Tati 14/07/2017Até o começo desse ano eu era a pessoa que, quando visitava uma exposição de arte contemporânea e não entendia bulhufas do que estava acontecendo ali, pensava: ah, qualquer pessoa pode fazer isso. Ou então, me identificava com o chiste bastante difundido de encontrar um caixote jogado no meio do museu e não saber se faz parte da exposição ou é simplesmente algo que alguém esqueceu ali. Apesar do cinismo, sempre que possível eu ia nessas exposições, talvez com vontade de que alguma coisa chamasse minha atenção a tal ponto que eu suspirasse e dissesse: ufa, isso eu consigo identificar como arte. Não aconteceu em uma exposição, mas em uma aula com um professor entusiasta de artistas para mim totalmente desconhecidos. Ele disse mais ou menos assim: 'Muitas pessoas olham pra essas obras e pensam: ah, qualquer um pode fazer isso (pausa dramática, ele é afeito a essas coisas). Mas então, por que qualquer um não faz?'. Fiquei no chão. E foi assim que eu comecei a olhar com outros olhos para essas obras que acontecem talvez, num tempo diferente, onde o que importa é como ela é feita e não o resultado do que é feito.
E foi no momento de escrever o artigo de fechamento da matéria que lembrei desse livro do Vila-Matas e pensei: olha, acho que pode me ajudar. Não poderia estar mais certa, 'Não há lugar para a lógica em Kassel' é uma ficção romanceada da visita do autor a uma das maiores exposições de arte contemporânea do mundo - que eu também só vim conhecer esse ano - a Documenta, que acontece em Kassel na Alemanha. Vila-Matas é convidado de uma forma um pouco inusitada para fazer parte da décima terceira edição da Documenta, não apenas como autor, mas como parte de um conceito: ele ficaria escrevendo em um restaurante chinês e, quem se interessasse, poderia parar e conversar com ele, o que o deixou muito angustiado (quem não ficaria?). Mesmo assim, ele topou. Mais como uma tentativa de se abrir para outras artes além da literatura ou fazer com que a letra contenha outras coisas.
E é um dos livros mais bonitos dele entre os que já li, principalmente porque dá pra ver o cinismo caindo em muitos momentos. Ou talvez eu tenha me identificado com isso. Mas é um relato que, ao falar sobre a busca da originalidade na arte, fala também sobre sua impossibilidade. E renova uma discussão que parece já cansada e enfadonha, trazendo um pouco de graça e leveza a ela.
Vila-Matas é um autor que transita bem entre a erudição e a grande brincadeira que a literatura também pode ser. É possível dar muita risada com a pretensão dele em alguns momentos que, a meu ver, nunca soa pedante, porque ele está sempre rindo de si mesmo. Eu fiquei muito encantada com alguns trechos e acho que dá pra falar páginas sobre esse livro sem esgotá-lo mas o que fica mesmo é o fascínio que ele experimenta diante de algumas obras, o fascínio que qualquer pessoa experimentaria, mesmo quem nunca teve contato com nenhum dos paranauês sobre arte:
"A arte, pensei então, é algo que está acontecendo conosco".