Resenhas - Do Amor e Outros Demônios

Meir 02/03/2022

Os demônios somos nós
O cenário desse livro é uma cidade pequena e escravista num Caribe colonial, influenciado por resquícios da Inquisição e um sincretismo religioso entre catolicismo popular e religiões africanas/indígenas e a filha de um marquês, Sierva Maria.
Os demônios começam logo no início da história, com a negligência que Sierva sofre dos seus pais, que pouco se importam, sequer a amam e até a odeiam. Quem cria Sierva são os escravos, ensinando-a sua religião, coroando-a com seus colares e mandingas.
Nesse contexto de negligência e vazio, há uma epidemia de raiva que a assola a cidade e a menina, supostamente, é mordida por um cachorro raivoso. O quadro passa de uma suspeita de raiva para averiguação de possessão demoníaca em pouco tempo. Em menos tempo ainda, a menina é levada para o convento das clarissas para ficar lá trancada e ser exorcizada.
Agora, o elefante da sala.
O padre que fica responsável por exorcizar Sierva "se apaixona" por ela e atribui isso à influência demoníaca de Sierva. Esse é o pior dos demônios.
Eu diria que esse livro é sobre como os homens atribuem ao diabo coisas que são frutos de sua própria natureza pecaminosa e lascívia. Tudo na história é um contexto de depravação deplorável.
Infelizmente, não posso dizer que isso ainda não aconteça, principalmente no Brasil onde as pessoas adoram um misticismo. O demônio sempre recebe a culpa dos pecados dos homens, quando na verdade a maldade humana é tão grande que não deveria nos surpreender até onde ela chega.

Evy 11/10/2011

DESAFIO LITERÁRIO 2011 - Tema: Nobel de Literatura / Mês: Outubro (Livro 1)
Já li alguns livros de G. G. Marquez e por isso posso dizer com certeza que admiro muito sua narrativa. A história que ele conta poderia até não ser tão interessante ou fugir daquilo em que acreditamos, mas a maneira com que descreve os fatos é tão apaixonante que tudo se transforma como mágica. Afinal, não é a toa que ganhou o prêmio Nobel de Literatura. A leitura de seus livros é sempre prazerosa e com este não poderia ser diferente.

Para criar a história, Márquez se inspirou em uma reportagem que ficou encarregado de cobrir em Bogotá sobre a remoção das criptas funerárias do convento de Santa Clara. Um dos caixões abertos abrigava uma ossada com longos cabelos que chegavam a 22 metros de comprimento, e o autor relaciona este fato a uma lenda que sua avó contava sobre uma marquesa de 12 anos que possuía uma cabeleira "que se arrastava como a cauda de um vestido de noiva" e que morre pela mordida raivosa de um cachorro.

Marquez demorou anos até escrever a história baseada na marquesinha de imensa cabeleira e o fez já um escritor de sucesso. A menina Sierva Maria de Todos los Ángeles, filha do Marquês de Casalduero é rejeitada pelos pais desde pequena e acaba se criando entre os escravos da fazenda. Certo dia é mordida por um cachorro com raiva e começa a ter certas reações estranhas que são interpretadas a princípio como causa da mordida e depois como se ela estivesse possuída pelo demônio. Muito embora na narrativa a todo momento essas reações de Sierva se mesclam com os costumes aprendidos com os escravos.

A partir de então, com medo de perdê-la, seu pai começa a dar-lhe maior valor e recorre a curandeiros, feiticeiros, bruxas e tudo para salvá-la do mal ao qual ele acreditava que ela estivesse fadada. Até que o causo chega aos ouvidos do Santo Ofício e o Marquês é pressionado a deixar a filha em um convento, para ser ajudada pelos obreiros de Deus. E é então que Sierva conhece Padre Cayetano Delaura, encarregado de ajudá-la e que com o correr dos dias se apaixona por ela. Paixão esta correspondida por Sierva, ainda que 24 anos mais nova que ele.

É muito interessante como na narrativa de Marquez, o fato de Sierva ter 12 anos e Cayetano 36, não parecer relevante diante do encantamento e sutileza com que descreve os momentos em que os dois estão juntos. Incrível também o fato de eu ter, em certos momentos da narrativa, torcido para que ficassem juntos e que Cayetano fosse, enfim, a salvação de Sierva. Ainda que seja absurdamente contra este tipo de relacionamento na vida real. Como já disse em inúmeras outras resenhas, admiro demais autores que são capazes de transportar o leitor para a história e Marquez é mestre neste quesito.

Narrativa impecável, história interessante e personagens ricos e bem desenvolvidos. Leitura super recomendada!

