Ser e Tempo

Ser e Tempo Martin Heidegger




Resenhas - Ser e Tempo


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Marcos606 28/06/2023

Começa com uma questão ontológica tradicional, que Heidegger formulou como Seinsfrage, ou a “questão do Ser”. Em um ensaio publicado pela primeira vez em 1963, “Meu caminho para a fenomenologia”, Heidegger colocou o Seinsfrage da seguinte forma: “Se o Ser é predicado em múltiplos significados, então qual é o seu principal significado fundamental? O que significa Ser?” Se, em outras palavras, existem muitos tipos de Ser, ou muitos sentidos nos quais a existência pode ser predicada de uma coisa, qual é o tipo de Ser mais fundamental, o tipo que pode ser predicado de todas as coisas? Para responder adequadamente a essa questão, Heidegger achou necessário empreender uma investigação fenomenológica preliminar do Ser do indivíduo humano, que ele chamou de Dasein. Nesse esforço, ele se aventurou em um terreno filosófico totalmente inexplorado.

Desde pelo menos a época de René Descartes (1596-1650), um dos problemas básicos da filosofia ocidental foi estabelecer uma base segura para o conhecimento presumido do ser humano individual sobre o mundo ao seu redor com base em fenômenos ou experiências sobre os quais ele poderia ter certeza.

Essa abordagem pressupunha uma concepção do indivíduo como mero sujeito pensante (ou “substância pensante”), radicalmente distinto do mundo e, portanto, isolado cognitivamente dele. Heidegger virou essa abordagem de cabeça para baixo. Para Heidegger, o próprio Ser do indivíduo envolve o engajamento com o mundo. O caráter fundamental do Dasein é uma condição de já “ser-no-mundo” – de já estar preso, envolvido ou comprometido com outros indivíduos e coisas. Os envolvimentos e compromissos práticos do Dasein, portanto, são ontologicamente mais básicos do que o sujeito pensante e todas as outras abstrações cartesianas. Assim, Ser e Tempo dá lugar de destaque a conceitos ontológicos como “mundo”, “cotidiano” e “ser-com-os-outros”.

No entanto, a estrutura de Ser e Tempo é impregnada por uma sensibilidade - derivada do protestantismo secularizado - que enfatiza a supremacia do pecado original. Conceitos carregados de emoção como “angústia”, “culpa” e “queda” sugerem que o mundanismo e a condição humana em geral são essencialmente uma maldição. Heidegger, ao que parece, adotou implicitamente a crítica da “sociedade de massa” apresentada por pensadores do século XIX, como Kierkegaard e Friedrich Nietzsche, uma perspectiva que estava bem estabelecida no professorado amplamente liberal da Alemanha no início do século XX. Esse tema é ilustrado no tratamento de “autenticidade” de Ser e Tempo, um dos conceitos centrais da obra. A visão de Heidegger parecia ser a de que a maioria dos seres humanos leva uma existência que não é autêntica. Ao invés de enfrentar sua própria finitude – representada acima de tudo pela inevitabilidade da morte – eles buscam distração e fuga em modalidades inautênticas como curiosidade, ambiguidade e conversa fiada. Heidegger caracterizou tal conformidade em termos da noção de – “os Eles”. Inversamente, a possibilidade de um autêntico Ser-no-mundo parecia pressagiar o surgimento de uma nova aristocracia espiritual. Tais indivíduos seriam capazes de atender ao “chamado da consciência” para realizar seu potencial de Ser-si-mesmo.

Heidegger acreditava que a ontologia ocidental tradicional, de Platão a Immanuel Kant, havia adotado uma compreensão estática e inadequada do que significa ser humano. Na maior parte, os pensadores anteriores conceberam o Ser dos humanos em termos das propriedades e modalidades da “coisa”, daquilo que é “presente à mão”. Em Ser e Tempo, Heidegger enfatizou inversamente Ser-no-mundo como Existência – uma forma de ser que é orientada para suas próprias possibilidades. Desse ponto de vista, uma das características distintivas do Dasein inautêntico é que ele falha em atualizar seu Ser. Sua passividade existencial torna-se indistinguível do ser inerte e não exato das coisas.
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Romeu Felix 22/03/2023

Fiz o fichamento sobre esta obra, a quem interessar:
O livro "Ser e Tempo" é a obra mais conhecida do filósofo alemão Martin Heidegger. Escrito na década de 1920, a obra é considerada um dos marcos da filosofia do século XX. O livro apresenta uma investigação sobre a questão do ser, questionando a forma como os seres humanos se relacionam com a sua existência e com o mundo ao seu redor.

Heidegger começa por mostrar que a filosofia tradicional, desde os gregos até a sua época, nunca abordou a questão do ser em si mesma, tendo se limitado a questionar apenas as coisas que estão no mundo. Ele propõe uma abordagem diferente, que parte da existência do ser humano e da forma como ele se relaciona com o mundo.

O autor propõe uma análise da existência humana em sua totalidade, considerando tanto as dimensões ontológicas (relativas ao ser em si mesmo) quanto as existenciais (relativas ao modo como o ser humano se relaciona com o mundo). Ele mostra que o ser humano não é apenas uma coisa no mundo, mas um ser que tem a capacidade de se relacionar consigo mesmo e com os outros seres ao seu redor.

Heidegger também analisa as diferentes formas de compreensão do ser humano ao longo da história, destacando o papel da tradição filosófica e da linguagem nesse processo. Ele mostra que a linguagem é fundamental para a compreensão do ser humano, uma vez que é através dela que as coisas são nomeadas e que o ser humano se relaciona com o mundo.

Ao longo da obra, Heidegger desenvolve uma série de conceitos-chave para a compreensão da sua teoria, como o Dasein (a existência humana), o ser-no-mundo (a relação do ser humano com o mundo) e o ser-para-a-morte (a consciência da finitude e da mortalidade).

