A cerimônia do adeus

A cerimônia do adeus Simone de Beauvoir




Resenhas - A cerimônia do adeus


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Ive Brunelli 18/09/2012

Relato corajoso e comovente
Neste livro, Simone de Beauvoir descreve os últimos dez anos da vida de Jean-Paul Sartre. Junto à descrição dolorosa de crises de hipertensão, perda crescente de memória, tonteiras, cegueira rampante, incontinência urinária e intestinal, perda de dentes, paralisia na face, entre outros horrores de sua decrepitude, ela discorre sobre a militância do companheiro, suas atividades políticas, filosóficas, literárias, palestras e viagens, além de expor detalhes sobre o cotidiano de Sartre: hábitos, alimentação, diversão, conversas, reuniões e suas tantas bebedeiras.

O que poderia parecer um texto mórbido e sem propósito específico – senão o desespero e a tristeza – acaba constituindo uma experiência biográfica ímpar: afinal, Jean-Paul Sartre é um dos intelectuais mais representativos da filosofia contemporânea. Essa mistura de despedida com militância, trabalho e cotidiano tornou-se, no final, muito interessante para qualquer leitor interessado na produção intelectual e na vida de Sartre.

Pragmática e precisa, Simone de Beauvoir aborda o impressionante ecletismo da contribuição sartreana para a história do pensamento: escreveu romances, novelas, contos, ensaios de filosofia e política, militou ativamente junto a inúmeras causas populares em diferentes países, e sua teoria existencialista defendeu inexoravelmente as noções de verdade e liberdade.

Comovida, porém sem lirismo nem pieguice, descreve, ano a ano (de 1970 a 1980), a decadência física de Sartre em meio à sua atividade intelectual intensa (junto a outros pensadores como Genet, Foucault, Daniel Cohn-Bendit, Truffaut e Deleuze, por exemplo). Conta como ele recusou o Prêmio Nobel, como lutou contra todas as instituições, como se encheu de remédios para controlar dores.

Uma manhã, ao levantar-se com extrema dor nos pés, exclamou: “Entendo que se amputem os pés”. De Beauvoir conta também como Sartre fazia com que amigas e cuidadoras lhe trouxessem uísque e vodka sem que elas desconfiassem do perigo que isso representava para a saúde dele. No final, ela descreve o incrível funeral de Sartre, no qual compareceram mais de 50 mil pessoas. E desabafa: “Sua morte nos separa. Minha morte não nos reunirá”.

Li este livro por um interesse pessoal no tema da decrepitude e da velhice. Como ao texto da Cerimônia do Adeus se seguem mais 450 páginas de entrevistas que a autora realizou com Sartre em 1974, pensei em abandonar esta parte final, que não me parecia contemplar exatamente o foco de interesse inicial de minha leitura. Entretanto, mal comecei a ler as entrevistas, não pude mais deixar o livro de lado. Logo, logo, senti que se tornaria um dos meus livros favoritos. As entrevistas são simplesmente magnéticas, apaixonantes.

Realizadas em Roma e Paris, compreendem toda a vida e a obra de Sartre. A forma como Simone de Beauvoir as conduziu é de uma leveza e perspicácia impressionantes, criando o clima ideal para Sartre versar sobre os mais diferentes temas sem nenhuma censura, nenhum corte abrupto, sem maniqueísmos nem prolixidade. É possível ler as entrevistas como se estivéssemos diante de um romance de espionagem: o interesse pela leitura aumenta a cada página.

Principais tópicos das entrevistas:

O aspecto literário e filosófico da obra de Sartre
Detalhes sobre a escrita de A Náusea
A infância em La Rochelle e a mudança para Paris
A literatura como salvação
A leitura de Proust, de romances policiais e sobre a leitura como atividade
Música e pintura
Viagens
A lua
Os conceitos de igualdade, superioridade e hierarquia entre os seres humanos
Por que Sartre recusava honrarias
O orgulho
Relações com jovens e grupos
Relação pessoal com Merleau-Ponty, Jean Genert e Albert Camus
A vida sexual
A poligamia
O machismo
O ciúme
Relação com o próprio corpo, com a dor e a doença
Relação com a própria feiura
Dinheiro, drogas, comida e bebida
Liberdade e consciência
A Segunda Guerra, a Resistência, a Libertação
As Guerras da Argélia e da Indochina
O Maio de 1968
Ateísmo
Relação entre socialismo e liberdade
Relações com o tempo: presente, passado, futuro
A morte

Algumas frases:

“Para mim, uma ruptura não significa nada. Algo morreu, eis tudo”.

“A hierarquia é aquilo que destrói o valor pessoal das pessoas. Estar acima ou abaixo é absurdo. E é por isso que recusei o Prêmio Nobel”.

“Os patifes são precisamente pessoas que se ocupam em fazer-se reconhecer como bons”.

“Uma coisa que Proust me ensinou é que há meios sociais como há espécies animais”.

“Não é admissível, não é concebível que um homem seja livre se os outros não o são”.

“Aos doze anos, decidi que Deus não existia e nunca mais mudei”.

