Kizzy 29/07/2015
Chico Buarque por ele mesmo
Nunca tinha lido um livro escrito pelo Chico. Apesar de todo meu apreço por sua obra musical e poética, nunca de fato me interessei por ler seus livros. Até que ganhei esse de uma amiga, e encontrei nele mais uma serendipidade como o próprio Chico descreve em seu romance meio autobiográfico meio inventado.
Tenho sempre muito interesse em histórias genealógicas, como essa que o autor descreve no livro, a busca por um irmão que ele de fato sabia que tinha, e que sempre teve curiosidade de encontrar, de saber dos caminhos. Como no livro do Kunta Kinté, que o autor também procura documentos que contam a história da sua própria família, e aí escreve um romance sobre como imaginava que tinha sido. Se eu tivesse dinheiro, eu também contrataria um historiador para "contar" a minha história, isso me fascina.
Só que fazer isso, com a qualidade de texto do Chico, isso realmente é uma dádiva. Na verdade, o texto acabou me chamando mais atenção que a história. Como ele escreve bem. De fato nem acho que foi o melhor enredo que eu já li, e em alguns momentos ficou até meio entediante eu confesso. Mas como é bonito ver a língua portuguesa usada com essa qualidade. É um talento de poucos.
O texto é majoritariamente descritivo, o que para mim é uma qualidade, porque adoro aqueles textos que o autor vai dizer algo, aí fica duas páginas descrevendo o vazo da sala, mas se você não gosta disso, acho que pode se irritar em alguns momentos. Além disso, os recursos narrativos são também muito bons. O contraponto da vontade de descobrir o irmão desconhecido com o desprezo pelo irmão que já existia, o contraponto entre o nazismo que podia ter tirado a vida do irmão imaginário com a ditadura que de fato tirou o real irmão, a vida em busca do que não se tem em contraponto de não ligar para o que de fato está lá.
Minha avaliação geral é que vale muito a pena ler, não só porque é do Chico, mas também porque é dele, e porque é a prova de que todos nós temos uma história que daria um romance. Eu queria no fim da minha vida, poder escrever o meu, mesmo que não publicasse.
Li muitas críticas dizendo que esse não é o melhor livro do Chico Buarque, e que só fez sucesso por causa do nome dele. Talvez as duas coisas sejam verdade, por isso vou ler os outros, já que ganhei mais um de outra amiga. E quanto a viver de nome, bem, eu acho que antes de você viver do seu nome, você tem que provar que pode fazer isso e acho que ele realmente o fez, então, quem sou eu para criticar.
"A vida não passa de um longa perda de tudo que amamos, disse Victor Hugo"