Jamyle Dionísio 03/07/2022
Outros tempos?
Sabe, minha mãe é curitibana. Passei a infância entre São Paulo e Curitiba. Lá está a casa dos meus bisavós, onde minha mãe brincou na infância, e depois eu e meus primos, e hoje os filhos dos primos brincam. Nessa casa vivem as minhas tias-avós, cada uma em seu quarto.
Quando li O Vampiro de Curitiba, não consegui me desvencilhar dessa minha ideia muito pessoal da cidade. Curitiba para mim é como um refúgio familiar, um espaço para onde temos que voltar vez ou outra. As casinhas de madeira e o sotaque cantadinho, quase um colo de vó.
Não deu outra: imaginei essas tias-avós percorrendo, ainda moças, a Curitiba de Dalton Trevisan. E tive medo por elas.
Sei que devia estar falando da prosa de Dalton, do ritmo fluido, do personagem Nelsinho que parece dedicar a vida a desfrutar o máximo de mulheres que lhe surjam à frente. Mulheres que são, para ele, coisinhas deliciosas, mas ?coisinhas?. Bocas, olhos, anáguas, cintas-liga, peitos, manhas. Oscilei entre a admiração pela escrita ágil e enxuta e o asco, como mulher, diante das perambulações de Nelsinho por uma Curitiba turva, movediça, diferente da Curitiba que eu tenho dentro de mim.
@chadepalavra