Assim começa o mal

Assim começa o mal Javier Marías




Resenhas - Assim Começa o Mal


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arthur966 29/06/2023

Eu fui este? eu fiz isto? meu antigo eu era tão feio? se é assim, não posso alterá-lo. a culpa é mais forte que meu desejo de me emendar, a culpa não impede de tentá-lo, e a única coisa a que posso aspirar é a que essa culpa tenha passado, a que seja tão velha que só lhe caiba se perder nas névoas em que se desfaz o que desde sempre aconteceu. [...] tudo destinado à confusão e à mistura, ao nivelamento e ao esquecimento e ao flutuar num repetitivo magma do qual, no entanto, ninguém se cansa, ou vai ver que nenhum de nós achou o caminho para se desprender.
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Sessim Jorge 15/11/2022

Razoável, no máximo...
O problema de se ler um livro é a expectativa criada. O ideal seria não esperar nada de nenhum. "Coração Tão Branco", do mesmo autor, é um dos livros que recomendo a todo amigo, pois é realmente excepcional. É aí que começa o problema, já que "Assim Começa o Mal" se torna um livro no máximo razoável. O autor passa a impressão de já ter dado tudo de si antes, e de agora se esforçar pra tirar suco de uma laranja já muito espremida. Outro problema que me deu birra desse livro é que o li após "O Som e a Fúria", de Willian Faulkner. Foi como descer do céu ao purgatório em queda livre.
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Caioboeira 01/07/2021

Prosa Sublime
Fui ler Javier Marías por conta de alguma indicação, não me lembro onde ou de quem, mas lembro que a indicação era sobre a ótima escrita que o escritor coloca em seus livros.
Assim Começa o Mal não é um livro cheio de reviravoltas ou frenético, mas sua prosa é tão agradável e o tema tão angustiante e absurdo que sua leitura acaba sendo fluída e gostosa. Nos sentimos estranhamente familiarizados com a Espanha pós franquista, como se estivéssemos vivendo as mesmas agouras que Juan de Vere.

Definitivamente um autor e um livro que vale a pena conhecer.
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Alê | @alexandrejjr 12/09/2020

O cinema literário

A leitura de um livro de Javier Marías dificilmente será perda de tempo. Este espanhol que, para meu gosto, é um dos maiores escritores vivos, sabe como fazer literatura. Alta literatura, é preciso frisar. Claro que isso pode implicar em algumas dificuldades para um ou outro leitor, mas nada que preocupe, basta ter paciência - e paciência é uma exigência da qual o autor não abre mão.

Em “Assim começa o mal”, no entanto, a sensação de prazer indescritível em ler Marías não se repetiu conforme eu esperava. Aqui aparecem, mais uma vez, as clássicas obsessões do espanhol como o peso do segredo, a impossibilidade de conhecer verdadeiramente os outros e a si mesmo, as digressões filosóficas sobre as relações a dois e, como não poderia faltar, uma trama cinematográfica. E é neste último ponto que pretendo analisar o romance. O cinema aqui tem propositadamente um peso maior em relação aos seus outros dois livros que li, o memorável “Coração tão branco” e o ótimo “Os enamoramentos”, mas é um peso que talvez a obra não tenha conseguido sustentar sozinha. Explico na sequência.

Pretensos cinéfilos como eu vão encontrar em “Assim começa o mal” demasiados ecos de Hitchcock e Almodóvar - o que está longe de ser ruim, é preciso dizer, mas atrapalham a experiência. Talvez se você que lê este singelo texto já assistiu a “Um corpo que cai” do mestre do suspense e “Tudo sobre minha mãe” da estrela espanhola irá entender melhor o que digo quando ler o livro, do contrário, ignore esta frase.

No livro, Juan de Vere, nosso protagonista, passa, conta e pensa sobre situações que em muito se assemelham às narrativas das películas citadas, ainda que em seu cerne ofereça particularidades interessantes, como o panorama político e social da Espanha pós-ditadura franquista, tema tratado com muita lucidez e que não havia sido abordado com maior profundidade nos outros livros que eu conhecia.

