Marcos Pinto 26/01/2015Surpreendente! Neste livro conhecemos Daniel, um garoto simples, inocente e “cabeça de vento”, como ele mesmo diz de si. Ele mora na região amazônica, um lugar quase esquecido se comparado com as grandes capitais. Porém, com a ditadura e a fuga da resistência para a selva, a cidade de Daniel fica repleta de soldados armados e prontos para matar.
Daniel mora com o pai e com as irmãs e apanha quase que diariamente por causa de suas trapalhadas. E isso, é claro, não o impede de continuar praticando-as. Com a chegada de Victor, vindo do Rio de Janeiro para se hospedar em sua casa, Daniel só consegue aumentar ainda mais as “besteiras” que faz, principalmente porque acredita que seu novo amigo levar-lhe-á para o Rio.
Nosso protagonista, apesar de um tanto ingênuo, é um garoto apaixonado. Ele ama Heloisa de uma maneira absurda para alguém da idade. O grande problema é que o pai da menina tem ideias um tanto proibidas para época. Isso, aliado à amizade que o garoto passa a ter com Victor, e sua “cabeça de vento”, acabará colocando-o em um caminho que ele poderá se arrepender. Talvez a luta contra a ditadura seja mais dele do que imagina.
“Nunca havia beijado uma garota. Mesmo assim eu andava pensando em fazer qualquer coisa, o impensável, especialmente alguma mágica para a gente namorar. Eu carregava os efeitos de uma repressão religiosa, achava que tudo relacionado a sexo e ao desejo era pecado, peguei isso nas missas a que eu assistia aos domingos quando era moleque” (p. 21).
Antes que o sonho acabe é um livro extremamente verdadeiro, real e que nos passa sentimentos tensos e conflitantes. Não é o típico livro com um mocinho maravilhoso e um final de arrancar suspiros; ele ensina sobre a ditadura enquanto narra dramas verdadeiros, contextualiza enquanto brinca com as palavras. Exatamente por ser diferente, é uma excelente obra.
Hermes Leal merece meus aplausos por conseguir transmitir toda a angústia, tensão e dificuldades de uma guerra através dos olhos de uma criança. Entendemos a dor do protagonista, seus anseios de liberdade e como é sofrível ver as pessoas tratadas como animais por um governo burro, troglodita e facínora.
Todos os personagens, sem exceção, são convincentes e conseguem nos transmitir seus sentimentos. Entristecemo-nos com a dor deles, sorrimos com suas pequenas vitórias e, acima de tudo, torcemos para que eles consigam ficar vivos; o que, a partir de um determinado momento do regime militar, é quase impossível.
“– Não vou me levantar e não vou sair daqui não. Se quiser é só puxar essa pistolinha aí e atirar. Esse papo de matar guerrilheiro não está com nada, esse papo de guerra é careta. E eu não tenho medo de você” (p. 73).
Aliado ao bom enredo e desenvolvimento, temos uma diagramação bonita, confortável e que torna a leitura ainda mais ágil. Não obstante, a excelente revisão também contribui para que a obra seja ainda mais agradável.
Não vou mentir dizendo que indico o livro para todos, pois esse não é o tipo de livro que agradaria alguns leitores. Mas para quem quer conhecer mais sobre a ditadura militar através de uma obra excelente e com um ótimo desenvolvimento, certamente adorará esse livro, assim como eu.
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