jota 02/08/2015Literatura e sociedade...Não sou um grande leitor de Jack London (1876-1916), mas me parece que Martin Eden é bastante diferente de outras obras suas mais conhecidas dos brasileiros - O Chamado da Floresta, O Lobo do Mar, Caninos Brancos -, em que a aventura em plena natureza (floresta e mar, principalmente) ocupa destaque central nas histórias.
Martin Eden se passa praticamente quase todo na Califórnia, é extremamente urbano e bastante autobiográfico. Como diz a editora Nova Alexandria na apresentação do livro, ele traz “(...) inúmeras chaves para se compreender sua [de Jack London] trajetória literária de grande sucesso.” Tem alguns trechos contando episódios da vida de Eden, especialmente como marinheiro, mas narra com grande empenho sua sofrida luta para se tornar um escritor, ser reconhecido e viver exclusivamente de literatura.
No meio disso tudo tem uma história de amor – ou duas – e uma personagem portuguesa curiosa, uma pobre lavadeira cheia de filhos (Maria Silva) que ajuda Eden em seus piores dias. Sua amada, Ruth, seu primeiro amor, pelo contrário, quando vê que ele não consegue publicar nada no início de sua carreira, o desestimula e lhe suplica que arranje um emprego de escriturário, algo assim. As irmãs e os cunhados de Martin também não viam com bons olhos as pessoas que escreviam, dedicadas às artes, “uns vagabundos”.
Com Ruth ele fica mais sentido pois fora através dela, com suas conversas e estímulos, que se iniciara na leitura de poemas, sonetos e filosofia, tornando-se praticamente um pensador autodidata depois de muitas leituras e reflexão. Nesse aprendizado Eden se torna fervoroso defensor das ideias do inglês Herbert Spencer (1820-1903), que aplicou à sociologia ideias que colheu nas ciências naturais. Inclusive aquela derivada de Charles Darwin, da sobrevivència do mais apto.
Há inúmeras referências a Spencer no decorrer da história e Martin Eden (ou Jack London) se torna aquele tipo de sujeito que defende “(...) a primazia do indivíduo perante a sociedade e o Estado, e a natureza como fonte da verdade, incluindo a verdade moral.” Enfim, além de a história de Martin Eden interessar um tanto ao leitor, ainda se pode aprender um bocado de coisas com ela.
Martin Eden é bastante longo, parece ter mais do que suas 373 páginas e em parte soa meio repetitivo em certos trechos, especialmente quando trata de sua luta para ser reconhecido como escritor (no início tudo o que escreve é devolvido pelos editores) e de sua paixão por Ruth Morse (descrita com tanto amor e devoção que a tornam algo como uma santa; mas o amor era assim mesmo no início do século passado, não?). Mas é uma história que se acompanha com muito interesse do começo ao fim. Especialmente as páginas finais, que são brilhantes e nos dizem muito acerca do verdadeiro Jack London.
Lido entre 26/07 e 01/08/2015.