As altas expectativas podem nos agarrar de tal maneira que, às vezes, podem se tornar difíceis de se desvencilhar. Talvez esse tenha sido o meu caso. Para um livro de 520 páginas o resultado final, apesar de satisfatório, foi um pouco enfadonho, pois a mesmíssima história poderia ter sido contada em tranquilas trezentas e poucas páginas. Nem mesmo as referências aos grandes diretores e à Shakespeare, que dá o título do livro, ou ainda a eletrizante parte final elevaram a experiência. Paradoxalmente, “Assim começa o mal” é um dos livros mais acessíveis de Marías, devido à busca pela concisão de suas digressões e pela opção de capítulos curtos não numerados. Apesar disso, sigo acreditando que “Coração tão branco” é a grande obra para ganhar novos leitores. Para fãs do autor, é uma obra menor na prateleira. Para quem pretende desbravar o eterno candidato ao Nobel de Literatura, talvez seja uma boa pedida para fugir do estilo padronizado das narrativas atuais e melhor ainda se quem estiver lendo não conhecer nada ou muito pouco das obras de Hitchcock ou de Almodóvar, pois ao chegar na última página é provável que tenha vontade de voltar à primeira, agora com a nova perspectiva adquirida com o que acabou de ler.
caroline 23/05/2021minha estante
sua propaganda gratuita do Javier está começando a me deixar com vontade de ler algo dele ??


Alê | @alexandrejjr 23/05/2021minha estante
Olha, Caroline, dessa vez eu não posso negar: eu quero que o maior número possível de pessoas conheça os livros dele, principalmente o maravilhoso "Coração tão branco". Eu acho que ele tem poucos leitores no Brasil, muito menos do que ele realmente merece...


caroline 23/05/2021minha estante
coloquei na minha lista de desejos da Amazon!


Dan 24/06/2022minha estante
Você acredita que quem não assistiu aos filmes de Almodóvar e Hitchcock, ou assistiu a poucos, não compreenderão bem a obra? Melhor dizendo, isso prejudicaria a leitura?


Alê | @alexandrejjr 26/06/2022minha estante
Oi, Jordan. Agradeço o comentário! E a resposta é... não. Não é preciso ver os filmes pra acompanhar a história do Marías. É que a atmosfera criada pelo autor é muito parecida com a característica que esses dois diretores impõem em seus filmes.


Dan 26/06/2022minha estante
Obrigado por responder!




Camila Faria 18/05/2016

Na Madri pós-ditatura franquista (no início dos anos 1980) o jovem Juan de Vere é contratado como secretário particular do cineasta Eduardo Muriel e começa a conviver na intimidade de sua família. Passa então a observar de (muito) perto a união misteriosa e bastante infeliz do chefe com a esposa Beatriz, ao mesmo tempo que investiga um de seus amigos, cujo comportamento indecente no passado levanta suspeitas e é motivo de rumores. Ler esse romance, que tem o desejo como um dos temas principais, é entender porque Marías é considerado um dos maiores escritores vivos. Como escreve bem esse espanhol ~ com frases longuíssimas e digressões que só enriquecem o universo da narrativa; uma mistura de Saramago com Proust (que beleza!). Fiquei impressionadíssima.

site: http://naomemandeflores.com/os-quatro-ultimos-livros-8/
Paty 17/05/2017minha estante
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Alexandre Kovacs / Mundo de K 30/11/2015

Javier Marías - Assim começa o mal
Editora Companhia das Letras - 520 páginas - tradução de Eduardo Brandão - Lançamento no Brasil em 29/09/2015.

Javier Marías está de volta com a sua prosa caudalosa e as deliciosas e longas frases que se ramificam em múltiplas digressões, estilo que me faz lembrar do saudoso José Saramago. Este romance é ambientado na Madri dos anos oitenta, após a longa era de 36 anos do "Generalíssimo" Franco no poder, período que ficou conhecido na história como ditadura franquista, iniciado em 1939, no fim da Guerra Civil, até a sua morte em 1975. Um período total de 36 anos, portanto, que deixou marcas profundas na sociedade espanhola e provocou um fenômeno típico nos governos de redemocratização (que conhecemos muito bem), a convivência tácita entre as vítimas e os carrascos do antigo regime, sendo que, em alguns casos, os lobos se transformam em cordeiros e o medo de novas arbitrariedades faz com que as testemuhas se calem.

