Dani 20/09/2015Jardim de Espelhos, de Veridiana MaenakaMaria Cristina cresceu em uma próspera fazenda dos Toledo, no interior de São Paulo, onde trabalha junto à mãe, ambas serviçais. Desde sempre fora educada para acatar às ordens das pessoas de posição mais elevada, mas isso tornava-se difícil devido à sua personalidade forte e teimosa.
Matilde, sua mãe, nunca lhe demonstrava afeto e seu pai, Gilberto, encontrava-se sempre embriagado e quase não notava sua existência. Carente, a menina encontrou apoio em André, filho mais novo da família Toledo. Os dois viviam juntos, compartilhando brincadeiras, segredos e o primeiro amor de ambos. O relacionamento cresceu de forma inevitável, dada a proximidade dos dois, e, por mais que sua mãe sempre a lembre de que não pode se envolver com um rapaz de posição tão diferente da dela, Cristina se encontra perdidamente apaixonada. Teimando que André nunca abriria mão dela, mesmo com as diferenças, entrega-se profundamente à paixão.
"Como sempre que o via, Cristina sentia a alegria inundá-la. Amava-o desde que podia recordar." - Pág. 37
O mundo de Cristina abala-se totalmente quando a família do rapaz se opõe ao relacionamento e ele também nada faz para continuar com ela. Além disso, ela descobre que toda sua vida foi feita em mentiras, ao saber que Matilda e Gilberto não são seus pais verdadeiros - sua verdadeira mãe, de identidade ainda desconhecida para Cristina, engravidara muito jovem, antes do casamento, sendo obrigada pela mãe a abandonar a filha.
"—As coisas não funcionam assim, minha querida. Não se manda no coração. Pode-se apenas silenciá-lo." — Pág. 143
Desamparada e desprotegida, algum tempo depois de vários acontecimentos, Cristina encontra apenas uma oportunidade de conseguir sobreviver sozinha e, ao mesmo tempo, ter uma vida boa: torna-se meretriz de luxo. Aprende com Olívia, uma famosa e requintada alcoviteira, tudo que é necessário saber para a profissão e passa, então, a viver uma vida de alto padrão, mesmo que sua alma esteja apodrecendo e cheia de mágoas daqueles que destruíram sua vida.
Alguns anos depois, Cristina reencontra André e, por mais que esteja magoada, a velha paixão ressurge, avassaladora. Ela precisa contar, mais tarde, com a ajuda de Eduardo, um homem confiante, sarcástico e atraente, que a irrita profundamente, para reconquistar seu primeiro amor.
Quando comecei a ler este livro, logo fiquei presa pela narrativa. Ás vezes leio alguns romances históricos e são poucos que conseguem me prender pela forma de escrita e este fez isto muito bem, narrado em terceira pessoa. A sinopse se estende bastante, me levando a pensar que este seria apenas o enredo inicial do livro. Me surpreendi, em parte negativamente, em parte positivamente, ao perceber que estes acontecimentos levavam, mais ou menos, a primeira metade do livro - senão mais. Pensei, então, que não me prenderia por já saber grande parte da estória e o que aconteceria no futuro, e gostei muito quando vi que, enquanto contava-se o que eu já sabia, haviam muito mais acontecimentos novos, na mesma passagem de tempo. Me peguei, então, curiosa para saber como seria o desenrolar, não o que aconteceria em seguida de fato.
"—De nada adiantaria afirmar que isso não vai acontecer. Seriam apenas palavras. Só posso lhe dizer uma coisa: melhor arriscar do que passar a vida fantasiando.
—Arriscar — repetiu ela, pensativa, como se não conhecesse o termo.
—Sim, pagar para ver. Não tem coragem? — ele desafiou."
A estória me envolveu muito bem, pois adoro romances onde os personagens já têm uma história há bastante tempo, nada no estilo "amor à primeira vista". Demorei um pouco, admito, para gostar da Cristina, por ser tão teimosa mesmo quando a resposta estava embaixo de seu nariz. Ao decorrer do livro, porém, fui percebendo o quanto ela era forte e admirei-a muito por isso. André tem muito destaque desde o começo, mas desgostei muito dele, por várias de suas atitudes e sua personalidade.
Me surpreendi muito com Guilherme Toledo, irmão de André, que no começo parecia apenas um personagem a mais e acabou se mostrando extremamente importante. Na verdade, praticamente todos os personagens têm certa relevância, cada um muito importante para a trama. Eduardo tem muita importância, além dos dois primeiros, e me agradou muito por suas atitudes e personalidade sempre ácida e sarcástica. As cenas que ele protagoniza com Cristina são de tirar o fôlego, com muitos diálogos bem elaborados.
"—Por que a hesitação? — indagou ele, com ternura. — Não ofereço nenhum perigo, exceto o de roubar seu coração. Mas eu cuidaria dele melhor do que você mesma.
—Que galanteio barato. — observou Cristina, divertida." - Pág. 261
Este livro trouxe uma experiência diferente para mim; sempre que me decepcionava com algo, vinha então outra coisa melhor. Por exemplo, me decepcionei com o reencontro de Cristina e André, depois de tantos anos. Esperava outra coisa completamente diferente e, no começo, fiquei irritada com cada cena, mas os acontecimentos seguintes se revelaram muito melhores que imaginei. Todo o livro é cheio de reviravoltas imprevisíveis e intrigantes, fazendo com que a leitura prenda o leitor para valer. Foi interessante, também, o modo como certo personagem passou de principal á secundário; nunca tinha lido algo assim.
O final foi bem fechado e um pouco previsível, depois dos acontecimentos dos últimos capítulos. Gostei muito da forma que acabou e fiquei muito satisfeita, porém penso que algumas cenas ficaram muito corridas e um personagem de muita relevância teve seu final em aberto.
Além das intrigas, reviravoltas e escândalos, Jardim de Espelhos traz algumas questões mais profundas, como família, onde termina o amor e onde começa o orgulho, e o perdão. Ambientado no século XIX, traz uma linguagem e costumes que realmente rementem à época, com direito a casamento por conveniência, trajes elegantes, cenas sensuais, e tudo aquilo que amamos em romances históricos.
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