Além disso, ele propõe uma crítica à filosofia tradicional, mostrando que ela se limita a descrever as coisas e que é necessário ir além da descrição para compreender o ser em si mesmo.

Conclusão:

"Ser e Tempo" é uma obra fundamental para a filosofia contemporânea e uma das mais importantes da obra de Martin Heidegger. O livro apresenta uma abordagem original e complexa da questão do ser, que tem influenciado não apenas a filosofia, mas também outras áreas do conhecimento, como a psicologia e a sociologia. A obra é considerada um desafio para a compreensão da existência humana e para a reflexão sobre a condição humana.
Por: Romeu Felix Menin Junior.
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Sunkey 04/10/2017

SER E TEMPO (RESUMO)
INTRODUÇÃO

I. NECESSIDADE, ESTRUTURA E PRIMADO DA QUESTÃO DO SER

Durante a história da filosofia a questão do ser caiu no esquecimento devido a três preconceitos: (1) de que o ser é o conceito mais universal e por isso é claro por si mesmo; (2) de que o ser não pode ser definido já que toda definição ao dizer o que uma coisa é, já pressupõe o ser e; (3) de que o ser é evidente por si mesmo e, portanto, é inútil interrogá-lo.
Contra esses preconceitos, deve-se colocar a questão do ser, esta questão envolve: (i) o perguntado: aquilo sobre o qual a questão inquire, no caso o ser; (ii) o interrogado: aquilo ao qual a questão é posta, no caso o ente e; (iii) o questionado: aquilo que a questão visa obter, no caso o sentido do ser.
O ser é sempre ser do ente. Ao discurso que diz respeito ao ser chamamos de ontológico, enquanto o discurso que diz respeito ao ente é chamado de ôntico. O único ser capaz de interrogar sobre o sentido do ser é o Ser-aí, de modo que só poderemos alcançar o ser através de uma explicitação do Ser-aí. O Ser-aí possui um primado ôntico (ele é o único ente cuja essência é a existência), ontológico (ele compreende em si mesmo o ser) e ôntico-ontológico (o Ser-aí é a condição de possibilidade de todos os outros seres). Nesse sentido, o Ser-aí tem a prerrogativa de ser interrogado em primeiro lugar quanto à questão do ser.

II. AS DUAS TAREFAS DE UMA ELABORAÇÃO DA QUESTÃO DO SER

O fato de o Ser-aí possuir um primado ôntico-ontológico não significa que ele seja desde logo transparente quanto ao seu ser-próprio visto que sua constituição específica de ser permanece encoberta. Desse modo, é necessário um método a fim de des-cobrir o ser.
A analítica do Ser-aí inclui em primeiro lugar a tarefa de uma destruição da ontologia, que de um lado exige a desconstrução dos conceitos recebidos da ontologia tradicional e de outro a delimitação das possibilidades positivas dessa tradição. Feita essa destruição, a questão do ser poderá ser melhor investigada, o método de investigação que deve ser usado para tal é o método fenomenológico.
A Fenomenologia pode ser definida como “fazer ver a partir de si mesmo o que se mostra a partir de si mesmo”, isto é, a fenomenologia é um trazer à luz aquilo que se encontrava encoberto, no caso o ser. Nesse sentido, a ontologia só é possível como fenomenologia. A Filosofia é uma ontologia fenomenológica e universal que parte da hermenêutica do Ser-aí enquanto analítica da existência.

PARTE I – A INTERPRETAÇÃO DO SER-AÍ PELA TEMPORALIDADE E A EXPLICAÇÃO DO TEMPO COMO HORIZONTE TRANSCENDENTAL DA QUESTÃO DO SER

I. EXPOSIÇÃO DA TAREFA DE UMA ANÁLISE PREPARATÓRIA DO SER-AÍ

O Ser-aí é o ente que nós mesmos somos a todo instante e nesse sentido o ser deste ente é sempre meu. A essência do Ser-aí é a existência, por existir entende-se o movimento de sair de si próprio em direção àquilo que se projeta ser, assim o Ser-aí é aquilo que ele pode ser. A analítica existencial do ser do Ser-aí é uma análise ontológica e, nesse sentido, não deve ser confundida com o estudo sobre o homem que é feito pela antropologia, pela psicologia e pela biologia.

II. O SER-NO-MUNDO EM GERAL COMO CONSTITUIÇÃO FUNDAMENTAL DO SER-AÍ

Para compreender o que queremos dizer por ser-no-mundo, isto é, ser-em-o-mundo, é preciso esclarecer o que entendemos por ser-em. Ser-em significa habitar junto a um mundo familiar. Ser-no-mundo é uma constituição essencial, necessária e a priori do Ser-aí. O ser-no-mundo não é uma “propriedade” que o Ser-aí às vezes apresenta e outras não, o Ser-aí não é primeiro um ente que depois assume uma relação com o mundo, ele já é essencialmente ser-no-mundo.

