jota 16/02/2022BOM: clássico americano que se revela de leitura mais complexa do que sugere à primeira vista; apenas na superfície trata de um caso de adultério e puritanismoLido entre 03 e 15/02/2022. Avaliação da leitura: 3,5/5,0
Em A Letra Escarlate (1850) o escritor Nathaniel Hawthorne (1804-1864), nos conta com muita imaginação e detalhes, e de modo bem lento, a história de um rumoroso caso de adultério situado em sua cidade natal, Salém – na costa de Massachusetts, 25 quilômetros ao norte de Boston –. cidade conhecida por sua caça às bruxas no século XVII.
Promovida pelos puritanos locais – oriundos da Inglaterra em busca de liberdade religiosa, mas que no fundo acobertava preconceito e perseguição –, a caçada foi responsável por um dramático episódio ocorrido em 1692, que resultou no enforcamento de dezenove pessoas acusadas de bruxaria. Esses eventos históricos inspiraram o dramaturgo Arthur Miller, que escreveu uma peça de enorme sucesso The Crucible (1953).
A peça se transformou em filme depois, não apenas um: teve duas versões bastante conhecidas: As Feiticeiras de Salém (1957), direção do francês Raymond Rouleau, e As Bruxas de Salém (1996), do diretor americano Nicholas Hytne. Salém e puritanismo tem tudo a ver também com A Letra Escarlate, criação de Hawthorne adaptada para o cinema e a televisão pelo menos umas cinco vezes. Nunca vi nenhuma, mas pelo que pesquisei apenas a versão de 1926, produção americana dirigida pelo sueco Victor Sjöström, valeria a pena ser vista.
O enredo do livro, que é o que interessa aqui, gira em torno de uma jovem mulher casada, Hester Prynne, que tem uma filha fora do casamento e é pressionada pela comunidade puritana de Salém a revelar o nome do pai da criança, coisa que ela não se dispõe a fazer de modo algum. É punida com a prisão, humilhada publicamente, e obrigada a usar eternamente a letra A, de adúltera, pregada em suas vestes, o que a torna uma espécie de pária social. Mas isso é apenas a superfície dessa narrativa, que no fundo é mesmo o que chamaríamos de uma ficção psicológica.
Antes do mergulho profundo no drama de Hester e da filha Pearl, lemos uma longa introdução, A Alfândega, de que Hawthorne se valeu para explicar o surgimento dessa história. E também contar algumas coisas sobre sua vida, seu trabalho antes de se tornar um escritor conhecido. No final temos um longo posfácio escrito por uma estudiosa da literatura americana, Nina Baym. Ela discorre sobre muita coisa que o leitor pode não ter notado durante a leitura, além de fornecer várias informações sobre Hawthorne e seus escritos.
A Letra Escarlate é um consagrado clássico da literatura americana, que me pareceu, quando li sua sinopse, bastante interessante e de leitura acessível. Porém, conforme fui avançando nos capítulos, já não tinha mais certeza disso e considerei alguns trechos até mesmo maçantes, por minhas deficiências de leitor, claro, não por conta da escrita de Hawthorne. Porque esse não é um simples relato de um adultério e suas consequências dentro de uma comunidade puritana do século XVII, é muito mais.
Essa é uma história com várias camadas, seus personagens têm comportamento fluido, especialmente um deles, o pastor Dimmesdale com seu fim teatral; o fruto do adultério, a pequena Pearl, não é uma criança qualquer, assim como sua mãe, a costureira adúltera Hester Prynne, não é uma mãe qualquer; Roger Chillingworth não era apenas um médico qualquer daqueles tempos... Eles todos são devassados pelo autor. Enfim, ler A Letra Escarlate é estar diante de uma narrativa muito mais complexa do que imaginávamos de início, um livro que exige bastante atenção do leitor porque vai muito além do relato de um caso exacerbado de puritanismo, moralidade, crime e punição...
O livro de Hawthorne é um clássico da literatura, e como tal a gente lê e não discute muito se é bom ou ruim, que assim dói menos se não se apreciou tanto, meu caso. Para finalizar mesmo, uma frase dos anúncios quando do lançamento de sua primeira versão cinematográfica: “Em seu peito a marca da vergonha, em seu coração amor eterno!” Penso que eu estava mais para isso, ou coisa parecida, quando iniciei a leitura do que para o que fui encontrando pela frente...