Galáxia de Ideias 16/02/2018
Um clássico que merece ser lido
Os pássaros, um número muito maior do que até então costumavam ser vistos, a princípio apenas observam a cidade e sua população, que os acha bonitinhos e graciosos. Eles, porém, adoram sujar tudo com seus excrementos e até mesmo incomodam mais do que seria aceitável.
Até que uma mulher, em uma cabine telefônica, inesperadamente morre de causas não reveladas.
Pelo menos até um jovem nos seus vinte e cinco anos e com uma vida regrada e trabalhadora descobrir, tarde demais, que o objetivo dos pássaros é muito mais sinistro do que o princípio sugeria e agora ele tem de descobrir o que há por trás disso. Contando com a ajuda da soviética Olga, que será uma peça chave para o que virá.
Se ele vai descobrir, o único modo de saber é embarcando na aterrorizante jornada criada por Frank Baker em um livro que se tornou por merecimento um clássico do terror. “E o cinema?
Essa provavelmente era a diversão mais influente oferecida aos homens e mulheres. Como o rádio, poderia ser usufruído a quase todas as horas do dia, embora, diferentemente do rádio, não ficasse dentro de casa. (Tenho certeza de que logo estaria. No meu tempo, eles estavam encaminhando nessa direção.) Um homem tinha que ir a teatros especiais para conseguir este tipo particular de fuga da realidade.
Eu sei que o meu post dessa semana deveria novamente vir da Argentina. Porém, escrevendo um novo livro, um terror com vampiros já todo formado na minha cabeça, me veio a vontade falar de um dos melhores, porém mais incômodos, livros que li em 2017.
Antigo? Sim. Atual? Igualmente. A construção da minha fala, pelo menos no ponto de vista de um purista da língua portuguesa, soa contraditória e até sem sentido. Garanto, entretanto, que faz muito. Muito mesmo, ainda mais quando o autor descreve, com uma minúcia que muito bem poderia ser a nossa realidade em 2018, a vida real da Londres de 1935.
O pior de tudo, porém, é que, desde o começo do livro, sabemos que o protagonista e narrador, nessa ocasião um homem nos seus oitenta e cinco anos, há sessenta vive em um mundo completamente arruinado cujas profundezas nunca chegamos realmente a desvendar. O que sabemos, porém, é suficiente para nos perguntar como o mundo se reergueu depois do “advento dos pássaros”, ainda mais quando fica implícito que a maioria das coisas que conhecemos como o básico não mais existe. Como uma distopia daquelas que hoje são livros tão comuns. Considerando que isso fica claro desde o início do livro, não considero spoiler, porém, como tudo aconteceu é sim, por isso não posso detalhar como eu gostaria. Posso comentar, entretanto, que a cena é aterradora, digna de um filme de terror. Bem pior que no filme de Hitchcock.
O mais aterrorizante, porém, é bem mais que só a ameaça dos pássaros. É a capacidade das pessoas de não levarem a vida a sério quando realmente precisa. A falta de iniciativa da maioria em mudar o que está errado. Não assumir o que realmente sentem. Serem capazes de se permitir declinar pelo ritmo da falta de moral do mundo. Tudo isso, somado a uma narrativa em primeira pessoa que intercala passado e presente, torna a leitura uma excelente experiência, mas também incômoda até não poder mais. Inclusive eu demorei a terminar o livro porque me identifiquei muitas vezes com o narrador e identifiquei várias situações da vida real que não raras vezes me alteram o humor. Fica difícil pensar sem sentir mal e assustado em como as pessoas no livro simplesmente não se davam conta do perigo em volta delas e só tarde mais é que elas foram notar.
Outros, e certamente os mais aterrorizantes, pontos da trama são: de onde vem os pássaros e o que eles realmente são? Durante boa parte da história o autor apenas diz que tentaram capturar, espantar ou matar os animais, mas que não fizeram sequer um arranhão. No entanto, duas cenas do livro dão uma séria pista, ou esclarecem, sobre do que realmente se tratam os pássaros e isso é o que mais realmente assusta o leitor, pois ninguém teria pensado em uma (quase) solução tão inacreditável, mas ao mesmo tempo tão cheia de sentido. De tal forma que você fica pensando no livro um bom tempo depois de ler.
Não apenas fica pensando na leitura, mas também apreciando a edição caprichadíssima da Darkside Books, com sua lombada em preto e branco e o corte das folhas pretas. Isso sem contar as folhas amareladas e o excelente espaçamento da fonte que está em muito bom tamanho e igualmente confortável para a leitura.
Sei que o texto ficou mais curto do que geralmente faço, de novo, mas apesar de Os Pássaros ter me marcado bastante, falar dele não dá nem um terço do que realmente vocês podem esperar do livro. Mas posso deixar um aviso: se avistar um pássaro estranho, não abra a janela.
Resenha postada originalmente no Blog Galáxia de Ideias - Escrita por Renata Cezimbra
site: http://www.galaxiadeideias.com/2018/02/resenha-os-passaros-frank-baker.html