III. A MUNDANIDADE DO MUNDO

Considerando o categorial como se referindo às estruturas daquilo que não tem o modo de Ser-í e como existencial aquilo que diz respeito às estruturas do Ser-aí, a palavra mundo é polissêmica e pode significar (1) categorial-onticamente, a totalidade dos entes que se podem simplesmente se dar dentro do mundo; (2) categorial-onticamente, o ser dos entes; (3) existencial-onticamente; o contexto em que o Ser-aí vive como Ser-aí e; (4) existencial-ontologicamente, a mundaneidade. A mundaneidade designa a estrutura constitutiva do ser-no-mundo.
No mundo, o Ser-aí se ocupa dos entes que lhe vem ao encontro. O ente que vem ao encontro na ocupação é o utensílio, o ente-à-mão. O Ser-aí lida com os utensílios como coisas que têm uma utilidade, um valor de uso, o ser do utensílio é servir, é ser-uma-coisa-para. O conjunto que abarca o utensílio, o usuário, o uso e a obra chama-se circunvisão.
A manualidade do utensílio se manifesta quando o ente deixa de surgir como disponível. Nesse caso, o ente-a-mão apresenta três modos que mostram o caráter de algo que é dado como manual: (1) surpresa: demonstração da manualidade do manual (a impossibilidade de emprego do instrumento faz descobrir a manualidade do instrumento); (2) importunidade: desarranjo do uso (quando não se sabe o que fazer com o instrumento, o que põe de novo em descoberto o manual) e; (3) impertinência: não-estar-à-mão, não-manual (quando não se tem tempo para se ocupar do instrumento). Assim, é quando o utensílio “quebra” que ele nos obriga a nos atentarmos a ele.
O utensílio consiste numa relação de remissão com outros entes no interior do mundo. O signo é um utensílio que tem por função assinalar. O utensílio enquanto signo se refere, em última instância, ao Ser-aí. Todo ente, assim, se liga a um outro ente, essa relação pode ser chamada de destinação no sentido de que nessa relação fica estabelecido aquilo para-que determinado utensílio é destinado. A finalidade última dos utensílios é o Ser-aí.
O espaço é uma determinação do mundo, os utensílios ocupam uma região para-onde o Ser-aí se dirige para encontrá-lo. A espacialidade também deve ser atribuída ao Ser-aí. O Ser-aí está no mundo no sentido de lidar familiarmente na ocupação com os entes que vêm ao encontro dentro do mundo. A espacialidade do ser-no-mundo apresenta os caracteres de dis-tanciamento (fazer desaparecer a distância de alguma coisa, aproximar) e de direcionamento (a aproximação toma uma direção dentro de uma região), assim, a ocupação se dá como um dis-tanciamento direcional. O Ser-aí abre o espaço para permitir o seu encontro com os entes.

IV. O SER-NO-MUNDO COMO SER-COM E SER-PRÓPRIO. O A-GENTE

O mundo do Ser-aí é sempre o mundo compartilhado com os outros. A existência do Ser-aí é existir-com-os-outros, é co-existir. Ser-aí é ser-com, isso significa que o mundo é sempre um mundo compartilhado. Assim, ser-no-mudo é ser-em-comum. No entanto, na convivência cotidiana, o Ser-aí tende-se a perder-se no a-gente. Possuído pelo outro, o Ser-aí escapa a si mesmo. O Ser-aí se dispersa no a-gente, tornando-se impessoal. O ser-próprio do Ser-aí cotidiano é o próprio-impessoal, que se distingue da propriedade, ou seja, do si mesmo apreendido como próprio.

V. O SER-EM COMO TAL

Para que se possa caracterizar fenomenalmente o ser-em enquanto tal é precisa examinar o Aí do Ser-aí, pois o “aí” do Ser-aí é aquilo que é constituído essencialmente pelo ser-em-o-mundo. O Aí é constituído existencialmente pela: (1) disposição afetiva: O Ser-aí encontra-se afetado por um sentimento, como, por exemplo, o medo que é o temer daquilo que se apresenta no caráter de ameaça; (2) compreensão: projeção das possibilidades do Ser-aí e; (3) discurso: articulação significativa da compreensão do Ser-aí em sua disposição afetiva por meio da linguagem.
No entanto, quando se encontra absorvido pelo a-gente, o Ser-aí sofre uma queda (decadência) na cotidianidade, isto é, há uma ocultação do Ser na vida cotidiana. O Aí-cotidiano é caracterizado pelo: (1) falatório: adoção do discurso cotidiano e mediano; (2) curiosidade: voracidade insasiável por novidades e (3) ambiguidade: nada é compreendido de verdade. A disposição afetiva que retira o Ser-aí de seu empenho decadente no “mundo” rompendo com a familiaridade cotidiana do ser-em é a angústia, a percepção da indeterminalidade da existência.

VI. A PRE-OCUPAÇÃO COMO SER DO SER-AÍ

O ser do Ser-aí possui uma unidade estrutural total que é a pre-ocupação. É a pre-ocupação que unifica todos os momentos da existência do Ser-aí. O ser-junto-aos-utensílios se dá como ocupação, enquanto o ser-com-os-outros se dá como pre-ocupação. Pre-ocupação é a constituição, o fundamento, aquilo que nos faz ser-no-mundo.

PARTE II – SER-AÍ E TEMPORALIDADE

I. O SER-TODO POSSÍVEL DO SER-AÍ E O SER-PARA-MORTE

Sendo o ser do Ser-aí a pre-ocupação, o Ser-aí encontra-se sempre diante de si mesmo, lançado para frente. Pre-ocupado, o Ser-aí encontra-se sempre diante da expectativa de uma possibilidade não-realizada, de modo que há, na própria constituição do Ser-aí, uma incompletude, um constante inacabamento. O Ser-aí só se completa com a morte. A morte é uma passagem do ente como Ser-aí para um ente como coisa. A morte não é o fim da vida, mas a essência da vida, ela faz parte do Ser-aí. A morte é a possibilidade da impossibilidade da existência.

II. O TESTEMUNHO PELO SER-AÍ DO SEU PODER-SER PRÓPRIO E A RESOLUÇÃO

Na medida em que o Ser-aí encontra-se perdido no a-gente, ele deve primeiro se encontrar. Para se encontrar ele deve mostrar-se a si mesmo em sua possível propriedade. O testemunho deve dar a compreender um poder-si-mesmo em sentido próprio. Esse testemunho dá-se na forma de uma voz da consciência, um apelo que clama a fim de arrancar o Ser-aí da existência cotidiana. Na realidade é o próprio Ser-aí que apela, que chama a si mesmo a tomar uma resolução pelo seu poder-ser próprio. O apelo acusa o Ser-aí de estar em dívida consigo mesmo, revelando sua responsabilidade.

