Lula

Lula Frei Betto




Resenhas - Lula


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Amós 06/07/2020

Um livro de seu tempo
Na presente resenha pretendo analisar a biografia de Lula não como um livro bibliográfico qualquer, mas sim como uma fonte história e sendo assim irei tratá-la como tal: pensando seu contexto e imaginando com qual sentido o texto foi pensado na sua gênese. A começar pelo autor, temos que Frei Beto é um clérigo católico de Belo Horizonte, conhecido por ser um difusor da Teologia da Libertação (escola teológica ligada a setores da esquerda e muito presente na América Latina como um todo) e por sua constante militância política desde o período da Ditadura Militar de 1964. Passado esse período, Frei Beto se envolve com Lula no contexto das Greves do ABC e consequentemente colabora na fundação do Partido dos Trabalhadores. E é após a Redemocratização e da promulgação da Constituição de Federal de 1988 que o presente livro é escrito e publicado.
Tendo isso em mente, a forma como o livro é organizado se explica por si só. Sendo publicado em 1989, o Brasil experimentava a primeira experiência democrática plena após mais de vinte anos de Ditadura Militar e com isso a efervescência política estava a toda. Preparando-se para a eleição direta presidencial, o livro é publicado na campanha eleitoral de Lula em sua tentativa de conquistar a presidência. No primeiro capítulo, o autor apresenta brevemente a história recente do Brasil e posiciona o PT e sua liderança como a única saída possível para a nação sair da crise econômica da hiperinflação herdada do (des)governo dos militares. Entendo esse trecho como um folheto eleitoreiro e se encararmos dessa forma cumpre perfeitamente seu papel, pois tem uma linguagem acessível e atinge em cheio seu objetivo: convencer o trabalhador de que seu voto é a arma para colocar o povo no Poder; e o povo se faz representar pela figura de Lula e do Partido dos Trabalhadores.
Seguidamente a isso o autor passa a história pessoal da figura do ex-presidente, passando por sua infância em Pernambuco e sua consequente mudança para o ABC Paulista para acompanhar sua família no êxodo nordestino. Dentro daquele contexto operário, Lula cresceu e ao começar a trabalhar tomou consciência política frente aos desmandos do regime militar que privilegiava o empresariado em detrimento da qualidade da vida dos operários do ABC Paulista. Salários baixos que não eram reajustados, desrespeito aos direitos trabalhistas e demissões em massa para reprimir grevistas e sindicalistas.
Com isso Lula começa a se envolver no Sindicato dos Metalúrgicos do ABC onde rapidamente cresce em popularidade por conta de seu carisma característico. Rivalizando com outras correntes sindicais, ele entendia que a Ação Direta defendida por correntes mais à esquerda era prejudicial à imagem do sindicato, pois os confrontos com a polícia e o Estado acabam por assustar a classe média que não concordava com essas formas mais violentas de manifestação. Lula defendia o diálogo aberto entre os sindicatos e as classes patronais como forma de conquistar direitos e com essa tática o metalúrgico irá liderar uma série de convulsões sociais em São Paulo da década de setenta.
Após uma série de greves de menor ou maior duração, o Regime Militar se lança em ofensiva contra os movimentos sindicais: intervenções nos sindicatos, demissões e prisões são o padrão. Nesse contexto Lula acaba preso e as pautas almejadas pela greve não são alcançadas, porém se consolida uma vitória política no sentido de que essa figura de liderança havia se tornando conhecida pelos trabalhadores de todo o país por conta da cobertura dada pela mídia. Após sair da cadeia Lula entende que somente a militância popular não basta para alcançar conquistas sociais e que a presença institucional de trabalhadores se faz necessária.
Com a Ditadura Militar nos seus últimos momentos, o sistema bipartidário é abolido e assim Lula articula a fundação do Partido os Trabalhadores com o objetivo de agregar as forças de esquerda em torno de um projeto popular de Estado, fazendo a defesa do direitos trabalhistas e da necessidade da reforma agrária. Paralelo a isso, Lula usa sua influência e carisma para ajudar na organização e fundação da Central Única dos Trabalhadores (CUT). A central sindical que agrega os sindicatos de todo o país e todas categorias e isso se fazia necessário no contexto para fugir da tradicional influência do Estado nos sindicatos, que no período militar fazia intervenções nas diretorias sindicais para satisfazer as classes empresariais.
Com a Redemocratização em seus primeiros meses o PT atinge abrangência nacional e se torna um dos maiores partidos políticos na Redemocratização, elegendo vários deputados federais que em maior ou menor grau colaboraram na escrita da Constituição Federal de 1988. É nesse contexto que o livro é escrito e publicado, pensando nas eleições vindouras em que Lula iria disputar a presidência da República com figuras como Brizola (PDT) e Ulysses Guimarães (PMDB) só que o vencedor do pleito seria Fernando Collor.
Finalizando a análise do livro só consigo pensar como a trajetória de Lula até 1989 e depois disso é uma constante caminhada em direção a conciliação de classes. Temendo a pecha de ser chamado de “comunista”, o PT se afasta de pautas polêmicas como reformas tributárias e a reforma agrária. Na década de noventa, essas polêmicas darão gênese a dissidências que irão fundar o PSOL, PSTU e PCO, partidos mais à esquerda e que de diferentes formas acusam o Partido dos Trabalhadores de serem traidores da classe trabalhadora por conta de sua postura conciliadora. Porém o caminho da conciliação de classes iria - depois de três tentativas - colocar Lula na presidência do país em 2002. Daí pra frente é história e cabe a cada brasileiro julgar a figura do ex-presidente a luz de sua trajetória política.


site: @gastter
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