Márcia 10/07/2011Brincar com o tempo nunca foi tão possível
Só há uma coisa a dizer sobre esse livro: você nunca, jamais, leu algo igual. Eu pelo menos nunca li nada nem sumariamente parecido. “A Mulher do Viajante no Tempo” vai além de qualquer romance ou aventura.
No início me pareceu bastante confuso. Não sou muito adepta à livros que especificam muitas datas, sempre me perco, não gosto de prestar atenção a esses detalhes. Mas o que fica evidenciado logo de cara é o estilo peculiar da autora. Desde as primeiras páginas ela cria um labirinto de datas maravilhoso de se percorrer. Você pode se confundir sim, mas é uma confusão incrivelmente interessante e desafiadora.
A Audrey Niffenegger escreve sobre o tempo e toda a sua complexidade; ela vai, volta e vai mais longe ainda na história dos seus personagens, num zigzag que sobrenaturalmente cria formas sem problemas na leitura. A narrativa é suave e despretensiosa, o que dá mais charme ainda à história. Tudo faz sentido, absolutamente tudo tem importância nesse livro; até mesmo o detalhe mais ínfimo, uns são mais importantes que os outros, mas todos fazem diferença. São os detalhes que compõem esse romance tão original.
Essa é a maior história de amor que leio desde “P.S. Eu te Amo”. Deliciosa. E os personagens tem a maior fatia do bolo porque são o que os livros tem de melhor. Uma história pode ser original, bem fundada, coerente e bem escrita, mas se ela não for bem vivida (pelos personagens) morrerá, porque o leitor também não poderá bem vivê-las.
Henry é um daqueles personagens inesquecíveis. Não somente por ser um viajante no tempo (meu primeiro), mas por sua própria personalidade. Não dá para descrevê-lo, mas apenas digo que ele é aquele tipo de cara que faz seu coração disparar quando fala. Não necessariamente bonito, não rico de forma alguma, mas inteligente, charmoso e incrivelmente misterioso (sem o papinho de “escondo minhas presas e bebo suco de mortais”). Não. Henry tem aquele mistério humano que todos carregamos, mas que nele vibra a cada expiração. Desse jeito nem parece que falo apenas de um personagem de tinta e papel, mas espero mesmo que em algum lugar por ai exista um Henry amando uma Clare.
Drogas, sexo e Rock’n Roll também fazem parte dessa trama. Henry é punk, e quando jovem, inconseqüente e mulherengo ferrenho, bebia e se drogava. Mas ele era apenas um jovem que, mais frequentemente do que gostaria, dava uma guinada para frente ou para trás no seu tempo, sem qualquer controle da situação. Num piscar de olhos ele poderia estar de volta à cena em que perdeu sua mãe, quando ainda pequeno, ou poderia estar de volta ao lugar onde conheceu sua futura mulher. Tudo na vida dele era passageiro e diáfano, até que Clare aparece onde deveria, em seu presente.
Clare é outra personagem maravilhosa; surpreendentemente forte, é o alicerce da história, mas realmente não é a estrela. Não somente ela, como os personagens secundários também fazem toda a diferença. Ingrid é um caso à parte, mesmo com tão pouca participação.
O interessante é que a autora soube manejar os fatos do enredo a fim de que tudo fizesse sentido. E, mexendo com o tempo, isso é um grande feito. O fato de Henry sempre viajar para o tempo nu é uma grande sacada. O futuro ser nebuloso evita precauções que tirariam o gostinho do livro e faz com que as ocasiões dessas viagens sejam extremamente valorizadas tanto por personagem quanto por leitor.
A história toma rumos angustiantes para o leitor tão afeiçoado aos personagens. Eu fiquei louca pelo final e quando cheguei lá, ensandecida e aos prantos, decidi que essa foi a história mais romântica que já li na vida.
Vale a pena cada volta no tempo.