Craotchky 22/02/2022Sobre o todo, o nada e o que talvez exista ali no meioUm simples problema de relacionamento foi o estopim que levou Trin Tragula a criar uma máquina conhecida como o Vórtice da Perspectiva Total. O invento de Trin Tragula é uma máquina capaz de proporcionar a quem a utiliza uma visão/imagem/percepção "da totalidade do universo a partir do princípio de análise extrapolativa da matéria". Em resumo, o Vórtice da Perspectiva Total "mostra" a você, em um curto instante, a infinitude de tudo que existe, ao mesmo tempo que "mostra" você em relação a esse todo. Ao que eu saiba, apenas um ser resistiu à máquina, isto é, à consciência que ela lhe trouxe e as diversas implicações de se saber tão insignificante. Quase todos os outros tiveram seus cérebros liquefeitos.
A consciência, na verdade impossível, da dimensão total do universo parece ser algo capaz de causar um grande impacto. Algumas vezes, ao tentar (pois de fato é impossível para a limitada mente humana conceber a totalidade de tudo) imaginar de forma visual a impensável dimensão do universo,
[Minhas tentativas invariavelmente me levam a imaginar uma visão aérea se afastando progressivamente. Quanto mais afastada, menores as coisas ficam. Por fim, tento levar esse afastamento até o limite da minha imaginação. O famoso vídeo conhecido como "Pálido ponto azul", de Carl Sagan na série Cosmos, representa bem a ideia (link para vídeo mais abaixo). A diferença é que tento imaginar um afastamento muito mais extremo.]
consigo sentir uma sensação de difícil descrição: como que de pequenez, esvaziamento total, perda de sentido, solidão primal. Tenho certeza que determinadas percepções sensoriais e de consciência participam dessa "sensação". Outra certeza é que jamais vou conseguir ilustrar em linguagem isso que estou chamando de sensação de forma necessariamente imprecisa.
Conjuntamente, brotam reflexões acerca da razão de existir algo ao invés de nada,
(Se é que nada não é alguma coisa, afinal, se nada existe, então parece haver um nada. Eis uma problematização do conceito de nada. Se o nada pode ser entendido como um vazio absoluto, então há/existe pelo menos esse próprio vazio absoluto.
"[...] o Rei Vermelho pergunta a Alice: 'O que você está vendo?', e Alice responde: 'Nada'. O rei, impressionadíssimo, comenta: 'Mas que ótimos olhos você tem!'")
e qual a origem da primeira coisa. Claro que muitas outras reflexões vêm à tona, mas uma das mais importantes é a consciência da insignificância de qualquer pessoa, evento histórico, sociedade, religião, em face da dimensão espacial e temporal do todo. Praticamente tudo que você acha de suma importância aconteceu em um minúsculo pálido ponto azul na escuridão e no tempo.
Assista ao vídeo (menos de quatro minutos), ele fala por si:
https://www.youtube.com/watch?v=SHDelUDudbU
Se fosse realmente possível ter a consciência exata da dimensão do todo e da pequenez de tudo o que conhecemos e chamamos de mundo, estou certo que ela abalaria profundamente qualquer pessoa. (Mantenha-se longe do Vórtice, portanto.)
Para não dizerem que não falei do livro... o excelente livro de Marcelo Gleiser me trouxe reflexões embaralhadas a respeito da vida, o universo e tudo mais. A obra se parece com um documentário no qual você acompanha a história da ciência, sobretudo no que se refere à astronomia e à física. Apenas no terço final o texto apresenta conteúdos mais técnicos e com isso impõe alguma dificuldade, ainda que não muito grande. A dança do universo é um baita passeio pela história científica e vale muito a pena empreendê-lo.
"E como sempre, quanto mais aprendemos, melhor dimensionamos nossa ignorância[...]"