Lisa 07/03/2022
O Êxtase de se ver brilhar ao sol
Stefan Zweig era não apenas um pessoa perturbada, mas com uma vida igualmente confusa, findando seus dias suicidas no nosso Brasil. Sendo um judeu pacifista, Zweig corre da Alemanha e vem ao Brasil, a procura de asilo contra um mundo decadente e agressivo, buscando na sua prosa o escape de uma realidade torturada e ao procurar fugir é justamente perseguido. A sociedade não compreende sua postura que é não adotar postura alguma, sua posição em não se posicionar. Zweig se cala perante as atrocidades nazistas e não defende seu povo e isso, bem, é intolerável e covarde, ao menos para o mundo. Ele se vê julgado e desprezado pela própria comunidade que antes parecia o amar, caindo em ostracismo numa ligeireza aterrorizante e trágica. Supreende? Não, se olharmos bem, temos os avisos.
Em O Êxtase da Transformação, o último livro do autor, vemos um paralelo gritantemente biográfico. Um país quebrado pela guerra, vidas destruidas por estupidez política. Se sou impotente perante essa realidade, só me resta alienar-me dela. Certo, Christl? E quando isso não for mais possivel, suicídio ou vingança?
O que seria melhor: viver sem nunca descobrir o paraíso? Ou sentir o gosto dos prazeres e perdê-los? Christine é uma pobre agente dos correios, que ganha a oportunidade de viajar com seus tios ricos. Vemos o desabrochar da moça, antes humilde e insegura para confiante, genuinamente feliz e egoísta.
É impossível não se lembrar da felicidade clandestina da nossa Clarice ao ver Christine desabrochar, sua inocência e deslumbramento temendo não dever sentir tamanho prazer, não é para ela. E claro, a presença do duplo que aqui se encontra, temática essa que sou particularmente fã, ela não é mais Christine, é agora a moça rica de sangue azul Christiane. No entanto é sua própria alegria aquela que traiçoeiramente lhe rouba o sonho e a retorna rejeitada nos seus velhos trapos pra sua vida imunda. E então, Christl, como tolerar a mediocridade de seus dias?
A história guina, temos novos encontros e um novo mundo se abre nos surpreendendo com o contraposto. Vemos aqui uma temática recorrente zweigueana, seus personagens estão sempre próximos da felicidade somente então para caírem em amargor, quase como se nos confidenciasse a não acreditar em felizes para sempre, porque depois desse final disney a realidade continua e ela é quase sempre triste. E não foi esse o fim do autor? Renomado nas decadas de 20 e 30 para então tal como Christl sofrer o amargor de ser jogado em uma vida triste.
Por fim, Zweig tem essa escrita extremamente poética, lírica, que ondula como se fosse música. E a mensagem é nítida, uma vez sentido o êxtase, uma vez transformados, não podemos retornar. Após a metamorfose somos irreversivelmente outros.