, mas na manhã seguinte são acordados pelo próprio Águia, que reuniu todos no salão, para dar a notícia que Alasca Young havia acertado um carro da polícia na I-65 e veio a óbito na hora.
A partir daí o livro toma outro rumo, e começa o ?Depois?. Ninguém acredita na notícia, primeiramente Miles começa achar que é mais um trote de Alasca, que é negado pelo Águia aos prantos. Miles e Coronel, os únicos que sabem da verdade, se culpam pelo acidente, acabam se afastando do grupo e toda a escola agora tem um ar de tristeza, vazio, onde parece que as coisas nunca mais vão voltar a ser como eram antes, sempre faltando um quê de Alasca ali.
?Ela talvez gostasse tanto de mistérios que acabou por se tornar um.?
São aí então onde as duas figuras do Águia e do Dr. Hyde, para mim, entram em ação. O Águia parece entender o momento de luto do grupo de Miles e tem um trato diferente com eles, acabando por entender sua dor. Já o Dr. Hyde entra em ação com suas aulas de religião - que pra mim são fascinantes a parte, porque ensina a religião de verdade, procura saber como as principais religiões do mundo explicam as coisas, mas de uma forma cética e religiosa ao mesmo tempo, literalmente uma aula que você tem dentro do livro -, onde ele, a partir de perguntas sobre as religiões e sobre suas aulas continua seu trabalho mas ajuda Miles e toda a turma a lidar com o luto da perda, e também a responder a pergunta do Labirinto que Alasca deixou para Miles.
Com a boca tão próxima de mim que eu sentia seu hálito mais quente do
que o ar, ela disse: ?Esse é o mistério, não é? O labirinto é a vida ou a morte?
Do que ele está tentando escapar ? do mundo ou do fim do mundo??
Aí então se iniciam os 136 dias depois do acidente, onde ninguém sabe o motivo de porquê Alasca se acidentou e quase todos querem descobrir. Quase todos eu digo porque Miles por muito tempo viveu uma ilusão de que Alasca estaria terminando com seu namorado e voltando para os seus braços, mas acabou por não completar o caminho. Já o Coronel se culpa profundamente por deixar ela sair bêbada e diz no enterro de Alasca que ela merecia melhores amigos. Takumi sente que os dois têm um segredo e acaba também por se afastar. Já Lara, que viva uma paixão com Miles, é abandonada por Miles e tem que superar a perda da amiga e de uma espécie de namorado que tinha em Miles.
"Não quis visitá-la. Não sabia o que dizer ? fazíamos parte de um triângulo
amoroso com um lado morto."
O grupo todo se encontra esfarelado, pensando no que podiam ter feito para evitar aquele dia, no que Alasca estaria pensando ao sair por aí dirigindo bêbada, nas promessas que deixaram de cumprir, mas toda escola se une em único trote por Alasca Young, uma espécie de último trote para simbolizar o que Alasca representava pela escola.
O Coronel pensou no trote e de fato foi muito hilário, não vou entrar em detalhes mas foi muito bem planejado, todos os alunos do último ano se reuniram para isso e depois de terem realizado até o Águia ficou feliz pela mensagem e lembrança de Alasca que passaram.
" -Nunca mais façam uma coisa dessas - ele disse. Mas, Deus, 'subverter o
paradigma patriarcal?... Parece até que ela escreveu o discurso. - Sorriu e
fechou a porta."
Depois disso parece que as coisas voltaram ao normal na medida do possível. Coronel e Miles desistiram das investigações da morte depois de chegarem num beco sem saída, a escola ia voltando ao normal aos poucos até que as férias de fim de ano se aproximaram e, após as provas, Takumi revelou o que sabia sobre a noite que Alasca morreu. Ele disse que Alasca havia esquecido de pôr flores no túmulo da mãe, que se sentia extremamente culpada por isso e que esse foi o motivo de ter saído bêbada e explicava de certa forma o acidente, apenas não explicava a suspeita de suicídio, já que ela nem ao menos tentou desviar do carro de polícia em que ela bateu, ou de acidente mesmo. Após ler a carta que Takumi deixou revelando tudo, Miles finalmente entende o segredo do labirinto.
Miles deixa uma carta para o Coronel dizendo que ainda acredita no seu Grande Talvez, mesmo pensando que fosse ela e aceitando que a perdeu. Com base no que disse Dr. Hyde nas aulas de religião, que disse que ?Tudo que se forma se desfaz?, Miles escreve que não vê mais Alasca como um cadáver apenas, ele procura entender que existe um algo a mais dentro e nós que não pode ser destruído e tem que ir para algum lugar depois de morrermos. Trata isso com a energia, que não se cria e nem se destrói, e que essa energia de Alasca deve ter ido para algum outro lugar, que ele espera ser mais bonito. Miles entende que a chave para sobreviver nesse labirinto de sofrimento é o perdão, e então perdoa. Perdoa Alasca, perdoa Coronel, Takumi, mas especialmente se perdoa, dizendo que vai acabar por esquecer Alasca Young, mas que vai continuar procurando o seu Grande Talvez.
2.
Bom, o livro todo em si acabou sendo uma experiência para mim e que veio em ótima hora.
A história retrata sobre a vida de Miles, que ocorre uma mudança brusca em sua vida e tudo muda de uma hora pra outra, assim como me ocorreu ultimamente.
Mudanças e perdas. Acredito que seja sobre isso do que o livro trata e é isso que estou vivendo.
Mudanças e perdas.
As mudanças das quais me refiro não são opcionais, foram impostas. Algumas porque deveriam ser mesmo, outras consequências de ações passadas, mas que cedo ou tarde viriam acontecer.
Com o livro entendi que algumas coisas acontecem não importa o que seja feito, e às vezes não nos cabe ficar remoendo um passando, pensando como seria diferente e o que poderíamos ter feito. Como dito no livro, há alguns mistérios que não querem ser solucionados, e ser for assim, que respeitemos vossa vontade.
Claro, toda minha história não é tão literal quanto a perda de uma amiga/amor que Miles sofreu, mas de certa forma acabou sendo uma perda ainda maior. Todos erros que cometi agora vêm a tona e quando penso no que poderia ter feito diferente tudo em mim dói, sem eufemismo (como dito por Miles).
?O que estava sentindo não era bem tristeza, era dor. Aqui doía, e não é um eufemismo. Doía como uma surra.?
Mas, como aprendi no livro, nada vai mudar. Agora há uma distância maior que um oceano nos separando e que será assim. Caso navegue nessas águas, acabarei enfurecendo a capitã, a qual já deixou bem clara sua vontade, então permaneço em terra firme e a vejo feliz navegando em navio, que eu espero do fundo do meu coração que encontre bons rumos, junto com a sua tripulação, que outrora já participei.
Sobre as mudanças, elas vêm com a perda, mas não só com elas e só nos cabe lidar com essa dor para que possamos sobreviver nesse labirinto de sofrimento que é a vida.