Lauraa Machado 12/01/2019
Nem o romance salva
Não posso falar que esperava muito desse livro. Pelo que eu vi sobre ele e a outra série da autora, seria quase impossível eu gostar. Logo no começo, já pude perceber que a escrita da autora não é para mim. Ela é bem simples, em muitas partes senti que lia uma fanfic, daquelas que fazem questão de explicar toda a roupa da protagonista e como elas são de marca em várias partes de uma história que deveria ter um foco diferente e mais importante. Também me pareceu ter sido escrito por uma adolescente, que realmente acha que faz sentido ficar pensando em beijar uma múmia quando há alguns segundos quase morreu.
Sim, eu sabia que esse livro provavelmente não era para mim e, para ser bem honesta, me diverti bem no começo, mais do que esperava. O problema é que a ideia dele me pareceu tão boa, que fiz questão de dar uma chance, como faço com muitos livros que me deixam curiosa apesar de suas críticas ruins (em minha defesa, duas trilogias já me surpreenderam e se tornaram algumas de minhas favoritas depois de eu dar uma chance dessas). A única razão para eu não me arrepender de ter comprado esse livro é que só posso descobrir que ele é realmente ruim lendo.
Dá para perceber problemas no livro desde o começo. A primeira coisa que me incomodou foi como a autora explicou a história de vida da protagonista e sua relação com os pais em texto, em vez de atitudes. Não só deixou sua história superficial, como foi bem chato ficar lendo um resumo de apresentação da Lily que não fazia o menor sentido e nem encaixava no momento da cena. Essa mania de infodumps aparece várias vezes pelo livro, muitas sobre a Lily, mas a maioria sobre o Egito, os príncipes e essa mitologia que a autora pesquisou muito e usou bem mais do que deveria. O livro é cheio de histórias secundárias e paralelas, várias que não afetaram em nada o enredo, outras que desviaram o foco da história. Mas falo disso mais para a frente.
Outra coisa que eu detestei foi o absurdo complexo Mary Sue da protagonista (ou seja, ela era A especial, diferente de todas as outras). Ela usa a frase "eu não sou dessas garotas que" umas mil vezes para as coisas mais bestas do mundo! Em vez de falar "eu não sou emotiva", ela aparentemente sente a necessidade de falar "eu não sou dessas garotas emotivas", além do clássico, "todas as garotas da minha escola fariam tal coisa, mas eu não sou como elas." Simplesmente odeio personagens assim. A desunião com outras garotas está sempre presente quando ela interage com elas - ou seja, uma ou duas cenas minúsculas no começo.
Não tem garotas nesse livro além da protagonista. Colleen Houck aparentemente acha que suas leitoras querem ser as únicas mulheres do mundo, rodeadas de homens musculosos que praticamente podem ser chamados de deuses e que ficam admirando sua beleza o tempo todo. Pois eu quero estar rodeada de mulheres incríveis e ter um só carinha que definitivamente não precisa ser perfeito - principalmente fisicamente, - e que se interessa pela minha opinião pelo menos tanto quanto minha aparência.
Eu não sei se é um bloqueio meu, mas nunca consigo ser conquistada por caras musculosos, maravilhosos, perfeitos. É bem diferente você perceber que um certo cara por quem já está interessada tem um corpo bacana de só conseguir ver o físico exagerado e desnecessário dele o livro inteiro. Pior ainda é quando criam um romance absurdo logo no começo por questões completamente superficiais e, em vez de assumirem que é só atração física, vira o amor do século, merecedor de todos os piores sacrifícios.
Revirando os olhos aqui. O romance foi bem mal feito mesmo. O começo do livro é bom, a Lily tem personalidade e sua própria vida, tem opinião e, se não fosse por aqueles pequenos detalhes que comentei antes, super daria para ser ótimo. Mas aí ela embarca com Amon na tal aventura e de repente só consegue pensar em beijá-lo, mesmo à beira da morte. Não só é ridículo estar pensando nisso - pelo amor de deus, até o cara mais incrível no mundo não conseguiria me fazer pensar em beijo se eu estivesse quase morrendo, - mas toda a criação do interesse da Lily pelo Amon foi mal feita.
Foi, sim, inteiramente superficial o tempo todo e, pior ainda, completamente desnecessária. Por metade do livro, só existem dois personagens, Lily e Amon, que estão o tempo todo juntos e em posições que praticamente proibem qualquer relacionamento amoroso. É a receita perfeita para um ship, mas a autora destruiu essa possibilidade quando forçou a protagonista a pensar nisso tão rápido (para uma garota que teoricamente não estava nem aí para nenhum cara). Forçar toques e falas bizarras e um pouco íntimas demais foi feio. O pior é que não faz o menor sentido alguém se interessar por basicamente uma múmia, ainda mais quando eles nem tinham nenhuma química. Fiquei bem decepcionada com esse romance, que achava que seria a única coisa com a qual poderia contar nesse livro.
Sabe aquele complexo Mary Sue da protagonista? Está presente o tempo todo na relação dela com os homens da história. Não tem um único que não a ache bonita e não a deseje, ainda que de um jeito bem asqueroso. Até um cara velho o suficiente para ter todo o cabelo branco diz para ela que adora quando garotas jovens e atraentes como ela o chamam por um nome aí. Imagine meu nojo. Essa necessidade de encher o livro com elogios para a protagonista, principalmente para sua aparência, além de criar a ideia de que garotas precisam de aprovação de todos os homens sobre sua beleza, cria situações sem noção como essa, que beiram o assédio.
E eu poderia criticar mais várias coisas sobre esse livro, mas vou falar só de mais uma. A mitologia e a imagem que a autora passa do Egito é muito lúdica e caricata. Ela não só usou muitas informações desnecessárias e que nem encaixavam na história naturalmente (pensa em trezentas teorias e brechas aparecendo em horas propícias demais para os personagens), a ponto de ficarem bem aleatórias e levarem a situações e criaturas ridículas, como fez questão de usar a palavra "exótico" para várias coisas (tosco). Isso ajudou a transformar toda a luta deles em algo bem fácil. Não importava o que acontecesse, sempre alguém teria algum poder ou algum feitiço para reverter. A autora não assumiu nenhum dos problemas que criou, só criou outras brechas para resolvê-los e tudo acabar sempre bem no final. Usar várias histórias do Egito sem localizá-las na sua cultura e na história para isso tirou qualquer credibilidade que o livro tinha potencial de ter. Nem o próprio Egito atual pareceu um país de verdade. Nada aqui parecia mesmo real ou determinante. Eram três irmãos tentando salvar o mundo, e eu simplesmente não dava a mínima se eles iam conseguir ou não. Só estava rezando para eu conseguir terminar o livro logo.
Existem tantas outras autoras que são inteligentes, feministas e que realmente trabalham em cima de suas histórias. Como eu queria que essa ideia - que tanto me conquistou a ponto de eu decidir ler um livro que sabia que não gostaria - tivesse sido escrita por uma delas. Esse era um livro que poderia ter sido rico, emocionante e apaixonante. Acabou sendo fraco, pobre e forçado. Definitivamente não recomendo, não vou continuar a série e pretendo nunca mais ler nada da autora.