Claudia Cordeiro 05/02/2016É o que um livro deve ser: uma história bem contada, que quando vc lê, praticamente entra em outro universo, se esquece da vida!
Personagens reais, uma história forte, pesada, que conta coisas que com certeza aconteceram na realidade, um dia; para quem tem curiosidade sobre ciganos, é imperdível o livro. Personagens inesquecíveis: Milagros, ingênua, impetuosa; Caridad, doce, sofrida; Ana Vega, de personalidade forte e inquebrável. Melchor, inconseqüente, ousado, e um vilão e tanto, não vou dizer o nome......
O final é um clímax que.... não deixa largar o livro!!!
Seguem trechos do livro: "A humilhação veio a converter-se na pior das cenas que as cultivadas autoridades da época impuseram aos menores. Sucedeu que as moças ciganas que haviam sido destinadas à oficina de costura daMisericórdia se negaram a trabalhar por não receber a comida que lhes correspondia. A decisão do regedor foi tirar-lhes as roupas e o calçado que lhes havia proporcionado e enviá-las com as demais. Dezenas de jovens ciganas se encontraram de repente completamente nuas em pátios e galerias, envergonhadas, tentando ocultar o corpo, o púbis e os peitos, nascentes em umas, túrgidos em outras, aos olhares de suas mães e dos demais internos. Em alguns dias a medida foi anulada pela junta de governo, mas o mal estava feito."
.................................................................
"As mulheres, encarceradas na Misericórdia de Saragoça e no depósito de Valência, sofriam, como se tal fosse possível, ainda mais que os homens. Elas não eram produtivas; ninguém havia conseguido fazê-las trabalhar, e o dinheiro do rei para mantê-las não chegava. Fome e miséria. Doenças. Tentativas de fuga, algumas consumadas. Desobediência e insubmissão permanentes. Se os homens eram acorrentados, as mulheres eram mantidas quase nuas, a maioria coberta com simples farrapos a ponto de quase não se encontrarem sacerdotes dispostos a pregar diante daquele rebanho de almas perdidas. ............................................................ Famílias dispersas e casais separados por centenas de léguas de distância. As meninas continuavam junto de suas mães, se as tinham, e o acaso as havia levado pelos mesmos caminhos; as crianças sofreram as maiores injustiças. ........................................Já no depósito de Málaga, antes de serem transferidas para a Misericórdia de Saragoça, as ciganas tentaram esconder os rapazinhos que já estavam em idade apta para o trabalho. ............. as autoridades do depósito não podiam saber sua idade exata, que suas mães diminuíam aproveitando seu parco desenvolvimento, fruto da má alimentação. Contudo, antes de sua partida, vinte e cinco garotos com mais de onze anos foram separados à força de suas mães para serem conduzidos aos arsenais. "
".....nós, as mulheres, viemos a este mundo para parir com dor, para trabalhar e para sofrer a perversão dos homens. Eles.... os senhores, se rebelam, lutam e pelejam diante da infâmia. Às vezes ganham e se convertem no macho vitorioso, outras muitas vezes perdem e então se encarniçam nos fracos para enganar-se e viver com a vingança como único objetivo. Nós temos que calar e obedecer.............."
Idade Moderna, seguindo-se à Idade Média... uma época de selvageria, desmandos, barbaridades, enfim, o autor sabe muito bem como desenvolver um romance tendo como pano de fundo uma época terrível.