spoiler visualizarKarolineCalumbi 08/11/2021
A SAGA DOS CÃES PERDIDOS
A Saga dos Cães Perdidos começa com uma visão utópica do que seria o jornalismo e quais funções ele receberia; sempre buscando a verdade e a transparência, fazendo-se de “acusador” dos problemas que envolvem a sociedade
“O jornalismo é a síntese do espírito moderno: a razão (a ‘verdade’, a transparência) impondo-se diante da tradição obscurantista, o questionamento de todas as autoridades, a crítica da política e a confiança irrestrita no progresso, no aperfeiçoamento contínuo da espécie.” (Página 9)
A narrativa apresenta o surgimento do jornalismo. O primeiro capítulo revela que a Revolução Francesa foi o pivô do surgimento da imprensa, desconcentrando o conhecimento que, outrora, era destinado à Igreja e as Universidades. Com a desconcentração do conhecimento, torna-se necessário um profissional capaz de expor tais informações. Assim como o Iluminismo que movimentava à época, o jornalista tinha o dever de trazer à luz o que estava escondido na escuridão.
“O jornalismo é filho legítimo da Revolução France, se bem que um século e meio antes, já houvesse jornais (...) Ele expande-se a partir da luta pelos direitos humanos nesta que foi a ‘revolução símbolo’ da destituição da aristocracia, do fim das monarquias e de todo o sistema absolutista herdado da Idade Média, assim como da afirmação do espírito burguês.” (Página 10)
Ainda no primeiro capítulo, o texto narra a criação do jornalismo e as fases pelas quais ele passa e quais mudanças sofre. Observa-se, então, as 3 primeiras fases do jornalismo, desde sua criação no século 18 como o jornalismo literário — aquele que não tinha como objetivo o lucro, mas passar conhecimento —, passando pelo jornal como bem de consumo no século 19 — muito influenciado pelo crescimento do Capitalismo —, chegando ao jornalismo descrente e niilista no século 20 — que era o reflexo de uma sociedade abastecida por problemas que começavam com guerras e terminavam em crises, perpassando por governos autoritários.
Entende-se que, nessa época, o jornalismo literário não se importa com os lucros. Nesse momento, está focado nos fins pedagógicos e na formação política. É a explosão do jornalismo partidário, onde o político mesmo é o jornalista. O que levar ao questionamento, unir a política ao jornalismo pode acabar corrompendo a função primeira dada ao jornalismo: expor os problemas sociais em busca da verdade? A narrativa não esclarece esse ponto, mas é válido imaginar, sem usar de forma anacrônica o conhecimento político, o que o poder político sobre o jornal poderia causar.
Depois de uma politização em massa pelos jornais literários, observa-se uma sociedade politizada em busca dos seus diretos. Em contraponto, os jornais literários que, outrora, iniciara discussões sociais, transformam-se em grandes empresas capitalistas, montando a produção em massa de jornais populares e sensacionalistas que buscam o lucro. Esse é o segundo tipo de jornalismo.
“O segundo jornalismo, o do jornal como grande empresa capitalista, surge da inovação tecnológica da metade do século 19 nos processos de produção do jornal.” (Página 13)
A chegada do jornalismo ao século 20 é combinada com A Primeira Guerra Mundial, que aconteceu ainda na primeira metade do século 20, influenciando completamente os monopólios. Crises e governos autoritários não se importam com a verdade, mas é nesse contexto que o jornalista precisa exercer a função de informar, sem causar mais traumas em uma sociedade já traumatizada.
Além disso, o jornalismo é considerado pessimista, dono de uma visão cética sobre o mundo. Levando em consideração o momento em que esse jornalismo é feito, considerar-se niilista é o menor dos problemas.
“Mudamos para uma épica semelhante àquilo que Nietzsche atribuía a toda a modernidade: o de ser uma ‘época fraca’, decadente, niilista.” (Página 15)
No capítulo 2, o livro mostra de forma cética a quarta e última fase do jornalismo, podendo notar a decepção sobre tais mudanças. Fala-se sobre como o avanço tecnológico passou a influenciar as nuanças do jornalismo, causando mudanças não apenas na estrutura do texto, mas na estrutura da forma de trabalho. Uma mudança citada é a mudança estrutural da esfera pública: incorporar ao texto jornalístico propaganda como se fosse uma notícia de interesse público.
