Na Pata do Cavalo Há Sete Abismos

Na Pata do Cavalo Há Sete Abismos Clarissa Macedo




Resenhas - Na pata do cavalo há sete abismos


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Penalux 27/10/2017

Reflexões de estrebaria

“Na pata do cavalo há sete abismos” é o livro da escritora baiana Clarissa Macedo. A autora traz a imagem do cavalo, para brincar nos galopes da palavra com o intuito de criar uma diferente metáfora para o viver.
A lírica da poeta é sutil, seus versos rasgam camadas de consciência dos leitores, levando-os a reflexão. Os poemas desta obra, são para serem paulatinamente apreciados, conforme o a lírica vai se revelando a compreensão do leitor.
Fazendo jus ao nome do livro, na poesia “Sete abismos” a autora cavalga na sutileza de incomuns metáforas para se referir aos desdobramentos inevitáveis do viver: enfrentar desafios, perder o controle da própria vida, visto nos versos “A alma relincha/ na estrebaria. / Macho de cavalo / que galopa trovas / do pensamento / engole as águas / de pasto e feno. Há terror nos ventos de cavalo magoado...
A força da poesia de Clarissa é a profundidade de seus versos. As palavras que se unem “Na pata do cavalo há sete abismos” confluem para criar uma filosofia à cerca das intempéries da vida. No seu poema “Da invenção da vida”, o leitor é convidado a uma interpretação do viver, na qual a imaginação é tida como recurso para compreender a vida, como nos versos “Do mar que se inventa / emerge uma rocha. Do que se inventou fora disso / há rumores de um tempo....
A obra é escrita em versos livres dando suporte a uma fluidez de enredo que visa explorar o significado das coisas, contando com a ajuda da imagem, a qual é desperta no poema com o intuito de levar o leitor para a apreciação das emoções e do viver.
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Krishnamurti 26/03/2017

NA PATA DO CAVALO HÁ SETE ABISMOS
“Na pata do cavalo há sete abismos” – poesias, da escritora Clarissa Macedo acaba de ganhar segunda edição. A primeira resultou de a obra ter sido vencedora do Prêmio Nacional de Poesia da Academia de Letras da Bahia no ano de 2013. Num país como o nosso, de fraco mercado editorial (porque é verdade, a demanda por leitura não está incluída nas necessidades da esmagadora maioria da população), mesmo obras que se destacam em Prêmios Literários têm dificuldade de chegar ao público leitor que, também é verdade que se diga, felizmente existe. É que falta-lhes o empurrão do interesse meramente especulativo e financeiro da toda poderosa mídia que, via de regra, enaltece, divulga e impulsiona autores que lhe são convenientes. Subservientes, aos ditames da imbecilidade cultural. Mas isso é outra história. Vamos ao livro.
É realmente motivo de festejar essa 2ª edição da obra, pois o que o leitor mais cuidadoso sente ao ler o livro de Clarissa Macedo é o despontar de uma autora que apesar de jovem, denuncia uma poesia forte, vigorosa, promissora no sentido de continuidade, já que no da qualidade, mostra a que veio. E esse título... “Na pata do cavalo há sete abismos” ?
É uma feliz escolha de poemas que, vistos em conjunto, traduzem o simbolismo da cosmovisão da autora. O animal que cavalga na poesia de Clarissa é inteiramente selvagem e por isso mesmo de uma doçura primeira. Não tem medo, é avesso a celas e cabestros. No entanto está preso numa estrebaria, impacienta-se, bate com os cascos na terra, relincha, para afinal derrubar cancelas, libertar-se e trotar rumo aos caminhos do sonho, galopar velozmente e finalmente alçar voo rumo ao universo da imaginação libertadora, onde irá defrontar-se com os abismos do viver. Belíssima metáfora que se reforça e se adensa pela referência ao número sete. Místico por excelência, este número indica o processo de passagem do conhecido para o desconhecido. Uma combinação do três com o quatro; o três, representado por um triângulo, é o Espírito; o quatro, representado por um quadrado, a Matéria. O sete podemos dizer, simboliza a Matéria “iluminada pelo Espírito”. É a Alma servida pela Natureza. Uma totalidade em movimento ou um dinamismo total, isto é, a totalidade do universo em movimento. Eis aí, no nosso entender, esse belo cavalo e seus...
Sete abismos
...”Há terror nos ventos / do cavalo magoado, / que perdido rompe, / alado, as trincheiras / e cai como anjo / de tormento.
... “ Naquela crina / de ferraduras negras / um cavalo de patas ralas: / Os sete abismos da vida.”
O animal que cavalga pelo pasto interior incendiado da autora testemunha:
Jornada
A sombra engravida / o nome / dos inomináveis.
Feito pó na calçada / surge / um rastro de homem
surge a vida / mil vezes alucinada
parindo números / de mortos / desde ontem, / desde a era passada.

Mas há também o enveredar por outros caminhos mais largos / abismos (?) ...
Ficção
A história é uma trégua sem memória / uma rua que não se habita
é um passado que se move / uma eternidade de sete dias.
E entre concubinas, napoleões e marias / o que permanece é o ópio de cada molde.