“Ser nacionalista significa ter vínculos fortes com o país em que se nasceu, no qual se vive, não significa que se aceite uma determinada política desse país”.

“Quanto aos amigos (...), é preciso que tenham um presente novo para não retornar sempre ao mesmo (...); é preciso que não se representem a mim como na véspera (...), com as mesmas preocupações, as mesmas ideias (...); é preciso que haja uma modificação”.

“Deus é uma imagem pré-fabricada do homem (...) A verdadeira relação consigo é com aquilo que somos e não com aquilo que construímos vagamente semelhante a nós”.
Liliane 23/04/2019minha estante
Maravilhosa sua resenha. Parabéns!
Foi muito bom relembrar a leitura.
Li o livro (tenho o livro) e não consegui pensar numa resenha tão completa com essa sua.
Liliane de Paula Martins




Serena 04/01/2011

No prefácio deste livro Simone diz:
"Eis aqui meu primeiro livro - o único
certamente - que você não leu antes que o imprimissem.
Embora todo dedicado a você, ele já não lhe concerne."

É o beijo de despedida, os últimos 10 anos
de Sartre contados por quem mais o amava,
conhecia e compreendia.

Impossivel não se apaixonar por ambos.
Karla23 31/08/2011minha estante
Fiquei com vontade de lê-lo... já vou adicionar em minha estante! hahahaha




Judy 09/04/2010

Despedida
Quando uma relação é definida como livre e essa liberdade é a essência que mantem a relação viva, como é difícil mudar isso quando a vida transforma a realidade e obriga a transformação pela dependência. Esse livro discute como é difícil abrir mão de uma liberdade conquistada e construída e os conflitos que toda essa situação gera.
Cezar.Santos 04/04/2018minha estante
E sobre o silêncio obsequioso e favorável em relação a ditadura sanguinária cubana, Sartre fala alguma coisa?




Christiane 24/07/2021

Na primeira parte deste livro Simone de Beauvoir relata os últimos dez anos de sua vida com Sartre antes de sua morte. É um relato pungente e belíssimo, onde corajosamente ela fala sobre o que sentiu, como assistiu ao fim de seu companheiro de mais de 45 anos. É corajoso porque poucos são os que realmente olham de frente a finitude da vida e tudo que isto acarreta, principalmente ao corpo, a degradação deste corpo, mas um corpo que sustenta uma mente lúcida, apesar de que Sartre sofreu de problemas de esquecimentos e delírios em determinados momentos. Sua cegueira que o impedia de ler, ele até escrevia, mas já não podia ler o que escreveu, e obviamente a letra já não era como antes. O cansaço que sentia, as crises. O medo que ela sentia, suas preocupações e ter que finalmente enfrentar o momento onde ele já não estaria ao seu lado como foi durante toda sua vida desde a juventude, pois mesmo não morando juntos, e mantendo amores que eles chamavam de necessários, nunca se largaram. Após a morte de Sartre ela chegou a ser hospitalizada.

A segunda parte são as entrevistas que Simone fez com Sartre para que ele falasse sobre sua vida, suas idéias, seus livros e seu engajamento político. Simone desejava com isto dar voz a Sartre, inclusive para que mal entendidos se dissolvessem, e também para ter a garantia deste relato, pois há um filme com entrevistas com Sartre já no final de sua vida que já assisti e postei aqui no Blog, mas ela na época não tinha certeza de que o mesmo seria exibido. De minha parte, apesar de ter gostado muito do documentário, prefiro o relato impresso neste livro, é mais íntimo, mais delicado e ao mesmo tempo mais profundo. A inteligência de ambos é notória, e Simone não deixa muito espaço para que Sartre possa se enganar a si mesmo, ou fazer uso da má-fé, ela o interroga, o questiona, e volta a carga. Acompanhamos desta forma como surge o Sartre escritor, filósofo, político e também o homem, e também as mudanças que ocorreram que o fizeram em alguns pontos mudar ou ampliar seus pensamentos.

Vale a pena ler para quem se interessa pelos dois assim como pela filosofia. Recomendo!
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janaina 03/04/2020

"Sua morte nos separa. Minha morte não nos reunirá. Assim é: já é belo que nossas vidas tenham podido harmonizar-se por tanto tempo".
Assim Simone de Beauvoir termina a primeira parte do livro, se despedindo de Sartre. O interessante é que para quem está lendo e conhece suas outras obras também é uma despedida, é o enterro de um personagem (para nós leitores).
Já na segunda parte Simone de Beauvoir faz com que Sartre ressuscite, trazendo uma série de entrevistas ela faz com que o leitor conheça peculiaridades da vida do escritor . Infância, juventude, sua fase apolítica, sua fase política, sua relação com a liberdade, sua relação com o corpo, sua relação com o tempo e sua relação com a velhice.
Não tem como não se envolver com esse relato tão sensível e ao mesmo tempo cru que a escritora nos apresenta tão bem.
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Valéria 19/06/2021

"Eis aqui meu primeiro livro - o único certamente que voce não leu antes que o imprimisses. Embora todo dedicado a voce, ele já não lhe concerne.
Quando éramos jovens e, ao final de uma discussão apaixonada, um de nós triunfava ostensivamente, dizia ao outro: "Voce está enclausurado!" Voce está enclausurado; não sairá daí e eu não me juntarei a voce: mesmo que me enterrem ao seu lado, de suas cinzas para os meus restos não haverá nenhuma passagem. Dos últimos anos de Sartre, relatei-os tal como os vivi... quando me perguntavam como aceitava as coisas: "Isso não pode ser dito, isso não pode ser escrito, isso não pode ser pensado; ISSO SE VIVE, E É TUDO."