Clara.M.O 02/07/2020

Li esse livro todo dividida entre "meu deus que livro horrível" e "nossa que legal". Suponho que tenha achado livro um meio termo exato das duas.
Amei a escrita, amei o final, adorei (relativamente) o plot e decorrer do livro.
Apesar de ter gostado da escrita, achei ela confusa. As informações são jogadas muito rápido, juntas e de maneira desordenada. No começo isso me irritou muito, mas, conforme eu lia, tudo começa a se explicar e admito que comecei a gostar bastante do modo "perdido" que as coisas foram apresentadas no começo.
Tentei me desvencilhar dos pensamentos atuais e ver tudo de uma perspectiva da época, mas, mesmo assim, achei complicado superar a quantidade de comentários e frases racistas e preconceituosas... Excluí essa parte na hora de dar a nota (o que ainda não tenho certeza se foi a decisão certa), visando a época que o livro foi escrito, porque senão ela teria sido 2 estrelas, sendo bondosa.

Ayla 18/11/2022

Surpreendente.
Eu terminei esse livro sem saber o que pensar, foi uma leitura desafiadora, linguagem difícil (meu primeiro livro do Gabo), mas a história muito intrigante? a forma como ele descreve tão bem coisas tão trágicas e tão místicas. A história com detalhes ricos da América Latina e da cultura africana, enfim, a escrita dele me deixou impressionada.

Marcia 04/08/2023

O livro aborda misticismo, amor, paixões, superstições, crenças africanas, exorcismo e o poder da igreja sobre o povo.
O escritor faz crítica, de forma leve, ao controle forte da igreja sobre o povo, onde a maioria vivia muito pobre.
Nessa história a protagonista , uma adolescente , filha de um marquês, é mordida por um cachorro. O marquês e a mulher nao ligam pra ela. Lendo o livro entenderemos o relacionamento conturbado dos dois e como ela era uma mãe tóxica, além de problemas psicológicos sérios. A menina é criada meio largada, fica sempre junto dos escravos onde aprendeu as crenças deles e as diversas línguas. No dia que ela é mordida pelo cachorro o medo dela ter contraído raiva faz todos ficarem alvoroçados. Ninguém sabe se o cachorro era raivoso mas havia um surto na região e o marquês foi atrás de tratar da menina, buscar formas de salva-la, mesmo sem ter certeza da contaminação. 
As diversas pessoas, entre médicos e curandeiros que por la passaram, aplicaram métodos de nos arrepiar. É horrivel conhecer  o quanto a medicina era precária. Mais horrível e triste ver os métodos dos curandeiros. 
Por fim o marquês resolve pedir ajuda ao bispo e decidem interna-la no convento. La chegam a conclusão que ela estava possessa e deveria ser exorcizada. Muita coisa acontece nessa fase e a cada página queremos seguir mais pra saber o desfecho de tudo alem de ter acontecimentos que nos incomodam. Ha "um padre incumbido de exorcizar os demônios que se acredita terem possuído a pequena, cujos cabelos só seriam cortados em seu casamento.( promessa feita no seu nascimento) 
Um livro curto, intenso e muito interessante. 
Valeu

Carla.Zuqueti 11/12/2022

Mais um belo romance
Quando o antigo convento de Santa Clara foi demolido para se transformar em um hotel 5 estrelas, foi necessário remover as criptas que lá estavam. O jovem jornalista Gabo fora enviado para cobrir a retirada e se deparou com uma cripta que lembrava uma história que ouvira em sua infância: uma marquesinha com uma vasta cabeleira cobre que havia morrido por raiva aos doze anos e que realizava milagres.

Essa lembrança deu origem ao livro ?Do amor e outros demônios ?, onde Gabo conta histórias de amores impossíveis, com a sempre presente pitada de realismo fantástico e uma relação entre as religiões africanas e o catolicismo.

A história começa com o segunda Marques Ygnacio, proibido de casar-se com sua amada, aceita as ordens de seu pai e casa-se sem amor com uma moça bem vista na comunidade. Mas sua esposa morre de repente, sem nunca ter consumado o casamento.

Aproveitando-se da situação, uma mestiça chamada Bernarda, aconselhada por seu pai, engravida do marquês, que é obrigado a desposa-la, e da a luz a Sierva Maria, a criança com uma vasta cabeleira cor de cobre. Ignorada pelo pai e odiava pela mãe, Sierva cresce em meio aos escravos, conhecendo seus rituais, suas línguas e seus deuses, criando uma personalidade arredia à comunidade.

