spoiler visualizarNayara.Rafaelly 03/09/2020
José Carlos Reis é Historiador e Filósofo, com ênfase em Teoria da História e História da Historiografia, atuando principalmente na área de historiografia brasileira, entre outras áreas. Em sua obra intitulada “As identidades do Brasil 2: de Calmon a Bomfim: a favor do Brasil: direita ou esquerda?” O nosso passado cultural é uma das etapas mais fundamentais para definir a historiografia, pois nele se inventa a historiografia em frente ao resto do conhecimento organizado. Para dar mais credibilidade ao seu debate, José Carlos cita autores como Stuart Hall, Reinhart Koselleck, Gellner.
José Carlos começa sua obra com o poema de Gonçalves Dias “Canção do exílio”, e com a canção de Chico Buarque e Tom Jobim “Sabiá”. Mostrando em ambas a principal preocupação do autor no decorrer do texto, que é a valorização da pátria amada, evocando saudosismo pela mesma. É possível observar ainda nas entrelinhas a valorização do índio e da cultural local, mesmo depois da independência do Brasil. No decorrer de todo o texto vamos encontrar reflexões acerca da busca pela identidade.
De inicio, a autor faz uma breve introdução sobre o conceito de identidade e sobre a história desse conceito no ocidente. Fazendo uma reflexão sobre até que ponto essa crise de identidade tem nos afetado, e traz a tona à ideia de Estado -nação como uma utopia. Ele deixa claro que procurar outras referências para assumir a sua identidade, para se sentir bem, criando assim outra natureza, não é propósito somente dos brasileiros. “Há americanos antiamericanistas, europeus antiimperialistas, negros racistas, mulheres que discriminam mulheres, gays homofóbicos, Judeus anti -semitas e proletários aburguesados. (REIS. 2006. P,09).
Nós podemos decidir se vamos ser vistos como o que realmente somos, ou se vamos criar um personagem, nas palavras do autor “maquiar a nacionalidade”.
Stuart Hall diz que ao assumir a “posição de sujeito” o individuo deve agir de acordo com o reconhecimento do próprio desejo, ou seja, se valorizar e se assumir como é. “ A ação só pode ser empreendida por um sujeito que se auto aprecie, que se auto respeite, que queira viver e se expressar de forma plena e própria”. (REIS. 2006. P, 10).
Para alguns, a questão da identidade nacional pode não significar muito, mas, para José Carlos, ela é fundamental para a formação do individuo. Fica-se entendido, segundo o que ele diz, que perder a identidade implica no sucesso, na capacidade de realização, é como se não ter identidade fosse fazer com que você nunca conseguisse prosseguir, sempre fracassar, porque não conhece a si mesmo, desconhece o seu próprio eu. Como diz Sócrates: “Conhece –te a ti mesmo?” Não é apenas identificar –se, mas identificar-se criticamente.
O autor nos apresenta dois pontos de vista a respeito dessa crise de identidade: a formulação essencialista e a formulação não –essencialista. A formulação essencialista, lembra-nos das primeiras perguntas feitas ao começar a estudar filosofia? Quem somos? E seremos? E fomos? Baseando –se no pensamento de Sócrates, que esse individuo moderno, é capaz de fazer uma reflexão sobre si mesmo. A formulação não –essencialista, traz à tona as questões: Quem podemos nos tornar? O que desejamos ser? Nesse caso, o eu sempre será desconhecido, porque o ser humano esta sempre num processo de transformação. Essa visão não –essencialista surgiu no século XIX, com a critica feita pelas ciências sociais ao sujeito moderno.
Remetendo –se a visão essencialista e não –essencialista, Hall entra em harmonia com José Carlos, pois a visão essencialista procura uma identidade imutável, sempre idêntica a si mesma. Já na visão não –essencialista, segundo Hall, nenhum individuo deve ser de uma identidade que seja sempre a de pobreza, sofrimento, tec.
Neste ponto surgem as identidades pós –modernas, ou seja, as pessoas mudam de forma a todo momento, basta usar a máscara adequada para cada tipo de situação e/ou ambiente. É interessante o conceito de Hall sobre essa questão, ele usa o termo “ponto de satura” para se referir à identidade, dependendo de cada posição social. Assim, essas práticas discursivas do individuo ou de um grupo, é o que ocupa a “posição de sujeito”. Dessa forma, para ele, o conceito mais adequado de identidade é o não –essencialista.