III. TEMPORALIDADE E COTIDIANIDADE

A temporalidade é a essência do ser do Ser-aí. A temporalidade fundamenta-se na totalidade articulada do Ser-aí, relacionando-se com (i) a compreensão: está relacionado com o futuro, no sentido de ser uma projeção de possibilidades ainda não realizadas; (ii) a disposição afetiva: está relacionada com o passado, no ter-sido, de ter-se encontrado lançado em um determinado sentimento, que pode ser autêntico (angústia) ou inautêntico (medo); (iii) a decadência: está relacionada com o presente, como ilustra a curiosidade, que se preocupa essencialmente em poder ver aquilo que se dá no presente e com; (iv) o discurso: é a articulação dos fenômenos anteriores e, nesse sentido não está relacionado com uma temporalização determinada. No entanto, como na maior parte das vezes o discurso de pronuncia na linguagem e, inicialmente, no modo de uma interpretação do mundo próximo, o presente possui uma função constitutiva proeminente. A ocupação também pode ser analisada a partir da temporalidade. O Ser-aí atende à utilização (futuro), torna os utensílios presentes e conserva a utilitização conquistada (passado).

V. TEMPORALIDADE E HISTORICIDADE

Não há história fora do Ser-aí. A historicidade funda-se no ser do Ser-aí, isto é, na sua temporalidade. Assim como o tempo, temporaliza, a historicidade, historializa. O Ser-aí tem a tarefa de assumir a herança do seu passado e a morte a qual está destinado. O destino está relacionado com o próprio ser do Ser-aí enquanto pre-ocupação. A História não é nem o movimento dos objetos, nem uma sequência de vivências subjetivas, a história é a história do ser-no-mundo. Trata-se do encadeamento da existência do estender-se entre nascimento e morte.

VI. TEMPORALIDADE E INTRATEMPORALIDADE COMO ORIGEM DO CONCEITO VULGAR DE TEMPO

O “tempo público” é o tempo no qual vêm ao encontro dentro do mundo o que está à mão e o que é simplesmente dado. Isso exige que se denomine de intratemporal o ente não dotado do caráter do Ser-aí. Atendendo à possibilidade de visão dentro da circunvisão das ocupações, o Ser-aí compreende-se a partir de seus trabalhos diários e assim ele dá a si mesmo o seu tempo. Dando-se a si mesmo o tempo, o Ser-aí leva em conta o curso regular do sol e passa a medir o tempo, escalonando-o conforme uma datação. Assim a temporalidade fundamenta o tempo vulgar. O tempo vulgar é, portanto, datável (pode ser mensurado) e público (é notado por todos).


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morasca 02/09/2017

UMA NOVA CONFIGURAÇÃO DO PENSAMENTO
Martin Heidegger (1889-1976) foi um filósofo existencialista, controverso (eufemisticamente falando) e muito metódico em sua escrita. Ser e tempo, sua obra mais conhecida, trouxe-nos uma modificação notável na maneira de refletir sobre o ser humano.

Usando a fenomenologia de Husserl como ponto de partida, Heidegger segue um encadeamento sequencial e sistemático com o propósito de investigar a questão do Ser. Aquela fenomenologia, é importante deixar claro, não se constitui propriamente de um conhecimento específico sobre os fenômenos, mas uma metodologia de abordagem filosófica. Assim, podemos ter uma fenomenologia filosófica, musical, literária, e assim por diante. Para ele, a filosofia clássica a respeito da existência (a ontologia, grosso modo), "passava por cima" de um ponto crucial: o sentido de Ser em si. Não do Ser como um objeto de estudo científico e filosófico, algo simplesmente dado que pudesse ser escrutinado a partir de um observador externo, mas Ser, propriamente considerado. A pergunta fudamental é: que é Ser? No que consiste essa expressão tão utilizada, mas sobre a qual raramente refletimos?

Aquela fenomenologia estudada e desenvolvida por Heidegger (através dos ensinamentos de seu mestre, Edmund Husserl) tem como lema a expressão "às coisas mesmas!". O conceito de fenômeno, dito simploriamente, é a abordagem filosófica que procura definir um objeto de estudo a partir daquilo que se mostra por ele mesmo. Esse modo de investigação proporciona uma apreensão problemática, pois a cognição humana é sempre "embaçada" por um filtro ideológico. Por ideologia, não falo apenas no sentido comum, como teleologia, mas como predisposições movidas por processos cognitivos internalizados (e geralmente inconscientes) a respeito das coisas do mundo (o conceito Kantiano de representação se aplicaria aqui). Logo, para Heidegger, que intenta reduzir o fenômeno àquilo que ele tem de mais próprio e essencial, a única forma de ontologia seria através do método de redução fenomenológica..

Na primeira parte do livro é exposta essa diretriz, que propõe que se reveja a história da ontologia como um todo. Nesta parte, travamos contato com um de seus inúmeros vocábulos característicos, como Dasein (traduzido como Ser-aí ou como presença, de acordo com o tradutor), que consiste no ser cujo si-mesmo é uma questão a ser posta. Verifica-se a dificuldade de se estabelecer essa nova ontologia, pelo fato de não se estar falando de algo facilmente manipulável, tendo em vista a própria indefinição temática do que seria o Ser. Ele escapa a verificações tradicionais.

Logo de começo, Heidegger elabora uma discriminação entre o Ser do Dasein e o ser das coisas simplesmente dadas. Para ele, a metafísica anterior havia considerado o Ser das coisas como substância, que interpretava tudo o que "é" como "coisas". Logo, não se entende aquela diferenciação como entre sujeito e objeto, pois o conceito de presença é integrado ao mundo. Ser-no-mundo seria, então, um existencial, ou seja, uma parte da estrutura analítica deste ser que ele denomina de presença. Aqui, outros léxicos são ressignificados a partir daquela diferenciação.

Na segunda parte, com a maioria dos conceitos distintivos clarificados fenomenologicamente, o autor prossegue para se concentrar apenas no Ser da presença. Conceitos vistos na primeira parte, como ocupação (remissivo às atividades da presença com os objetos do mundo circundante), são confrontados com outros mais elaborados, como preocupação (que remete às atividades entre presenças), sempre com a finalidade de se chegar ao âmago do ser em si, para desvendar sua natureza.