Quando Sierva é mordida por um cachorro raivoso, o marquês a leva a diversos médicos para saber se está com raiva. Mas seu comportamento diferente cria suspeitas de uma possessão. Aconselhado pelo arcebispo, o marquês entrega sua filha única a um convento governado por uma freira cruel, onde teria sua sanidade testada, e conheceria o amor e a dor dilacerante.

Mais um belo livro de um dos meus autores preferidos! Gabo faz uma crítica à intolerância religiosa, aos costumes de época e como a sociedade trata os diferentes, com uma pitada de sobrenatural, característica de seus livros.

Paloma 21/07/2021

Ótima leitura! Ambientação e escrita impecáveis. Mas me incomodou muito o "amor" entre uma menina de 12 anos e um homem de 36. Ainda que se passe no séc XVIII, e infelizmente fosse comum (o que não quer dizer que hoje ainda não exista), foi escrito no final do séc XX.... Enfim, ainda vale muito a pena pelas questões que também trás, como: escravização, a religião - em sua verve mais nociva (para dizer o mínimo) -, preconceito, conhecimento versus ignorância.

Val Alves 19/07/2020

Da falta de amor e excesso de demônios
Não é novidade que no mundo colonial os representantes do topo da pirâmide usassem o preconceito cultural e religioso como instrumento de dominação sobre os povos escravizados. Sob o estigma de serem povos inferiores e bárbaros, eram diminuídos à condição de animais irracionais, e sua única utilidade era o trabalho forçado; ao povo africano foi imposta a ideia de que sua cultura era igualmente inferior e, por vezes, perigosa. Seus ritos e deuses considerados malignos, o que, aos cristãos católicos, dava o 'direito' de combaterem com repressão e exorcismos.

A figura que expressa essa repressão à cultura africana em "Do amor e outros demônios" é a menina Sierva Maria de Todos los Angeles que, correndo o risco de morrer no parto, foi submetida a uma promessa de sua ama negra para lhe garantir a vida. Caso sobrevivesse a menina não poderia cortar os cabelos até o dia de seu casamento.

A estória da vida trágica de Sierva nos transporta para um mundo místico de tempos remotos onde a sociedade está impregnada de conceitos equivocados sobre a relação entre as religiões afro descendentes, suas expressões e a possessão demoníaca. Além do conhecimento médico fragmentado e limitado que não consegue dar conta de explicar eventos atípicos da ordem do adoecimento e que resultam na sua interpretação por meio de superstições.
Todos esses ingredientes se misturam para compor o contexto em que a subordinação desses povos seja justificada como uma condição natural e a religião ocidental passe um pano por cima das feridas causadas com o pretexto de proteger "o bom povo de Deus" da influência maligna.

Na vida de Sierva tais elementos - associados às inabilidades nas relações parentais (a mãe a concebe para realizar um golpe e posteriormente a rejeita e o pai fraco que terceiriza a responsabilidade)- são os responsáveis pela tragédia de Sierva Maria, que é aprisionada num convento e submetida a um tratamento desumano para a exorcizar dos "maus espíritos" que supostamente tomam sua alma.

Os maus tratos sofridos por Sierva Maria no convento poderiam ser apenas uma alegoria à violência ideológica a qual o povo africano foi submetido enquanto escravizados, entretanto a história guarda registros verossímeis de que essa violência passou longe de ser apenas figurativa. E essa arvore podre continua a dar frutos na atualidade.

Manuela do Prado 16/08/2020

"Às vezes atribuímos ao demônio certas coisas que não entendemos, sem cuidar que podem ser coisas que não entendemos de Deus..."
Do Amor e Outros Demônios conta a história de Síerva Maria de Todos los Ángeles, uma menina de 12 anos, filha de pais displicentes e alheios a sua existência, cuja personalidade é completamente impetuosa: mente por prazer e não poupa recursos físicos quando julga que deve usar de violência em defesa própria.

Embora seja filha única do marquês de Casalduero e da "plebeia" Bernarda Cabrera, ambos delegam os seus cuidados aos negros escravizados que vivem em sua fazenda: o pai, porque vive entre devaneios que o colocam em estado vegetativo perante a vida, a mãe, porque odeia a menina, chegando a renomea-la de Maria Medinga.

Em um dia comum, em sua vida pequena, Sierva passeia com uma das criadas pela vila e é mordida por um cão que está infectado pela doença da raiva, entretanto a menina só chega a apresentar qualquer sintoma de (e não da) doença tempos após o ocorrido.