Observa-se que a disseminação de notícias pelas redes tecnológicas colocaram em descrédito jornalistas que, em outro momento, trabalharam para disseminar informações relevantes para a sociedade. A influência dos avanços tecnológicos sobre o profissional de jornalismo está diretamente relacionado ao seu ambiente de trabalho, a forma como se trabalha e a forma como o jornalista de relaciona dentro do trabalho.
“Além disso, a tecnologia imprime seu ritmo e sua lógica às relações de trabalho, definindo os novos profissionais, a nova ética de trabalho, em sua, um outro mundo, que mal deixa entrever os sinais do que se convencionou chamar no passado de jornalismo” (Página 31)
Ademais, o jornalista é um profissional curinga, é assim que o capítulo 3 apresenta o profissional. Bem como o jornalismo é diverso, o jornalista também precisa ser.
“Disso se conclui que o jornalismo é muito diversificado, múltiplo, e jamais a categorização do ou da jornalista dirá muito sobre a profissão, suas mudanças e dilemas.” (Página 53)
É nesse capítulo que entendemos a metáfora sobre os “cães perdidos”; ao observar o jornalismo como uma carreira ampla, pode-se notar que se torna difícil se localizar em determinada uma função. Além disso, o autor garante que é uma profissão incerta, podendo não vir a existir no futuro. Para completar, o narrador declara também que o jornalismo é o “cemitério de carreiras abortadas”, levando a acreditar que grande parte dos profissionais que escolheram o Jornalismo como profissão, na verdade o escolheram por não poder, ou não conseguir, seguir a carreira desejada.
Percebe-se que o jornalista é visto como aquele que está disposto a enxergar a realidade nua e crua. O jornalista é aquele que enxerga o mundo e o mostra para a população, mas, com o avanço da tecnologia, deixa de se tornar necessário.
“Daí o desamparo da profissão, sua decadência diante dos promotores da comunicação, dos publicitários, dos outros sistemas de informação. A saga dos cães indomáveis termina aí.” (Página 58)
Com o avanço tecnológico, nota-se que as redes sociais são um meio válido de circular informação. Essa “facilitação” favorece no compartilhamento de informações. É a descentralização da descentralização. Desse modo, a informação que antes estava nas mãos do jornalista, pode estar nas mãos de qualquer um. Assim sendo, o jornalismo acaba se tornando uma carreira desnecessário, pois, qualquer um pode fazer seu papel.
“O fato de o escândalo de Mônica Lewinski ter surgido a partir da difusão pela Internet de um não-jornalista reforça a tese de que hoje em dia qualquer um pode exercer a profissão, já que as especialização, as análises e os comentários estão em declínio.” (Página 58)
Em seguida, deixando de lado o profissional e se preocupando com o receptor da mensagem, o capítulo 4 se questiona sobre existência humana, partindo da frase de Descarte “Penso, logo existo”. Entretanto, chega-se ao entendimento de que existem outras formas de chegar à conclusão da existência humana, um exemplo é o nosso ser social. Além disso, o autor afirma que a existência humana tem podido ser cada vez mais questionada com o avanço da tecnologia, fazendo-se necessário mais do que pensar para ter certeza de que algo é real.
Falando sobre o telejornal, O autor assume um discurso pessimista sobre a televisão e sua influência para com a sociedade. Para isso, explica como a TV abre um horizonte ficcional para a população, servindo como a janela para o mundo. Entretanto podemos facilmente associar à alegoria da caverna de Platão, no qual o que vemos na televisão são as sombras que são vistas na parede da caverna, que não são necessariamente a verdade.
No capítulo 5, último capítulo disponível no PDF, o autor faz uma separação entre o que é comunicação e o que é informação. Para o autor, a comunicação é a forma de trocar mensagens. Já a informação é uma mensagem que não inclui um ponto de vista subjetivo.
O autor da obra relata como o profissional de jornalismo é influenciado pelo mundo ao seu redor. Dessa forma, ele acaba indo em busca de uma visão já construída e influenciando a informação. A isso, ele dá o nome de clichê. Apesar de não ser o correto, partindo do conceito dado do que é a informação, são os clichês que alimentam o jornal que, desde o século 19, busca, como toda empresa capitalista, enriquecer.
O que se conclui da narrativa é que o autor perpassa pelo jornalismo desde sua criação, até os dias atuais, mostrando sua influência e seus problemas. Em dados momentos, o autor parece pessimista com o que acabou se tornando o jornalismo, ainda assim, apresenta de forma didática os seus conceitos. É uma narrativa densa, com muita informação, entretanto, não é uma narrativa necessariamente difícil, chegando a ser interessante.