Lutero e a teologia da cruz

Lutero e a teologia da cruz Alister McGrath




Resenhas - Lutero e a teologia da cruz


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Weinne 03/05/2018

A Teologia do Deus revelado e oculto na Cruz
O livro de McGrath é dividido em duas partes. A primeira parte nos ajuda a entender o contexto de Lutero como teólogo da Baixa Idade Média. Para isso, McGrath nos dá um panorama do pensamento no tempo de Lutero. Ele nos mostra a diferença entre a via moderna, nominalista, e a via antiqua, de ordem tomista. McGrath demonstra que o ensino na escola em que Lutero foi ensinado seguia a escola da via antiqua. McGrath também discute se houve ou não influência da Ordem Agostiniana no pensamento de Lutero, a ponto de torná-lo agostiniano desde o princípio.
A grande questão que McGrath busca responder é: estaria o princípio do pensamento de Lutero já presente no contexto em que estava inserido? Ou houve realmente uma ruptura, na qual Lutero de fato trouxe uma contribuição? E essa contribuição é uma novidade totalmente diferente dos 1500 anos que a Igreja tinha até então, ou é uma recuperação do verdadeiro cristianismo primitivo? McGrath responde a pergunta demonstrando que o jovem Lutero era, de fato, um católico romano da escola da via antiqua. Ele era de fato um teólogo da da Baixa Idade Média. Sua hermenêutica bíblica era, de fato, a hermenêutica que reinava em Wittenberg.
A próxima pergunta a ser respondida é: quando aconteceu essa ruptura no pensamento de Lutero? Assim começa a segunda parte do livro, que busca tratar do rompimento de Lutero com o pensamento da Baixa Idade Média. Esse rompimento se dá pela descoberta da justiça de Deus por parte de Lutero. Lutero tinha uma crise existencial causada pelo conceito de justiça de Deus da teologia da Baixa Idade Média.
Esse conceito era baseado numa ideia de que haveria um pactum entre Deus e o homem, no qual Deus exige certos pré-requisitos do homem para que possa justificá-lo. Deus daria um valor maior a essa obra humana do que ela realmente merece, justificando assim a ideia de que essa salvação não seria pelo mérito, mas pela graça. A graça seria oferecida àqueles que cumprem aquilo que há neles, uma justiça interna. Essa "obra" necessária para a salvação seria a humilhação, o reconhecimento de dependência absoluta de Deus; ou até mesmo, num desenvolvimento prematuro de Lutero, a fé (não como dom de Deus, mas como uma resposta humana ao senso de dependência, bem relacionado à ideia de humildade).
Lutero se debate com o assunto da justiça de Deus durante a segunda 0,exposição dos salmos, que ele realiza entre 1514 a 1519. No fim dessa exposição, ele tem formada sua nova descoberta da justiça de Deus, a qual serviu de novo panorama pelo qual ele reviu toda a sua teologia. Sua questão existencial está resolvida. A justiça não é interna, mas externa. A salvação é pelo mérito de Cristo, e não por uma obra previa que devemos cumprir para alcançá-la. Pois, como o homem saberá se tem dentro dele aquilo que, ao ser cumprido, o torna digno da salvação? A graça nos é aplicada por Cristo, e não por um ato de nossa parte, ainda que seja um ato de fé ou de humilhação. A nova teologia de Lutero foi desenvolvida gradualmente, durante sua segunda exposição dos Salmos. Ele, contudo, se debateu com a questão da justiça de Deus, questão que foi resolvida próximo de 1519, quase no fim de sua série de exposições.
Por fim, McGrath discute a "teologia da cruz", teologia na qual Lutero propõe que a verdadeira teologia parte da cruz para a sua construção, e não de pensamentos humanos. É uma teologia que primeiro contempla a cruz, e depois fundamenta nela uma teologia, e não o contrário. Ao se debater com a influência de um conceito aristotélico de justiça que influenciou o conceito de justificação para os teólogos da Baixa Idade Média (estando ele incluído nisso), Lutero viu o perigo de uma "teologia da glória", isto é, uma teologia da razão, em vez de uma "teologia da cruz", isto é, uma teologia que olha para o Deus revelado e oculto na cruz. Uma teologia da cruz considera que Deus se revela e oculta ao mesmo tempo. Na cruz, a humanidade e divindade, a ira e a misericórdia, a glória e o sofrimento, aparecem todos ao mesmo tempo. Ao olharmos para a cruz temos o fundamento da verdadeira teologia.
Essa teologia da cruz é relevante para o mundo pós-Segunda Guerra, quando a nossa teologia se choca com a nossa experiência. Ao olharmos para o sofrimento de Deus, temos um vislumbre do paradoxo de um Deus que sofre. Contudo, essa teologia pode cair em certos exageros, o que críticos de Lutero apontaram com razão.
Lutero e a Teologia da Cruz é uma excelente obra, necessária para se entender o desenvolvimento do pensamento de Lutero a partir das pesquisas mais recentes. É curioso, entretanto, que tão pouco espaço da obra seja realmente dedicado à Teologia da Cruz, um assunto tão rico e, ao mesmo tempo, paradoxal do pensamento de Lutero; e talvez o seu desenvolvimento mais profundo e sistemático.
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