O livro é extremamente difícil de ser compreendido, sobretudo para quem não está familiarizado com filosofia ontológica. Indico como texto introdutório, que me ajudou bastante, o livro de Paul Gorner, "Being and Time, an introduction" (não sei se existe edições em português, mas provavelmente existem outros livros nesse mesmo caminho).

O texto me proporcionou uma visão bastante rica sobre os conceitos psicológicos (minha área de estudo) e, tenho certeza, pode ser utilizado em outras ciências. É complicado, é custoso, é travado, mas a conquista cognitiva desse texto, mesmo em parte, já traz uma sensação de descolamento dos próprios preconceitos. Excepcional.



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Cesinha 20/03/2017

"Para Heidegger, o homem é um ser encurralado entre dois polos obscuros: o do seu nascimento e o de sua morte. Ele é por isso essencialmente temporal. Ele é uma criatura angustiada e insignificante que se relaciona de forma inquietante com o meio ambiente, carinhosa com seus semelhante na forma de cuidado, e que embora em geral viva perdido na forma de homem inautêntico, é alertado pela consciência mral a aceitar sua culpabilidade, admitindo-se como ser para a mort e para tal devendo apropriar-se repetitivamente do passado. Por isso a temporalidade é o horizonte do ser do homem, seu núcleo mais íntimo".

1. O Ser-Aí (Dasein)

Há uma distinção fundamental em Heidegger é a que existe entre a:
a) existência autêntica
b) existência inautêntica
Veremos a seguir os EXISTENCIAIS. Os caracteres gerais da existência inautêntica na qual em certa medida todos nós, como seres sociais, temos de viver.

Ele começa com a análise da existência inautêntica que é a do SE (man), na qual sempre em alguma medida vivemos.

Ele quer explicitar a situação apriorística do existente humano cotidiano - o seu ESTAR NO MUNDO.

Para Heidegger o homem MORA IMEDIATAMENTE DENTRO DO MUNDO - por isso não há para ele a questão da relação do SUJEITO versus MUNDO EXTERNO, como para Husserl e para outros filósofos modernos.

Este é um pseudoproblema resultante de se pensar que o CONHECIMENTO seja uma categoria fundamental, o que só seria verdade se o homem fosse um ser contemplativo. Mas ele não é. Para o ser humano o fundamental é o FAZER e o CONHECER. SOMOS ABERTURA PARA O MUNDO NO FAZER. O homem vê o mundo como um CONJUNTO DE UTENSÍLIOS, DE COISAS A SEREM USADAS, QUE ESTÃO À MÃO E SEREM MANIPULADAS.

Osutensílios são PARA O HOMEM, que só descobre a estranheza do mundo quando FALTA O UTENSÍLIO.

Mas quando paramos e nos demoramos no mundo, nos descobrimos como algo que é PURAMENTE PRESENTE:

Mas isso conduz a um engano:
Esse sentimento da presença nos faz ver incorretamente o próprio mundo como presença, ou seja, como UM CONJUNTO INTERCONECTADO DE COISAS, quando na verdade o mundo circundante continua para sempre OCULTO SEM SUA UNIVERSALIDADE PRÓPRIA.

É dessa ilusão de que podemos conhecer a conexão última entre as coisas que surge a tradicional METAFÍSICA DA PRESENÇA, que Heidegger se empenhará.

Uma característica do O SER DO HOMEM, O ESTAR AÍ (da-sein) é INERENTEMENTE SOCIAL.

Ao Estar-Aí pertence inevitavelmente o ESTAR COM.

O SER é um SER PARA O HOMEM e O HOMEM um SER PARA OS OUTROS HOMENS:

EM suma, O SER-DO-HOMEM é um ESTAR-AÍ-COM-OS-OUTROS.

Aqui a categoria mais fundamental é a do CUIDADO.

Objetos de cuidado são não só os UTENSÍLIOS como também os OUTROS SERES HUMANOS. Que são objetos do que ele chama de SOLICITUDE, e a modalidade pela qual vemos essas coisas chama-se CONSIDERAÇÃO.

No entanto, muito mais do que um EU, o sujeito é um SE - o EU INAUTÊNTICO integrado às demandas do social, do "assim se diz, assim se faz".

O EU INAUTÊNTICO é aquele que mantêm DISTÂNCIA face aos outros, que SUPRIME EXCEÇÕES, que NIVELA todas as possibilidades, que OBSCURECE o acesso original às coisas, que ESQUIVA-SE de decisões, que EXONERA-SE de UMA MAIOR RESPONSABILIDADE HUMANA.

Contudo, se considerarmos o ser humano em sua existência, ele abandona seu status de SER-AÍ (Dasein) e como ser-aí que está jogado no mundo e que é inevitavelmente ABERTO PARA O SER.

Como um ESTAR NO MUNDO ele possui LUZ NATURAL, que faz dele uma clereira para o mundo, posto que a sua CONSCIÊNCIA faz com que o mundo seja capaz de abrir-se à sua compreensão, desde sempre possuidora de disposição de ser.

A disposição para ser inerente ao ser-aí se lhe revela como uma desagradável INQUIETAÇÃO, uma RESPONSABILIDADE PARA CONSIGO MESMO, dada pelo fato de que ele não sabe de onde vem nem para onde vai nem para que existe.

Essa condição é chamada por Heidegger de ESTAR JOGADO NO MUNDO.

Essa experiência é muitas vezes chamada de FASTIO (a Náusea de Sartre).

Possuímos essa disposição, essa abertura para a consciência, mas como o homem tem sempre a vontade de DOMINAR e a disposição para AGIR no mundo, ele A FECHA. O homem quer fugir dessa disposição, apesar de o mundo lhe ser sempre em princípio aberto.

