leonardo camargo 26/10/2018
Tempo de desencanto
Durante as duzentas e seis páginas, o leitor acompanha os caminhos da vida e os pensamentos do jovem Giovani Drogo, mesmo que a vida e a reflexão não sigam na mesma direção. O início do livro indica mudanças, Giovani é um jovem militar indicado a deixar a casa dos pais para permanecer no distante forte Bastiani, como oficial. Depois de anos de estudos, preparos e sonhos, é chegado o dia tão esperado, onde as coisas deveriam acontecer. Mas quando se vê sozinho, Giovani sente uma distância da alegria da conquista, como se forçasse a si mesmo para dar vida a uma esperança longínqua, que não enxerga em seu próprio reflexo no espelho, antes de partir.
O forte Bastiani é um lugar apagado no tempo, uma construção esquecida e perdida no meio de um deserto, uma verdadeira moradia do silêncio. É neste cenário que acompanhamos os encontros e desencontros de Giovani, com outros homens, situações frustradas e pensamentos melancólicos. Boa parte da história se sustenta em duas possibilidades paralelas, aquela que realmente acontece no forte e outra na escuridão do quarto de Giovanni, que tenta escutar os barulhos da noite e decifrá-los.
As esperanças frustradas do personagem são quase um manto que o impede de sentir o tempo e suas mudanças, porque Giovanni sempre está na espera de que algo realmente grande aconteça, que mude seu destino drasticamente e o aproxime da glória desejada. Tal característica humaniza todo o texto, acompanhado da poesia que Buzatti encontra nas paisagens, nas expressões dos homens, no silêncio e no desconhecido.
No trecho da resenha crítica de Antônio Candido, presente na revista da TAG, o leitor é convidado a fazer uma análise do primeiro e do último capítulo da obra. Neste parâmetro, é possível encontrar algo que une dois sorrisos distintos de Giovanni, interligados a essa busca por algo maior, que nada mais é do que a nossa eterna procura de um propósito.
A leitura é leve, encantadora e dinâmica, os capítulos são curtos e dão ritmo para a leitura. O autor utiliza de certa poesia para criar paisagens e nos descrever as mudanças de estações, dos dias em noites, em contraste as indagações do personagem que pouco se move. Em certos pontos, o autor nos distancia do personagem principal, sem grandes explicações, tornando o próprio forte e seus homens uma parte da história. No entanto, a característica citada por Alejandro Zambra é algo que realmente prende o leitor a história, o “humano demasiado humano” Giovanni. Suas indagações ao tempo nos colocam em janelas contemplativas. Vemos, do alto das torres, seu horizonte, suas cores. Cada dia algum detalhe chama a atenção, mas não pela sua existência, mas pela nossa percepção, aguçada pelo arrastar dos dias, que nos leva para longe, cada vez mais próximo de nós mesmos.
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