Giovanna Andreani 19/02/2022
Ousadia expressa de modo elegante e comedido
O desfecho de Noite de Almirante transmite ao leitor uma sensação meio angustiante de que entendeu, mas não tudo, de que acompanhou uma história realista mas percebeu também algo mais que ele não sabe nomear, algo que caminhou em paralelo, ou por baixo, ou pelo lado, do fluxo do relato. (FISCHER, 2008, p.144). Isso se estabelece devido o cerne da trama se fazer presente não no enredo, mas sim na maneira como nos é contada a história. Concentrado apenas no encadeamento das ações, o leitor deixa passar o que é de mais valioso no conto: a ambiguidade do relato e como ela nos é apresentada. Imprecisão é a chave para desvendar o que “caminhou em paralelo, ou por baixo, ou pelo lado” no fluxo do conto. Conforme o dicionário Caldas Aulete, a imprecisão é a falta de precisão, de exatidão, de clareza; é a AMBIGUIDADE, e notamos durante toda a análise que é disso que “Noite de Almirante” é feito, observamos ambiguidade no narrador ao se aproximar dos pontos de vista do traído e da adúltera, imprecisão nas ações dos personagens, inexatidão no desenrolar das ações, é esse elemento incerto que forma o todo do conto.
A célebre frase de Pompeu “Navigare necesse, vivere non est necesse'', transformada ao longo dos anos pelo poeta Petrarca em: “Navegar é preciso, viver não é preciso” e ressignificada por sua vez por Fernando pessoa, nos ajuda a enxergar a imprecisão que forma o conto “Noite de Almirante”, visto que a navegação é precisa no sentido de ser necessitada no conto, todo o resto, todo o viver de Deolindo e Genoveva, incluindo a narração de sua história, não é preciso no sentido que não é exato. Portanto, a única coisa precisa (exata) em “Noite de Almirante” é a imprecisão!