DISPOSIÇÃO é o estar a altura das coisas, o compreender, POSSIBILIDADE, o PODER SER. Essa simples possibilidade torna o ser humano LIVRE, por mais inautêntico que ele possa ser.

Inerente à possibilidade está o PROJETO pelo qual o homem pode "tornar-se o que é".

Mas para Heidegger, querer compreender algo é já possuir uma compreensão pré-temática desse algo. Por isso toda a compreensão possui uma ESTRUTURA CIRCULAR.

Por isso a questão do sentido do ser já pressupõe uma compreensão pré-temática do ser; o que ele faz em Ser e Tempo é explicitar essa compreensão pré-temática em uma análise existencial.

Também a LINGUAGEM tem uma origem na abertura para o ser: por ela o ser humano se demonstra como um ser que COMPREENDE e se torna assim DISPONÍVEL PARA O MUNDO.

Mas na existência anônima e banal do SE a linguagem facilmente se degenera em PALAVRÓRIO ("as coisas são assim porque assim se diz"), devora-se na CURIOSIDADE sem direção, e se desvanece na neblica do EQUÍVOCO.

No FALAR SEM FUNDAMENTO perdemos a relação autêntica com aquilo de que falamos e perdemos a capacidade de distinguir a existência autêntica.

2. O Ser para Morte

Mas como se dá a existência autêntica?

Através da EXPERIÊNCIA DA ANGÚSTIA (Angst).

A ANGÚSTIA é o MEDO INDETERMINADO. O medo tem um objeto, a angústia não. O ser-aí se angustia por ver-se só diante do mundo.
Só a angústia é capaz de retirar o homem da queda, de refazê-lo para além de sua dissolução no SOCIAL. Pois o FAMILIAR-SOCIAL é uma EVASÃO INAUTÊNTICA da angústia, uma evasão pela qual nós nos eximimos de nos aceitarmos em nossa inteireza.

O poder potencialmente despertador da angústia já foi tematizado em "A Mrte de Ivan Lyich": Ivan é uma pessoa com pequenas preocupações e egoísmos cotidianos, até que se descobre vítima de uma doença incurável que logo o levará a morte. Nesse novo contexto as pequenas questões cotidianas perdem valor e ele descobre sentimentos essenciais. Morre cuidado por um servo. Outro exemplo é o Dom Quixote, que pouco antes de sua morte recupera a lucidez. Há também Contraponto, de Huxley, que havia perdido a criatividade, repetindo-se, mas a recupera ao saber que tem pouco tempo de vida.

A ANGÚSTIA leva-nos ao seu objeto último, que é a MORTE.

Para Heidegger a morte é UM LIMITE QUE PERPASSA O SER HUMANO, DEFININDO-OE REDEFININDO-O CONSTANTEMENTE. O homem ciente dela e se preocupa permanentemente com ela, conscientemente ou não.

Por isso Heidegger pensa o ser humano como um SER PARA A MORTE.

A morte é indelegável, sem relações, irrepetível, de um lado é certa, mas de outro é indeterminada, pois não sabemos como nem quando ela virá. Geralmente nos relacionamentos de maneira INAUTÊNTICA com a morte, concebendo-a como se ela só existisse para os outros.

O existente autêntico, porém, não irá afastar a morte como pertendendo a um futuro remoto, visto que ela pode acontecer a qualquer momento. Ele irá SUPORTÁ-LA COMO POSSIBILIDADE REAL.

E esse suportar consiste no que Heidegger chama de "corrida premeditada para a morte" que consiste em não descansar sobre a nulidade do cotidiano, nem sobre as vitórias passadas, mas em abrir os olhos para a grandeza de outras existências.

Nesse existir autêntico, a VOZ DA CONSCIÊNCIA produz a CULPABILIDADE EXISTENCIAL do ser humano.

Com essa expressão Heidegger aponta para o fato de que o SER-AÍ NÃO TEM FUNDAMENTO EM SEU PRÓPRIO SER.

O ser humano só se liberta de sua consciência culposa quando CORRE PARA A MORTE na existência autêntica, entrando assim em acordo com sua consciência moral. Heidegger chama isso de DECISÃO: aqui o ideal da existência se encontra no "angustiante lançamento sobre o mais peculiar do ser culpado".

Não é dificil ver que há um certo fundamento na corrida para a morte e na análise heideggeriana da consciência culposa como Incompletude do ser-aí. Possuímos uma potencialidade de transcendência do eu individual na consciência da comunidade humana quando a consciência do limite último de nossa existência na morte nos força à abdicar da existência coletiva no se (man).

É para ser lembrado que Heidegger rompe com a tradição em dois pontos essenciais:

1) Para ele não existe o problema da realidade do mundo externo: ESTAMOS DESDE O INÍCIO NO MUNDO. Trata-se de uma UNIDADE ORIGINÁRIA que rompemos ao construir um SUJEITO ABSTRATO, cartesiano, que depois tenta em vão colar-se ao mundo exterior.

Já para Husserl, como para quase todos os outros epistemólogos modernos esse é um problema fundamental não tão facilmente disponível: como, afinal, a mente conhece aquilo que lhe é essencialmente heetrogêneo, o mundo externo?

OBJEÇÃO:
O problema é que dizer que estamos desde o início no mundo é coisa já sabida que não dissolve o problema.
E mesmo que o sujeito subjetivo seja construído persiste a questão de se saber como ele tem acesso cognitivoo à realidade.
Além disso, se Heidegger tivesse certo, então os filósofos gregos já o teriam antecipado há dois milênios, pois eles simplesmente não tinam o problema epistemológico da percepção de um mundo externo.
Esse problema surgiu dos argumentos da ilusão postos pelos filósofos céticos e pelo argumento da ciência: por que surgiria esse problema senão pela tomada de consciência de complexidade antes desapercebedida?