Já foi o tempo em que classe social definia a personalidade, ou melhor, a identidade das pessoas, dos grupos. Como foi falado anteriormente: “ As identidades são máscaras criadas para se obter sucesso, seja em relações sociais ou em determinadas situações”. De acordo com o pensamento não –essencialista o termo “nação” tornou-se apenas um modo discursivo para classificar os grupos de seres humanos. “A história é o discurso que representa as identidades de indivíduos, de grupos e nacionais, e a critica historiográfica é a própria “vida do espírito” de uma nação”. (REIS. 2006. P, 20).
O tema: As identidades do Brasil, chega a ser tão profundo a ponto de nos levar até as origens do capitalismo, onde Gellner vai classificar o capitalismo como sendo fruto do nacionalismo. É como se tudo fosse planejado, nesse caso, o nacionalismo seria usado para solidificar o pode do Estado e, para tanto, seria necessário o desenvolvimento do capitalismo.
“Gellner considera esse nacionalismo romântico uma fábula, um mito. Para ele, na verdade, foi o “nacionalismo do Estado que criou as nações e não o contrário. O nacionalismo foi uma ideologia criada para a construção e a consolidação do poder do Estado, sendo necessária ao desenvolvimento capitalista. Na Europa no século XIX, o desenvolvimento capitalista foi comandado por unidades nacionais: o capitalismo francês, o inglês, o alemão. As economias eram nacionais e o nacionalismo servia ao fortalecimento e a expansão dessas economias. A competição era “internacional”. O Estado produzia a homogeneidade cultural para acelerar o desenvolvimento econômico.” (REIS. 2006. P,15).
A crise de identidade pode ser justificada também pela globalização. A globalização mexeu com o nacionalismo expansionista dos Estados –Nações. “A globalização desintegra as culturas nacionais ao ocidentaliza-las. (REIS. 2006. P, 17).
Assim como as pessoas, as culturas estão perdendo sua originalidade, seu foco, sua privacidade, seus códigos. Falar de globalização é como falar dos EUA (figuradamente falando), a quem detesta, acha violenta etc; a quem “morre” de vontade de morar lá e valoriza toda a sua modernidade. Assim como no Brasil, a quem sonha em morar aqui, quem admira as belezas naturais, como também a quem só fala na corrupção ou violência, por exemplo. “O efeito da globalização é duplo e ambíguo: por um lado, ela é desejada, pois traz a “modernidade”, mas, por outro, estimula os nacionalismos culturais locais”. (REIS. 2006. P, 17)
José Carlos tem a intenção de ser o mais claro possível ao falar sobre as identidades do Brasil e sobre os autores citados na obra. Nação- Estado e cidadania global são, para ele, utopias, aquela parece esta mais perto de nós. É possível sentir, apenas lendo, o prazer que o autor tem ao escrever sobre a importância de escrever a história brasileira. É extensa a quantidade de documentos que constituem as identidades europeias, ao contrario do Brasil.
“ No Brasil, essa “vida do espírito” é tão miserável quanto a vida material. Os estudos filosóficos são completamente aculturados e, quando à historiografia, temos pouquíssimos “ Frei Vicente de Salvador, Varnhagen, Nabuco, Bomfim, Euclides, Sérgio Buarque, Faoro. Furtado disseram isso” sobre a vida brasileira. E não se pode ignorar o peso da falta desses estudos para as nossas dificuldades na obtenção de sucesso”. (REIS. 2006. P, 20)
Para mim, para José Carlos e para Hall, é importantíssimo falar, construir discursos sobre a própria identidade. A reflexão sobre a possibilidade ou impossibilidade de um enfoque objetivo, leva a necessidade de vencer a oposição entre a objetividade ( a de uma inexistente ciência “pura”, que não seja contaminada pelo cientista) e a subjetividade (implica nos interesses, ideologias e limitações do cientista). O historiador, como qualquer outro cientista, é um produtor social, inseparável do restante da cultura humana, está sempre em contato de constante dialogo com os outros historiadores e com toda a sociedade.
Assim como o autor disse que seria o mais claro e criticamente possível, a historiografia deve apresentar critérios objetivos na medida do possível para ser compreendida. Na maioria das vezes, o que nos parece diálogos simples, em casa, na roda de amigos e etc, na verdade são fundamentais para a construção da identidade.