PorEssasPáginas 18/08/2014
Pensem em um personagem cativante, que tem luz própria. Agora pensem em um personagem cativante, que tem luz própria e que você queira bater muito, mas MUITO nele. Surrar, até. Dar vários tapas para ver se ele acorda pra vida REAL. Esse é o Sutter.
Mas Lucy, como assim? Eu vou explicar: O Sutter é autodestrutivo e leva à risca o Hakuna Matata dele. Ele não sabe, mas ele já é um alcoólatra viciado em 7UP (lembra o gosto de Sprite) e uísque. Para tudo o que ele faz, ele encontra uma justificativa para beber. Ele precisa ter uma ideia brilhante? Ele toma um drinque. Ele precisa ter coragem para falar alguma coisa? Mais uma dose.
“Tudo o que faço quando estou bebendo é ser criativo, expandir meus horizontes. Na verdade, é bem educativo. Quando estou bebendo, é como se pudesse ver outra dimensão do mundo. (…) Sou misericordioso e engraçado. E me engrandeço na beleza e no senso de humor de Deus.
A verdade é que sou o bêbado de Deus”. (página 25)
Quando ele se via em um problema, entrava com seu “Hakuna Matata” + 7UP e uísque. Engraçado que esse termo do Rei Leão não aparece nenhuma vez no livro, mas sempre que via Sutter pensar em seus problemas e tentar fugir deles ou elaborar alguma justificativa para eles, eu lembrava dessa expressão. E em vez de apenas dar as costas, ele também bebia e curtia o seu “Agora”.
“É besteira ficar largado e melancólico. Hoje é sexta-feira. Estou maravilhosamente livre. Tenho a noite inteira pela frente. (…) Que se danem Cassidy, o Mr. Leon’s, a aula de álgebra e o dia de amanhã. Vou cair na noite e aproveitar cada minuto dela, até ficar só o bagaço”. (página 75)
À primeira vista, Sutter é um jovem muito superficial e egocêntrico, que se acha o salvador do mundo e das festas. Ele não tem tanto discernimento quanto ao que faz, e não se responsabiliza por suas atitudes quando confrontado. Muito pelo contrário, ele tende a transferir a culpa. Ele não quer se comprometer e não acredita no futuro. Problemas? É passado, estão todos esquecidos, enterrados. Planos? Só seguir em frente, bem no estilo “deixa a vida me levar”. E com sua garrafinha de 7UP batizada com uísque, claro.
Para não ter que encarar os próprios problemas, Sutter buscava inspiração (na bebida) para ajudar outras pessoas a encarar seus problemas. Foi assim com seu melhor amigo, Ricky, quando Sutter o ajudou a conquistar uma garota. E seria assim também com seu grande projeto, Aimee. Pelo menos era o que Sutter tinha em mente.
Aimee é uma garota ingênua e pura, no sentido de não ter malícia para nada (ou quase nada). Embora sua vida não seja muito fácil – sua história é contada a Sutter ao longo do livro – ela é aquela garota insegura, porém otimista e sonhadora. Muito sonhadora e ingênua e, infelizmente, muito influenciável.
“A vida é um oceano, e quase todo mundo está agarrado a um tipo de sonho para se manter na superfície. Eu estou só nadando cachorrinho por minha conta, mas a boia de Aimee é lindíssima. Estou encantado por ela. Qualquer um ficaria se visse o jeito como seu rosto se ilumina enquanto se agarra aos seus sonhos com toda a força”. (páginas 189, 190)
Quando Aimee surgiu, achei que seria uma luz no fim do túnel para Sutter. Mas no decorrer da leitura, eu fiquei com muito medo por ela. Em todo o caso, toda pessoa que entra na nossa vida, seja quem for, deixa uma marca. E não foi diferente em relação a Sutter e Aimee: ela conseguiu deixar uma marca na vida de Sutter e vice-versa. O que isso influenciará em suas vidas só o tempo dirá.
“- Esperança? Tá de brincadeira? A única coisa que aprendi com absoluta certeza é que a esperança é inteiramente desnecessária. Não descobri ainda o que existe no lugar dela. Até lá, a bebida vai ter que dar conta.” (página 292)
A narrativa do livro é bem leve e rápida, sem muitas explicações, apenas algumas reflexões que não faziam a leitura desacelerar. O autor escolheu fazer de seu protagonista o narrador, o que foi uma ótima ideia. Talvez, se o livro fosse narrado em terceira pessoa, eu passasse a odiar o Sutter com todas as minhas forças e jogasse o livro na parede. Como ele é o narrador, conseguimos ter empatia por ele – e muita raiva, porque ele fazia muita burrada - mas ao mesmo tempo em que eu queria bater nele (e jogar o livro na parede, para depois pegar e voltar a ler), eu queria dar um abraço e dizer para ele que o Agora é importante, mas tenha uma visão do que você pode ou quer fazer agora, para no futuro colher seus frutos.
O final ficou meio em aberto e me deu uma sensação de vazio, de desesperança, como se nada tivesse mudado, afinal. Para falar a verdade, foi até bem realista, porque isso pode acontecer mesmo: temos a tendência de tentar uma mudança na nossa vida, mas aí voltamos a nos conformar com nossa realidade e permanecemos estagnados. O final foi muito condizente com o tema, mas não resta dúvida que Sutter me desapontou com algumas decisões que tomou, tanto em relação à Aimee quanto a si mesmo.
Eu gostei muito da história como um todo. A mensagem não se resume a simplesmente valorizar o presente, ou sobre a influência do álcool na vida das pessoas. Fala sobre encarar seus problemas de frente, se valorizar como pessoa (sem a necessidade do álcool), valorizar sim o Agora, mas também pensar nas consequências que o Agora trará em seu futuro. Embora eu tenha pintado o Sutter como um grande vilão ou talvez um anti-herói, o livro vale as quatro estrelas que coloquei, acho que traz uma ótima lição de vida, apesar de ser pelo ponto de vista de Sutter, que não é o melhor exemplo de pessoa. A leitura é super recomendada.
O livro foi adaptado para o cinema ano passado, mas pelo visto ele vai direto para o DVD aqui no Brasil, como aconteceu com Academia de Vampiros. Foi inclusive o trailer que me fez querer ler o livro. A capa brasileira, inclusive, é uma cena do filme. Sinceramente eu não gostei, raramente gosto de capas que sejam de cenas de filme. A diagramação está ótima e as “orelhas” nos dão uma visão de que nem tudo serão flores.
site: http://poressaspaginas.com/resenha-o-maravilhoso-agora