2) O problema da VERDADE ele analisa pelo problema da ABERTURA: o conhecimento depende de descobrirmos em nós mesmo o que é compreensível no mundo.
E o critério da verdade é a LEGITIMAÇÃO que fazemos de nós mesmos, quando percebemos que o SER se REVELA ao nosso juízo.
Para Heidegger a verdade é ÔNTICA, ela é ibjectual: ela está na ILUMINAÇÃO DO EXISTENTE HUMANO, do ser-aí quando ele SE ABRE PARA O SER.
E seu acesso depende da abertura que sucede à consciência do estar jogado no mundo, da queda. Mas como o homem existe mais frequentemente na existência inautêntica, ele não se encontra costumeiramente aberto á verdade.

OBJEÇÃO:
Contra isso também é possível notar que o problema da verdade praticamente não foi tematizado entre os pré-socráticos.
Platão e Aristóteles foram os primeiros a fazê-lo e o fizeram, como quase todos os filósofos clássicos, como o PROBLEMA DA CORRESPONDÊNCIA do pensamento com o fato.
Em geral dizemos que um OBJETO EXISTENTE (o ente que é) é VERDADEIRO no sentido de que dizemos dele coisas verdadeiras no sentido de que ele é autêntico remetendo asism ao juízo e ao dizer.
Claro, é necessário termos ABERTURA, LIBERDADE, para podermos ter o pensamento das coisas tal como elas realmente são, e foi isso o que Heidegger percebeu. Mas isso não refuta e sim confirma a teoria da correspondência.

3) SER E TEMPO

Qual é, afinal, a relação entre SER e TEMPO?

Ele quer esclarecer o sentido de ser como temporalidade, de modo que o conceito de morte serve para explicar a temporalidade.

Para Heidegger o tempo do existente inautêntico é também ele INAUTÊNTICO, marcado pelo hábito e pelo esquecimento.

Mas quando o homem se lança premeditadamente em direção á morte realizando-se em sua autenticidade, então ele vem ao encontro de si mesmo e vive o TEMPO AUTÊNTICO.

Há aqui uma espécie de dialética:

1. O FUTURO é, na existência autêntica, um VIR DE ENCONTRO A SI MESMO. O existir é possibilidade que se projeta no futuro. O existente humano é enquanto tal futuro.
Mas essa aceitação do futuro eleva a VOZ DA CONSCIÊNCIA , que persuade o homem a aceitar-se com sempre foi em sua nulidade, no seu "ser jogado no mundo" ...
Isso compele o ser-aí a voltar-se para o PASSADO, não como tradição, mas como algo que o faz REVIVER AS POSSIBILIDADES NELE INCORPORADAS. Ele encontra assim o seu (2) verdadeiro PASSADO.

Ou seja: na existência autêntica o ser-aí incopora as POSSIBILIDADES determinadas pelo seu passado histórico-cultural ao presente pelo seu passado histórico-cultural ao presente, de modo que elas possam ser projetadas no futuro de uma maneira totalmente coerente com aquilo que o ser-aí realmente é.

É nessa aceitação do passado orientada pela culpabilidade do ser-aí que é despertada (3) a abertura para o PRESENTE.

O presente é aqui o instante no qual o ser-aí rejeita o presente inautêntico no qual é absorvido pelo se e abraça seu destino. Mesmo que ele continue tendo de viver e trafegar no mundo coletivo do se.

Essa unidade do passado, presente e duturo é o que Heidegger chama de TEMPORALIDADE. Ela é o que há de mais distintivo no CUIDADO.

É só na existência AUTÊNTICA que a temporalidade se realiza plenamente: Em sua tridimensionalidade do passado, presente e futuro.

No existir autêntico o homem assume o seu próprio destino como o destino da própria humanidade.

Isso torna a AUTENTICIDADE e INAUTENTICIDADE MODALIDADES DA TEMPORALIDADE:

1) No existir INAUTÊNTICO, o ser humano não aceita a situação de ESTAR JOGADO, não aceita a CULPABILIDADE, relegando com isso seu passado ao ESQUECIMENTO.
A sua existência é um esperar que-se-torna-presente-e-esquece. Por isso ele se deixa levar de distração em distração, ou na busca de sucesso, do êxito, o seu próprio TEMPO sendo INAUTÊNTICO, de modo que o arco entre o futuro e o passado se contraia ao mínimo.

2) Já no existir AUTÊNTICO desabrochamos no momentâneo, buscando o tornar presente, o ESPERADO.

Estando aberto no tempo, o ser humano se torna consciente do passado e do futuro pelo que eles são...

- Por isso o tempo subjetivo é o tempo originário é QUALITATIVO E FINITO, pois que limitado pelo nascimento e pela morte.
- Já o tempo objetivo, por sua vez, é QUANTITATIVO E INFINITO.

Esse tempo para Heidegger só se produz pelo comércio com o mundo com base no próprio tempo subjetivo, que para ele tem prioridade.

A temporalidade constitui o núcleo mais íntimo do ser humano e para Heidegger a HISTÓRIA DO MUNDO, em sua OBJETIVIDADE, é construída a partir da SUBJETIVIDADE.

Mas de onde tira o ser humano na existência autêntica as POSSIBILIDADES que o fazem seguir com o ser para a morte?

Como a morte em si mesma é um MOMENTO NEGATIVO, o existente humano tira esses possibilidades de uma HERANÇA TRANSMITIDA DO PASSADO DA QUAL SE APROPRIA. Isso é, porém, muito diverso do decidir da existência inautêntica, que recorre a decisões casuais e equívocas, proporcionadas apenas pelo se, pelo CARÁTER PÚBLICO DO MUNDO.

A ESCOLHA DO HEROI é arrancada inequívoca do ser humano em sua existência autêntica para a morte.

Também na historicidade, o modo mais apropriado do ser humano é o FUTURO, e pela análise da temporalidade podemos inferir que quanto mais voltado para o futuro mais ele estatá aberto para o passado. O ser humano autêntico é por isso ALGO QUE SE REPETE.

