Caroline Gurgel 26/06/2015Desfecho de uma trilogia maravilhosa...Eternidade por um fio coroa a incrível trilogia O Século, de Ken Follett, mas, embora ainda muito bom, é o livro mais fraco – - ou menos bom – dos três.
Quando comecei Queda de Gigantes me encantei de cara com a capacidade de Follett de encaixar personagens fictícios nos momentos históricos de maneira primorosa. Uma mistura de ficção e realidade tão bem construída que nem percebemos a quantidade de páginas e logo estamos lendo o segundo livro, Inverno do Mundo, que é tão bom quanto o primeiro e nos deixa cheios de expectativas para esse terceiro volume. Como ele finalizaria a vida daquelas famílias? Que fatos históricos do pós guerra ele abordaria? Será que seria possível gostar da mesma maneira dos filhos e netos dos protagonistas das edições anteriores? Bem, foi assim, cheia de questionamentos que iniciei Eternidade por um fio.
Esse volume começa no ano de 1961 e acompanhamos toda a tensão da Guerra Fria, a aflição gerada com a Crise dos Mísseis de Cuba e as tentativas de se evitar uma nova guerra. Acompanhamos a briga pelo poder, a polarização EUA versus URSS, o comunismo versus capitalismo, a Cortina de Ferro e seu domínio soviético. Vemos erguerem o Muro de Berlim e a incalculável dor das famílias separadas. Follett fala também da Guerra do Vietnã e as inúmeras tentativas de justificá-la; nos mostra Martin Luther King e sua luta pela igualdade nos Estados Unidos. Acompanhamos os presidentes norte americanos, suas eleições e algumas de suas medidas mais importantes. Vemos políticos serem assassinados, civis serem presos. Na União Soviética, vemos entrar líder, sair líder e nada mudar. Em meio a tanta tensão, também temos o rock and roll e alguma menção ao movimento hippie. Claro, chegando à década de 80, vemos a queda do muro de Berlim e o comunismo ruir, levando consigo as barreiras que tanto causaram medo e sofrimento.
São inúmeros e importantes momentos históricos que se misturam aos personagens fictícios e nos fazem enxergar a História por diversos ângulos. Ao inserir a vida comum dos personagens, com suas paixões, medos e dúvidas, erros e acertos, glória e declínio, Follett nos aproxima da História, faz com que vejamos tudo mais de perto, um pouco menos mistificado. Não fosse a mania do autor de colocar sexo em tudo, diria que deveria ser leitura obrigatória nas escolas.
A leitura desses três livros me fez refletir sobre caráter e índole e sua relação com o posicionamento político de cada um. Follett me fez perceber que, em certos casos, mesmo estando do lado “"errado"” da política, a pessoa pode realmente acreditar que está fazendo o bem, que está lutando por melhorias. Tomando Grigori Peshkov como exemplo, foi um personagem bem querido, mesmo tendo morrido acreditando que o comunismo agia corretamente. Apesar de boa pessoa, o poder o cegou e ele não percebeu que passou a ter muitas regalias, as mesmas regalias que os monarcas tinham e que o levou às ruas para protestar no início do século XX.
O autor foi super feliz ao criar personagens verossímeis, nem completamente maus, nem totalmente santos, e conseguiu uma variedade impressionante em relação a personalidade de cada um. É incrível como ele consegue inserir pra lá de duzentos personagens e não ficamos perdidos –- ou pelo menos não completamente rsrs. Por mais que tenhamos que parar algumas vezes para pensar em quem era o pai ou avô daquela pessoa, isso não atrapalha o andamento ou a compreensão da leitura.
Sei que é natural sentir falta dos protagonistas anteriores e achar estranho vê-los sendo mencionados apenas de vez em quando, mas devo dizer que essa nova geração não me conquistou como as outras. Minha ressalva está principalmente nas mulheres que ele criou. Poxa, Ken Follett, não é possível que não tenha existido uma mulher decente sequer nessa época!!! Por que “todas” tinham que ser infiéis ou bem assanhadas?
Outra ressalva está no fato de que todos os conservadores foram pintados como vilões, com Ronald Reagan, por exemplo, sendo simplesmente um assassino.
A escrita do autor continua simples, direta, sem firulas. É um pouco seca, mas se encaixa perfeitamente no que ele quer contar. Como lhe é peculiar, não nos poupa de detalhes cruéis da guerra e das atrocidades cometidas.
Preciso dar destaque a duas matriarcas: Ethel e Maud, minhas personagens favoritas de toda a série. A vida de Ethel Williams Leckwith me fez pensar em como a vida é uma caixinha de surpresas e me fez refletir por quantos acontecimentos passa alguém que vive por muito tempo e o quanto de experiência acumula. Gostaria que ela tivesse tido mais destaque nesse livro, mas ainda assim, gostei do que li. Maud? Tudo o que Maud passa é de partir o coração desde o livro anterior. Que irônico o destino, não? Quem diria que a pobre Ethel viveria tão bem e a rica Maud terminaria na Alemanha Oriental?
Posso passar ainda parágrafos e mais parágrafos comentando sobre essa trilogia de tão boa e cheia de conhecimento que ela é. Um banho de História, daqueles livros que acrescentam, que nos faz enxergar um pouco além. Uma trilogia que merece ser lida e recomendada sempre. Para quem não costuma ler ficções históricas, aconselho a tentativa, certamente irá se surpreender. É fato, nunca mais verei a História como antes.
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