Maria Ferreira / @impressoesdemaria 08/08/2017A questão da maconha é uma questão políticaApós uma campanha enérgica contra a maconha, desde as plantações ao tráfico, com prisões de sipikats (traficantes), ficou cada vez mais difícil conseguir yamba (maconha) para uso próprio, para venda ou para qualquer tipo de finalidade. É nesse contexto que conhecemos o protagonista e narrador do livro, Amuyaakar Ndooy e seus gaay (amigos) Bukari, Badara, Yaba Xanca, Laay Gooté, depois que o último traficante, Dappasa, foi preso. Para eles, a escassez de maconha, era até pior que a escassez de água, que predominava em Sambey Karang, aldeia onde moravam.
Desse modo, eles tentaram substituir a maconha pela bebida alcoólica, mas era igualmente difícil encontrar álcool, já que a bebida foi proibida por questões religiosas.
Amuyaakar Ndooy é um motorista de táxi, que mora com a família, até que recebe uma proposta para traficar maconha por um excelente preço. Pensando no dinheiro e em tudo que poderia proporcionar a sua família, aceitou a proposta e junto com os amigos, vai fazer de tudo para fazer com que consiga realizar a entrega sem ser descoberto pela polícia.
Com a leitura desse livro, é possível ter uma visão mais ampla de como funciona o sistema em relação à maconha, criminalizando uns, mas enriquecendo outros. A realidade é que, no fundo, tudo se trata de política e este é um livro que pode ser muito esclarecedor neste sentido.
Achei muito interessante a presença de expressões em wolof, idioma falado em algumas regiões de Senegal, com notas explicativas sobre a tradução em português, isso faz com que o leitor possa se sentir mais imerso na leitura por estar entrando em contando com algo tão importante de um país, seu idioma.
Mesmo que o assunto principal seja a relação do personagem principal com a yamba, também conhecemos outras áreas de sua vida, como suas vivências amorosas e seu relacionamento com Désirée, mulher de caráter forte, decidida e determinada, que sempre soube se impor e aceitou Amuyaakar Ndooy do jeito que ele era, ainda que no começo não aceitasse que ele fosse mesmo um traficante, com o tempo foi acreditando e foram construindo um relacionamento com base na sinceridade, o que me surpreendeu positivamente.
Com um tom de conversa, na qual se faz um relato descrevendo situações já vivenciadas, é uma narrativa muito gostosa de se acompanhar. A leitura flui fácil e só nas últimas páginas ganha um quê de thriller policial, fazendo uso de recursos bastantes clichês do gênero, o que me irritou um pouco porque destoou do que estava sendo narrado até então, mas apesar disso, o livro não perde sua importância e sua leitura não se faz menos indicada, principalmente para quem quer conhecer um pouco mais da cultura, religião e aspectos geográficos do Senegal.
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