spoiler visualizarHelio sampaio 09/05/2015
Como tem tanta gente interessada para ler, vou colocar um aperitivo aqui.
Problemático
- O senhor tem mais de quarenta anos, portanto é necessário...
- Não vou não!
- ... Fazer um exame. Como?
- Não vou fazer essa obscenidade.
- Mas, meu senhor, pense na sua família. O exame preventivo pode, em muito, aumentar a expectativa de vida. Podemos fazer o tratamento adequado, caso se confirme uma doença.
- Aí que está, doutor. Se confirmar que estou doente, me fodi! Caso eu esteja bem, passei por essa provação à toa. Vejo isso como uma dupla derrota. Não vejo onde ganho.
- Deixe de bobagem, homem. Mulheres passam por procedimentos mais invasivos o tempo todo. Está tendo a mente fechada.
- E espero que continue assim... Tudo bem fechadinho.
- E se estiver doente?
- Tomo uma cachaça para esquecer.
- Não é assim. O senhor veio ao meu consultório, bem se vê que é um homem sério, preocupado com a saúde, querendo chegar até o fim da sua vida...
- Me diga uma coisa, doutor.
- Sim.
- O senhor já fez esse procedimento?
- Não.
- Então, como é que o senhor pode me aconselhar a fazer isso?
- Mas vou fazer quando tiver a idade e, se houvesse suspeita, como uma retenção urinária, eu, prontamente, o faria.
- Com essa boa vontade?
- Para de besteira! Isso é só uma fase da vida. É uma coisa que todo homem tem que fazer.
- Mesmo?
- Claro! Estamos em um mundo evoluído e o que é um instante de sofrimento diante do gozo da vida.
- Sofrimento?!!
- Calma! Não dói. Vou lhe mostrar o que vou fazer. Eu vou enfiar este dedo no seu ânus...
- Vai enfiar o caralho!
- Calma! Vou lhe mostrar um vídeo educativo para convencê-lo a fazer o exame.
- Sei não.
- É bom. Assim faz uma idéia melhor de como vai ser. Olha, já estou ligando.
- Ô, doutor! Como é que convenceram esse homem a aparecer no vídeo?
- Ah! São atores treinados para isso, pessoas que querem dirigimir as dúvidas dos outros e não têm tanta frivolidade ou pessoas que não tiveram dinheiro para pagar a consulta.
- Eu já paguei!
- Brincadeira. Olhe lá! Ainda coloco o gelzinho.
- Pelo menos isso, não é, doutor? Pera aê! O senhor ainda vai girar o pulso?
- É, na posição das seis e das nove horas.
- Doutor, o senhor ainda vai ver hora nos meu ânus? Vá comprar um relógio!
- Bobagem! Isso é só para identificar o possível aumento da próstata.
- E não tem outra forma?
- Por enquanto, não. É simples. Te garanto. Vai sentir só um leve incômodo.
- Leve, diz o senhor. Olha só o tamanho do seu dedo!
- Tolice. Comparado a uma sonda, o dedo até que é pequeno. Olha, essas doenças de que queremos nos precaver podem causar muita dor. Já imaginou o sofrimento de tentar urinar e não conseguir?
- O senhor está tentando me enganar, isso é pedra nos rins. Eu pesquisei na internet.
- Pode acontecer também. Vamos! Identificado o problema, o resultado do tratamento é excelente.
- Excelente, diz o senhor. Que tipo de pessoa se presta a ter uma profissão dessas?
- A Medicina, atualmente, se divide, se ramifica. Resolvi me especializar nisso.
- Ainda não me respondeu. Como o senhor escolheu essa vocação?
- Pagava bem.
- Sei, podia ter virado ginecologista.
- Garanto-lhe que o meu serviço profissional seria o mesmo. Podemos?
- Merda. Tem uma doutora não?
- Ficaria mais fácil se fosse uma mulher?
- Fácil não. Mas, sei lá, acho que fica melhor.
- Adalgiza! Vem cá!
- O que foi, doutor?
- Pode mandar voltar!
- Nada não, Adalgiza.
- Você viu o tamanho do dedo dela? Mais grosso que o meu pau!
- É por isso que ela quase não tem clientes.
- E como é que ela sobrevive?
- Ah! Tem os do tipo que repetem o exame muitas vezes.
- Eu vou ter que repetir?
- Mas é claro! Todo ano.
- Porra, doutor!
- E então, vai fazer ou não?
- Vou, né? Sou cabra macho, não é um dedo no cu que vai me fazer menos.
- Tudo bem. Vira de bruços e arria as calças.
- QUÊ ISSO!
- O que foi?
- Ah, doutor! Bem se vê que o senhor não tem muita experiência. Não é o que se fala, é como se fala.
- Tudo bem. Posicione-se de costas para mim, apoie-se com o cotovelo e retire a parte inferior das roupas? Melhorou?
- Sim. Mas, olhe, juro que, se ficar de gracinha, arrebento-lhe a cara.
- Eu sou um profissional sério. Se o senhor continuar com essa criancice, pode voltar para casa que tenho mais o que fazer.
- Desculpe.
- Desculpas aceitas.
- Pôxa! O senhor é que vai enfiar o dedo no meu cu e eu ainda tenho que pedir desculpas? Como este mundo está doido!
- Senhor...
- Justamente! Só o Senhor para me salvar. Mas vamos com isso.
- Tudo bem.
- Ai!
- O que foi? Eu só toquei.
- Mesmo?
- Tente relaxar. Se contrair, ele pode fica preso.
- Como é que é isso?
- Já pensou? Meu dedo ficar preso na sua bunda e termos que esperar até abrir? Poderia até ter que chamar outros médicos para me ajudarem. Portanto, relaxe: assim, não vai contrair.
- Aí que eu não relaxo mesmo.
- Quer um remédio para se acalmar?
- Tem um que desacorde não?
- Até tem, mas são para a sala de cirurgia. Isso é só um exame. E você realmente preferia ficar desacordado?
- Pensando melhor, não. Vai saber o que vai enfiar em mim? Pelo menos, estamos só em um dedo.
- Vou introduzir. Ok?
- Se o senhor está esperando um aceno meu, vamos ficar aqui o dia todo.
- Ughhhh.
- Pronto, acabou. Viu como foi fácil?
- Pôxa! Realmente. Tanto problema para nada. Desfiz-me dos meus preconceitos. Só o tempo que fiquei discutindo já dava para resolver isso. Não é algo que eu recomendaria, mas é uma coisa que dá para se fazer.
- O senhor comeu feijão?
- Como?
- Porque veio uma casca no meu dedo.