mpettrus 30/09/2021
A Redenção de Um Vilão
“A hora e a vez de Augusto Matraga” narra a história de um homem de poder que perde tudo de material, a família, os companheiros e serviçais em virtude da sua prepotência e vingança. Porém, o protagonista tem a oportunidade de se redimir e tomar atitudes gentis, além de ajudar ao próximo como forma de se redimir de seus pecados.
A identidade do protagonista é, inicialmente, marcada pela bravura, pela brutalidade e altivez, características do sujeito sertanejo e jagunço. Porém, no decorrer da história Nhô Augusto acaba por perder os brios da jagunçagem tornando-se um homem temente a Deus e dos castigos divinos, temendo que algo pior do que já lhe acontecera pudesse mais uma vez recair sobre si, ou seja, um indivíduo submisso ao universo do medo. É interessante analisar essa lógica de pensamento do protagonista, porque se outrora ele era um homem terrível que cometia maldades com seus semelhantes por puro prazer, agora ele busca pela redenção dos seus pecados. Então ele atribui a punição divina ao fato de ter que passar por muito sofrimento como a perda da família, dores físicas e etc., passando a acreditar que era mediante a esse sofrimento que conseguiria o perdão de Deus e a entrada no céu.
“A hora e a vez de Augusto Matraga” é a última novela do livro Sagarana sendo narrado em terceira pessoa. Guimarães Rosa nos apresenta mais uma vez o interior de Minas Gerais, no Triângulo Mineiro, sendo ambientada em três locais, que se passa ao longo de 7 anos: Murici, localidade onde se desenrola o núcleo central da narrativa, com a apresentação dos personagens principais e conflitos; Tombador, onde Matraga paga a sua penitência morando com um casal de velhinhos negros e por fim, Rala-Coco, localidade próxima a Murici, aonde ele retorna, já no fim de sua penitência, para cumprir a sua tão falada hora e vez que dá título ao livro.
A novela possui uma gama de personagens interessantes que compõem a trama. Temos Augusto Esteves, também nomeado como Nhô Augusto e Augusto Matraga em diversos momentos da história; Dianóra, sua esposa, com quem teve uma filha, Mimita. A esposa acaba fugindo com Ovídeo Moura. Temos o grande algoz de Nhô, o Major Consilva. O emblemático Quim Recadeiro, mãe Quitéria e Nhô Serapião, o casal idoso que cuida de Augusto após o revés que o deixa praticamente morto. E mais lá para a parte final da narrativa aparecem Joãozinho Bem-Bem, que estará na derradeira hora da vida de Nhô Augusto, num dos finais mais apoteóticos que já li na vida.
De uma maneira geral, a narrativa possui três momentos que demarcam a história facilitando nosso entendimento: primeiro temos um homem de poder e coragem; depois, um homem que teve uma queda e conheceu o medo, e por último, um homem em busca da sua redenção. A história trata não apenas de um misticismo, como também aborda a temática da coragem e do medo que envolvem o ser humano. Nota-se que o poder e a coragem estão minimamente ligados e há toda uma segurança do protagonista no começo, mas que essa mesma coragem o move em direção ao medo que o isola e lhe permite recomeçar, levando-o a passar por todo um processo místico em busca da almejada redenção.
Possui uma imensa carga humana que faz o intrépido protagonista sofrer as penosas consequências da valentia manifestada, passando a condição de moribundo e sujeito aos cuidados de estranhos, ao passo que ocorre um processo de renascimento. Renascimento esse que lhe traz numa nova roupagem, manso e bom, mas com ímpetos que fez com que eu acreditasse na possibilidade de retomada do personagem à condição inicial de vingador, porém, os acontecimentos inesperados me surpreenderam.
A narrativa roseana permite o flagra da condição humana em meio a um universo sertanejo hostil em que mais vale a coragem, pois o medo seria a mais alta representação da vergonha, por isso, o protagonista parte para o desafio e enfrenta os perigos que poderá leva-lo à glória e a obtenção do perdão e a entrada nos reinos do Céu.