O que impressiona é a capacidade dela contar os últimos 10 anos de Sartre, sem enveredar para os anos com Sartre, o foco está todo nele, na intensidade com que seus pensamentos fluiam, na coerência das suas crenças e ações com sua filosofia... e as entrevistas ao final são assombrosas reflexões sobre o tempo e a aleatoriedade dos eventos da vida.

Ler sobre a finitude de um cara que escreveu um dos meus livros favoritos, A Náusea, sob a lente de quem o amava sem amar, não carecia de intervalos.

Da Náusea
"O melhor seria anotar os acontecimentos dia a dia. Manter um diário para que possam ser percebidos com clareza. Não deixar escapar as nuanças, os pequenos fatos, ainda quando pareçam insignificantes, e sobretudo classificá-los. É preciso que diga como vejo esta mesa, a rua, as pessoas, meu pacote de fumo, já que foi isso que mudou. É preciso determinar exatamente a extensão e a natureza dessa mudança."
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Romeu Felix 23/03/2023

Fiz o fichamento sobre esta obra, a quem interessar:
"A cerimônia do adeus" é uma obra escrita por Simone de Beauvoir, onde a autora relata as experiências vividas por ela durante a morte de seu companheiro, Jean-Paul Sartre, um dos maiores filósofos existencialistas da história. A obra também contém entrevistas realizadas com Sartre, nas quais ele discute sua filosofia, política, literatura e outros temas relacionados à sua vida e obra.

A narrativa começa com o falecimento de Sartre e o luto da autora, que sente sua falta e lida com a solidão e o vazio. A partir daí, ela apresenta um relato da vida e obra do filósofo, bem como dos seus relacionamentos, incluindo o seu romance com ela. Simone de Beauvoir também discute sua própria vida e filosofia, relacionando-a à de Sartre.

Ao longo da obra, são apresentadas diversas entrevistas realizadas por Simone de Beauvoir com Sartre, nas quais ele fala sobre temas como a política, o marxismo, o existencialismo, a literatura, a arte e a cultura em geral. Ele também fala sobre sua própria vida e obra, e discute as críticas que recebeu ao longo dos anos.

"A cerimônia do adeus" é uma obra importante para entender a filosofia existencialista e a vida e obra de Jean-Paul Sartre, um dos principais expoentes do pensamento do século XX. Além disso, o livro também apresenta um retrato íntimo de Simone de Beauvoir e sua relação com Sartre, bem como sua própria filosofia e pensamento.
Por: Romeu Felix Menin Junior.
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Tali 29/11/2020

No olhar da Simone encontramos Sartre.
O livro é divido em duas partes. Sendo a primeira o relato dos últimos dias do Sartre e no segundo uma entrevista/diálogo entre Beauvouir e Sartre.
Esse livro nos traz a compreensão de Sartre sobre vários temas ( guerra, Deus, literatura, sexualidade, liberdade,
posicionamento político, entre outros).
Além disso, proporciona olhar para relação dessas duas pessoas que estabeleceram um companheirismo, pouco visto e vivido por aí.
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Frederico N 23/01/2021

Aos que amaram sartre, que o amam, que o amarão.
Eu nunca me interessei bastante por Sartre, sempre tive um grande interesse em começar a ler Simone. Optei por ler como o meu primeiro livro de Simone; a cerimônia do adeus, saio dessa leitura, apaixonado tanto por Simone quanto por Sartre, duas personalidades incríveis.
Mesmo eu discordando de algumas coisas, dos dois, eu fiquei fascinado com a visão crítica para com a sociedade -inclusive com a seriedade de criticarem os países, como a URSS, que mesmo sendo do sistema político que eles apoiavam, não se calavam diante atrocidades-.
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Ester323 21/05/2023

Íntimo
A cerimônia do adeus foi a melhor escolha pra começar a ler Simone que eu poderia fazer. O livro é todo biográfico, sobre Sartre, e me fez sentir íntima das ideias que ambos compartilhavam; eu realmente gosto de ver o lado emocional de personalidades reais, os torna mais concretos pra mim.
Muitos dos pensamentos descritos me chamaram muitíssimo atenção, é esse o principal motivo que me faz quer continuar lendo mais dos dois.
Eu não sabia que o livro continha essa entrevista imensa da Simone com o Sartre e eu achei muito bem feita, as perguntas são inteligentíssimas, as respostas então...
O livro inteiro me deu uma sensação de ser bastante denso, mas mesmo assim, eu adorei ter começado por ele.
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