E finalmente três breves poemas. Sem mais comentários; os poemas falam por si.

O gesto da criação
Na trama das melodias que calam / dos versos que fogem no bando / crava-se a flecha de um sintoma.
Ao romper signos, penetrar espantos, / longe de escrever as núpcias, / engasgo num rio de dúvidas
e pereço... só a palavra é cúmplice / do que enlouqueço.

Irmandade
Qual a cor do teu drama? / quantos lares saem de teus cabelos?
Com quantos homens se reparte / o último fio de desespero?
Em tempos de paixão e fome / os credos são maiores que as roupas / os vôos maiores que as asas.

Fábula
No teu aprisco imenso / sempre houve uma ovelha / pequena, cinzenta desajeitada
aquela que frente ao cajado, / ao latido do cão também imenso, / fugia e não se guiava
aquela que diante do espelho d´água / não cria na imagem que se revelava / nem na eternidade de que ouvia
aquela que nua, de lã cortada, / sussurrava cantos às irmãs.

Livro: “Na pata do cavalo há sete abismos” de Clarissa Macedo - Poesias – 2ª Edição, Editora Penalux, Guaratinguetá – SP. 2017, 82p.
ISBN 978-85-5833-155-5
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Penalux 07/03/2017

A poesia extemporânea de Clarissa Macedo: Obra vencedora do Prêmio Nacional ALB 2013 costura alegorias sob voz poética pautada por inadequações
Em uma crônica de 2013 chamada “Brasileiríssimo Esquerdinha”, Ugo Georgetti afirmava ser um erro acreditar que todos somos contemporâneos. Se o cineasta criava levemente um axioma para compreender um mítico massagista de futebol, Na Pata do Cavalo Há Sete Abismos, de Clarissa Macedo, reafirma ao seu modo a ideia de que o tempo é um engano e não pertencemos a um fluxo único. Aqui, estamos diante de uma poeta de força, de velocidade e de caminhos heterodoxos. O tempo, o lócus é outro.
Desde o título-aforismo com conotações misteriosas, percebe-se um intento primário de jogar com as palavras, de bagunçar os signos e de fazer usucapião das substâncias antigas dos sentidos – aquilo que Hilda Hilst chamava, distante do pró-forma, de os grandes sentimentos serem inomináveis.
Sem esconder idiossincrasias ou símbolos comoventes, Clarrisa produz uma poesia limpa, sem excessos pop ou, em última instância, sem resvalar para a performance – característica cada vez mais usual na poesia contemporânea, onde a palavra parece “funcionar”, ecoar melhor se mais pesada, mais ruidosa.
[A figura do cavalo carregaria, por suposto, uma estética: força e elegância. Animal de guerra, altivo, convive com a duplicidade de carregar beleza e a sina bruta de ser montado. Cavalo-poeta, leitor-livro.]
Por fazer uso de um conjunto poético sem hermetismo, Na Pata... aparenta uma simplicidade solta, como se fosse uma obra ligeira. Engano. O que vemos é uma autora colocando à disposição seu repertório em construção, o seu modus operandi, como se estivesse a nos dizer que o poeta, mesmo quando aparenta transparência, vive naquele mundo intranquilo de Jorge de Lima, onde se agitam seres ignorados. “Suspeita”: “Não se fie: / a vida caminha / como réstia / de luz em brasa; / e na noite / traga e tilinta / o corpo moço, / a embriaguez / e a alvorada.”
Clarissa Macedo, nascida em Salvador (BA), é licenciada em Letras Vernáculas, mestra em Literatura e doutoranda em Literatura e Cultura, além de revisora, professora, tradutora e pesquisadora. Deste percurso teórico arrebenta surpreendentemente uma poesia reluzente, como em “Teorema”: “A vida é uma mulher estéril / nomeando os filhos / que nunca poderá ter”.
O caráter de limpeza de Na Pata... não esconde, por consequência, o rigor na seleção de palavras. Assim, nos deparamos, quase em desaviso com imagens como “corredeira sem remos” e “o deserto é uma janela aberta” ou a comovente geografia do medo de “A chuva interfere nas ilhas como quem deita de luz acesa”.
Fazendo uso correlato do semiótico francês Pierre Bourdieu, para quem o olho não é o olhar, a poesia de Clarissa Macedo se distancia da literatura de caixotinho – aquela que se apresenta de cima para baixo, o leitor como elemento decorativo – e entrega um modo de ver, uma singularidade interpretativa, uma língua de tempo. O belo “Ficção” demonstra essa turnê de força:

A história é uma trégua sem memória
uma rua que não se habita
é um passado que se move
uma eternidade de sete dias.
E entre concubinas, napoleões e marias
o que permanece é o ópio de cada molde.

Na Pata... transmite o frescor da poesia fora dos gabinetes. As habilidades de estilo não querem aparecer mais do que a vontade de dizer. É uma nudez poética (ao mesmo tempo estranha e imoderna) de uma autora que não se esconde em construção, em espanto.

Resenha por: Daniel Zanella
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