deuxdesoleil 04/07/2023
Fofoca é bom, sim!
Eça de Queiroz... o que eu posso dizer, que tantas outras pessoas já não tenham dito sobre esse autor? São poucos os escritores que conseguem fazer poesia, de maneira tão complexa, com assuntos tão banais, dentro de um romance tão grande, quanto Eça de Queiroz. Para mim, "O primo Basílio", assim como todas as obras que li do autor, são isso: poesia.
É uma história lenta, que narra personagens insignificantes, com objetivos insignificantes em uma sociedade repleta de contradições, sentimentos rasos e problemas sociais. Queiroz escancara cada um desses problemas e trata a insignificância das personagens com uma grandeza absurda.
Acredito que os leitores (mais jovens e mais velhos) desgostam dessa lentidão porque estamos tão acostumados (e me incluo aqui) em histórias dinâmicas, com acontecimentos maravilhosos, com sentimentos passionais e objetivos de muita significância, tanto para a narrativa quanto para o desenvolvimento das personagens, que, é claro, quando nos deparamos com um romance que segue o caminho inverso, ficamos um pouco entediados.
Não apenas entediados, acredito também que a narrativa de Queiroz provoca bastante indignação. Afinal, as personagens fazem dramas absurdos com situações minúsculas. A indignação se dá ainda com as diversas problemáticas trazidas à tona: a questão do machismo, o preconceito racial, o patriarcado, a pobreza, as desigualdades de classes e afins. Queiroz trabalha com essas problemáticas de uma maneira intrínseca ao cotidiano das personagens, explicitando o quanto é real e o quanto essas situações poderiam acontecer, e acontecem, na realidade.
É triste, porém é muito bonito ver que "O primo Basílio" permanece uma obra atual, com discussões contemporâneas e reflexões vivas.
Por fim, reconheço a maestria de Queiroz. A obra, apesar de carregar temas complexos e doloridos, como o racismo e a mulher como objeto de uso, tem um dinamismo e leveza, que toda a temática mais difícil de engolir muitas vezes passa "batido". O leitor é convidado a explorar o cotidiano dessa pequena burguesia, como se estivesse debruçado na sacada de uma janela fofocando sobre a vida alheia. E todas as fofocas são deliciosas!
Queiroz, apesar de não ser sua obrigação, ainda traz bom humor em doses muito inteligentes. As pequenas explosões de ira, as fofocas mal contadas, os comentários atrás das cortinas, situações tão ridículas, que se torna impossível não soltar um riso ou dois. Como leitor, você apenas sorri e aguarda a próxima fofoca.