Eduardo 19/01/2016"Meio ruim"Passei meia-hora pensando em um trocadilho para dizer o quanto Half Bad era bem ruinzinho, mas achei melhor deixar pra lá, já que esse não é meu forte.
Ao me deparar com o livro de Sally Green, a primeira coisa que me estranhou foi a pessoa em que o texto é narrado. Na segunda pessoa. Você. Pensei que seria um recurso bem peculiar para que o leitor se insira no contexto, se sinta como o personagem principal, para que o leitor acabe sendo Nathan. E aí, de repente, a voz muda para a primeira pessoa. O leitor não é mais Nathan. Então, mais uma vez, de repente, volta-se à segunda pessoa. Até que, do nada, lá está a primeira pessoa de novo. Não entendi de jeito nenhum essas mudanças. Talvez não desse para sustentar a segunda pessoa o livro inteiro, mas não precisava ficar nessa mudança contínua.
Porém, primeiramente, vou me ater ao enredo. Half Bad conta a história de Nathan, um brux (bruxo menor de idade) filho de uma bruxa da Luz e um bruxo das Sombras. Mas não qualquer bruxo das Sombras, o pior de todos, que matou diversas pessoas apenas para tornar-se mais poderoso. A história mostra Nathan se descobrindo enquanto bruxo, a dúvida se ele é da Luz ou das Sombras, enquanto ele fica cada vez mais perto da maioridade, onde irá receber seu poder. Em Half Bad, cada bruxo é hábil apenas em um aspecto mágico.
Falando-se em uma história de um adolescente bruxo envolvido em tramas do mundo dos bruxos, é impossível não compararmos o enredo de Half Bad ao de Harry Potter. E há muitas semelhanças. A começar pelo protagonista, um menino meio que rejeitado, que sofre bastante e é, por algum motivo, bastante conhecido no meio dos bruxos. Além disso, há um "Conselho dos bruxos da Luz", que remete diretamente ao Ministério da magia de Harry Potter; os "não-bruxos" são chamados por um nome peculiar – félixes (trouxas); o pai de Nathan, à primeira vista, lembra o próprio Voldemort, além de outras pequenas coisas que, se não fazem referência, lembram o mundo fantástico criado por J. K. Rowling. Essa comparação não é de todo ruim. É natural que comparemos um novo universo bruxo com o já consolidado e isso é até bom para a leitura, já que a ambientação de Sally Green deixa a desejar.
Existem dois pontos positivos no enredo e que devem ser salientados. O primeiro é a discussão, nas entrelinhas, sobre o racismo enraizado na sociedade ao designar que bruxos da Luz (brancos) seriam os bruxos bons e os da Sombra (negros), os ruins. E aí Sally Green mostra que diversos bruxos da Luz são ruins e que alguns – não são mostrados muitos durante a história – bruxos das Sombras não são. Essa discussão é importante e válida e o modo com Sally Green a incluiu em sua narrativa também ficou interessante.
O segundo ponto positivo, mas que foi mal desenvolvido pela autora, é a questão da representatividade. Na sociedade bruxa descrita em Half Bad, existe uma presidenta do Conselho dos Bruxos e muitas mulheres em cargos importantes da alta cúpula da sociedade bruxa. Porém, essa representatividade se perde na história principal do livro, que mostra mulheres apenas como coadjuvantes da história de Nathan – incluindo uma que depois de conhecer o personagem, vive em função dele. Além disso, Green joga no leitor um personagem LGBT – o que era para ser legal – sem história de fundo, como se apenas para fechar a cota das minorias. Isso não me agradou tanto quanto deveria.
O livro possui alguns clichês básicos em seu enredo, como o fato de a sociedade bruxa ser composta por bruxos bons e ruins e eles viverem em conflito – bem versus mal. E um romance impossível de acontecer, bem à Romeu e Julieta, em que Nathan é o menino bruxo das Sombras que acaba se apaixonado por uma menina bruxa da Luz – e vice-versa –, o pai dela não permite o romance de jeito nenhum e eles vão fazer de tudo para ficar juntos.
Além disso, em apenas 300 páginas, passam diversos anos na vida do personagem principal sem que nada de relevante além do perrengue do coitado com o Conselho dos Bruxos da Luz aconteça. Falta profundidade na narrativa de Sally Green e talvez por isso o único personagem com quem tive alguma espécie de empatia ao ler o livro foi o protagonista, já que ele está em tudo o que acontece no enredo.
Para completar a leitura, a edição em português do livro está muito mal revisada. Erros grotescos de gramática – como um porquê errado e algumas crases bem desnecessárias – são constantes no texto. Além de alguns erros de grafia, como "corretor" escrito no lugar de "corredor" e "entendida" no lugar de "estendida". Esses sendo apenas alguns que percebi porque eram gritantes, já que não costumo ler livros em busca de erros de escrita. Devem ter passado vários outros.
Por fim, me pareceu extremamente incoerente que um livro sobre um bruxo e um universo bruxo quase não tivesse mágica. Os bruxos usam armas de fogo, facas, telefones celulares e jipes. Acaba que o universo bruxo criado por Sally Green se torna desinteressante ao mostrar aspectos que não diferem tanto do modo como vivem os félixes. Pobreza de enredo.
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