Mas essa repetição não é um simples trazer à tona do passado, mas uma relação de RECIPROCIDADE na qual o presente provoca o passado a atuar sobre o presente a partir das profundezas da existência.

É, pois, somente na aceitação do 'estar jogado no mundo', e do seu passado é que o ser humano é capaz de produzir a sua HISTORICIDADE PRÓPRIA.
Fernando.Freitas 02/03/2018minha estante
Não sei de onde você retirou a primeira citação, mas o próprio Heidegger nega que o homem seja um ente entre polos nascimento e morte.

Alguns comentários estão na direção correta, mas em sua maioria muito simplório e ambiguamente ligados a conceitos tradicionais. Por exemplo, o seguinte trecho: "Como um ESTAR NO MUNDO ele possui LUZ NATURAL, que faz dele uma clereira para o mundo, posto que a sua CONSCIÊNCIA faz com que o mundo seja capaz de abrir-se à sua compreensão, desde sempre possuidora de disposição de ser."

A consciência faz com que o mundo seja capaz de abrir-se para sua compreensão? Em outro trecho, referindo-se ao existencial da disposição (um ser-em (in-sein)), você diz, muito estranhamente, que "possuímos essa disposição, essa abertura para a consciência". Sabe o que eu vejo? Você tem uma boa visão para a fenomenologia, e se deteve consideravelmente nos escritos de Heidegger. Mas acho que a fenomenologia husserliana ainda se lhe interpõe na sua interpretação de Ser e tempo.

Ademais, vou criticar pontualmente suas duas objeções, referentes ao problema do mundo externo e à noção de verdade.

Quanto a objeção à noção de verdade de Heidegger, você diz que ela não refuta a teoria da correspondência. Ora, o próprio Heidegger em Ser e tempo (§ 44) afirma que não pretende refutá-la, e sim que se trata de um conceito derivado, ou seja, o conceito existencial de verdade é apenas mais fundamental.

Quanto à objeção referente ao mundo externo, você afirma que mesmo se considerarmos que "estamos desde o início no mundo é coisa já sabida que não dissolve o problema". Lembre-se que não se trata de "saber". Considerando o que você mesmo disse anteriormente, trata-se de uma "unidade originária", ou seja, o ser e estar-junto ao ente é um caractere existencial do ser-aí.

A "realidade" enquanto âmbito externo tem seu fundamento na descoberta da coisa. A coisa, mesmo em sua mera subsistência, só é possível de ser descoberta através do uso, isto é, tem sua "condição de possibilidade" na manualidade do ente intramundano, o qual, por sua vez, funda-se na mundanidade. Assim, o problema da realidade externa não se dissolve, porque mais precisamente, ele é um problema impossível e sem sentido, que só chega a ser elaborado em uma visão tardia, que passa por cima da mundanidade e, sobretudo, da unidade transcendental expressa na estrutura de ser-no-mundo.

Espero que essas considerações lhe sejam úteis. Valeu!


Douglas 11/08/2021minha estante
Excelente explicação


caio.lobo. 19/02/2024minha estante
Agora penso em algo: Dasein como ser-aí ou estar-aí? Pois o alemão não tem essa beleza do português que difere ser e estar, no alemão é tudo Sein. Então o que a filosofia ocidental é "ser" na verdade é ente e o que "estar" é ser. A existência seria a verdadeira essência, então estar-aí e não ser-aí.
Outra coisa seria em vez de traduzir o Dasein como ser-aí, o correto deveria ser aí-ser, pois antes está o aí, o lugar espacial e histórico e depois a existência.




Jeciana 12/07/2012

Esse é o tipo de livro que eu nunca vou considerar totalmente lido, porque não se é pra ler, é pra estudar, que implica estar sempre revendo coisas já lidas...
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Marco Rodrigues 24/05/2011

A relevância do livro...
Considero fascinante a maneira que Heidegger nos conduz inquirir acerca de uma possível "Ontologia Fundamental". Este pensador realiza um importante processo de desconstrução de conceitos vulgares e desgastados pela tradição. Por outro lado, é preciso admitir a incipiência de seu projeto, uma vez que, sem uma compreensão apropriada da analítica existencial do dasein, a questão do ser, nesta obra sem par, torna-se vazia.
Que é, realmente, este dasein? Poder-se-ai dizer que este possui corpo, vida? Ou se trata de um espectro sem rosto? Sereno? Quiçá os últimos escritos desse autor resolvam esse problema, ao se considerar que a saída poética deva engendrar o revelar, ainda que ao mesmo tempo velando, da existência em suas possibilidades de ser...
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Enock Araújo 04/03/2011

Ser e Tempo
Talvez este seja mesmo o mais importante livro de M> Heidegger. Difícil de ler? Sim, mas nem tanto. É preciso desfazer-se de conceitos pre-formulados, é abrir-se a uma compreensão mais ampla da existência. Vale a pena tentar. Vale a pena penetrar na filosofia heideggeriana. .
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Moura 28/09/2010

É fenomenal!!! Muito complexo, é verdade, e acredito que para entendê-lo será necessário algum esforço, pois uma das coisas que não encontrei aqui foram obviedades. É muito bom mesmo. Quero ler este livro totalmente, e usufruir ao máximo do pensamento heideggeriano. Claro que discordo do Heidegger quando o assunto é a religião, todavia não o torno desprezível por isso.
Oliver 24/12/2010minha estante
Acho que alguém não iniciado na fenomenologia heideggeriana, seria bom ler Ser e Tempo junto com um livro chamado "Introdução à leitura de Ser e Tempo de Martin Heidegger". Nesse livro de introdução o autor vai parágrafo por parágrafo elucidando o que Heidegger quer dizer... Ser e Tempo é um livro extremamente complicado; para ser compreendido é preciso ou aulas sobre o livro, ou o auxílio de um livro de introdução: não gaste dinheiro a toa (Ser e Tempo é um livro caro)




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