Desesperado ante a possibilidade de perder sua única filha, apesar de toda sua postura pregressa, o marquês convoca todo tipo de médicos, boticários, farmacêuticos e mesmo ciganas para tentar salvar-lhe a vida, porém estes colocam Sierva em profundo sofrimento: a menina é submetida a tantos experimentos que lhe modificam os humores e essencia, que o marquês é convocado pelo próprio bispo a leva-la a Santa Clara, o grande convento da cidade, pois o certo era que a criança estaria possuída pelo demônio.

Acredito que pode-se dizer, apesar de já termos tido até aqui tantos detalhes sobre os personagens, que é a partir deste ponto que o livro "começa". Como toda obra de Gabriel Garcia Márquez, nem sempre o protagonista é figura de único destaque no enredo, e com isso acompanhamos detalhes que nos dão entendimento não só de como cada personagem lida com a situação da menina, mas também de como a sociedade da época com seus princípios pautados em preconceitos, misticismos e pensamentos escravistas, beiram a crueldade em suas ações, demonizando o que não conseguem compreender e sacrificando, assim, vidas inocentes.

Este livro é uma história de amor, mas o amor como um demônio, que possui o ser amado; mas e quanto aos outros demônios? O autor nos revela em cada capítulo como nos damos, ou evitamos, os nossos demônios, os da solidão, os dos mitos, os demônios por detrás do desconhecido, o demônio da ignorância, o demônio que possui as ideias da supremacia racial (brancos > negros).

Não foi uma leitura tão imersiva para mim quanto outros livros deste escritor MARAVILHOSO, mas recomendo sem pensar duas vezes.

site: @viveprale

Marielle6 15/07/2022

Excelente leitura
O que dizer de Gabriel Garcia Marquez? Lenda viva!
Um dos autores mais incríveis para se ler.
Esse livro em específico aborda temas que são tão atuais apesar da história se passar há muito tempo no passado, e mescla uma variedade de assuntos ao mesmo tempo contraditórios que deixam você perplexo. Simplesmente indico a leitura.

BáCamargo 17/03/2010

Do Amor e Outros Demônios...
Só mesmo Gabriel Garcia Marquez para contar uma história tão pequena e ao mesmo tempo tão profunda e impossível de esquecer.
Com este livro é possível aprender que todos temos demônios dentro de nós(nossos defeitos, mágoas,ódios...), o amor acontece não quando conseguimos eliminá-los do outro, mas justamente quando estamos dispostos a enfrentá-los dia após dia porque no fundo sabemos que o amor é o melhor dos exorcistas.

lorena 15/08/2021

demonios mesmo
puta homem desgraçado adora a filha mas a que custo pra coitada que acaba só o pó no convento? pelo menos ela é cabeluda o soco em mim que to ficando careca.

Ingrid 16/05/2021

Fantástico!
Gabriel García Márquez, nesta obra, consegue misturar diversas questões religiosas com a fantasia.

Do amor e outros demônios conta a história de Sierva Maria, uma garotinha de apenas 13 anos, filha de um casal de marqueses mas que foi criada pelos escravos de sua casa. Um certo dia, Sierva é mordida por um cachorro e após algumas mudanças em seu comportamento, a família acredita que a menina contraiu raiva - doença esta que era confundida com possessão demoníaca.

O marquês, seu pai, decide procurar o Bispo e acaba internando a filha no Convento de Santa Clara por achar que a menina estava possuída pelo demônio.

O padre Cayetano Delaura, designado pelo Bispo para cuidar de Sierva e fazer o exorcismo, aos poucos consegue perceber que não se tratava de questões espirituais; passa a conhecer a história da menina, o fato dela ter sido criada inserida na cultura dos negros e, consequentemente, seguir sua religião e falar diversos idiomas.

Sobre isso, ele dirá: ?Às vezes atribuímos ao demônio certas coisas que não entendemos, sem cuidar que são coisas de Deus.?

E é nessa perspectiva que a história se desenvolve, abordando de maneira magnífica a questão das diferenças, da intolerância religiosa e, principalmente, a questão do amor.

?Não há remédio que cure o que a felicidade não cura (Gabriel García Márquez).?

Nota 10/10. Recomendo a leitura, é simplesmente fantástica!

Eva 30/01/2021

Nesse romance que mistura a religiosidade cristã, trazida pelos europeus, com o misticismo das religiões indígenas e africanas (chamadas pagãs) tudo isso com o toque do realismo mágico de Gabriel Garcia Márquez para contar uma história de amor em meio a opressão da colonização e da Igreja com os povo nativos e escravizados na América do Sul, mais especificamente, na Colômbia, colônia da Espanha.