"Naqueles dias, naqueles anos, começava-se a contar em particular coisas distantes que muitos espanhóis tinham se visto obrigados a calar em público por décadas a fio e mal haviam sussurrado de quando em quando em família, e com intervalos de silêncio cada vez maiores, como se além de mantê-las proibidas as houvessem procurado confinar na esfera dos pesadelos, e que assim se perdessem na tolerável bruma do que poderia ou não ter ocorrido. Isso acontece com o que envergonha, com as humilhações sofridas e com os acatamentos impostos. Ninguém gostava de rememorar que tinha sido vencido ou que tinha sido uma vítima, que foram cometidas injustiças ou atos de crueldade com ele e com os seus, que tivera de se render e ser reconhecido pela outra parte para sobreviver, que tinha delatado companheiros para obter as graças do novo poder sanhudo e perseguidor incansável dos derrotados, ou que tinha sido enterrado em vida tratando de chamar o mínimo possível a atenção, que havia levado uma existência acovardada e submissa e tinha se dobrado às exigências dementes do regime vencedor; que, apesar do dano causado, na sua própria pele ou na de seus pais ou irmãos, havia tentado abraçá-lo, exaltá-lo, fazer parte de suas estruturas e medrar sob seu escudo. Hoje se contam numerosas histórias fictícias de irremíveis e de resistentes passivos ou ativos, mas o certo é que a maioria dos verdadeiros — não muitos, e não duraram — foi fuzilada ou encarcerada nos primeiros anos depois da guerra, ou se exilou, ou foi expurgada e sofreu represálias e foi impedida de exercer suas profissões: houve homens de idade ou maduros que passaram o resto dos dias vendo como suas viúvas e filhas saíam para buscar o que comer — suas mulheres já como viúvas —, enquanto eles, mal barbeados, pré-cadavéricos — engenheiros, médicos, advogados, arquitetos, catedráticos, cientistas, um ou outro militar leal que se salvou —, olhavam pela janela e se esforçavam para não pensar. Ao cabo de pouco tempo o grosso da população foi entusiasticamente franquista, ou o foi mansamente, por temor. Muitos dos que haviam detestado e padecido suas forças foram se convencendo de que era melhor assim e de que tinham vivido e inclusive combatido no erro. Nunca se viu tanta virada de casaca, uma virada maciça. A Guerra Civil terminou em 1939 e, diga-se o que for agora, nem nos anos 40 nem nos 50, nem por conseguinte nos 60 mais brandos, nem quase tampouconos 70 até a morte do ditador, as pessoas ansiavam por contar sua versão, quero dizer, a que teriam sido impedidas de contar." (pág. 36)

Na época em que ocorre a narrativa deste romance, Madri passa por uma fase libertária pós-ditadura, e o protagonista Juan de Vere, com apenas vinte e três anos, é contratado para exercer a função de secretário particular de Eduardo Muriel, um conceituado diretor de cinema, passando a conviver intimamente com a sua família. Tanta intimidade faz com que o jovem Juan de Vere presencie o infeliz cotidiano de seu patrão com a esposa Beatriz Noguera que é desprezada e humilhada sem motivos aparentes. Apesar do casal manter as aparências da união socialmente, na realidade vivem uma irremediável separação. Também como decorrência da crescente proximidade com seu empregador, Eduardo Muriel, este o encarrega de investigar um antigo amigo, o dr. Jorge Van Vechten, conhecido por ter tido uma carreira rápida e bem sucedida durante o regime franquista. Javier Marías consegue manter o segredo que envolve os personagens até o final do romance, mas o leitor logo percebe que a chave para o entender o presente está relacionada com fatos ocorridos durante o período negro da história espanhola que todos procuram esquecer, em grande parte por não conseguirem perdoar. O autor comenta nesta entrevista, sobre a importância do perdão e explica que muitas vezes ele próprio fica em dúvida se o melhor seria avançar e esquecer o passado ou recordar permanentemente os agravos e crimes. No trecho abaixo, uma descrição da atmosfera dos anos oitenta e a negativa dos antigos representantes do regime em "prestar contas" para a sociedade.

"Agora as coisas haviam mudado um pouco nesse sentido, no de contar; não muito, na realidade. Governava Adolfo Suárez, o primeiro presidente saído de eleições depois de um período de quarenta anos, Franco estava morto havia quatro ou cinco anos. Por um lado, logo havia sido desprezado e visto como um ser antediluviano, aos seis meses a gente mais dada a refletir ficava pasma com que tivesse transcorrido tão pouco tempo, porque se tinha a sensação de que seu desaparecimento havia sido há séculos. Não era apenas uma parte do país que a tinha ansiado e esperado e antecipado tanto, e que em muitos aspectos — nos possíveis — a sociedade havia começado a atuar desde muito antes como se já tivesse ocorrido, mas que com incrível velocidade se fez patente, até para seus partidários, o clamoroso anacronismo que era e o quanto sobravam ele, sua ditadura e sua Igreja, à qual havia entregado poder e benefícios ilimitados. Por outro lado, no entanto, sabia-se que seu regime tinha se retirado de maneira inverossímil sem reclamar (na época se disse que havia feito haraquiri), obedecendo à vontade do rei, e que por isso a democracia nos havia sido outorgada (...) Uma das condições para aquela outorga e aquele haraquiri tão surpreendentestinha sido, numa frase: "Ninguém peça a ninguém para prestar contas". Nem dos já muito distantes desmandos e crimes da guerra, cometidos por ambos os lados no front e na retaguarda, nem dos infinitamente mais próximos da ditadura, cometidos por um só em sua imensa retaguarda punitiva e rancorosa ao longo de trinta e seis anos de carta branca para seus esbirros e de mortificação e silêncio para os demais." (págs. 39 e 40)

Ficção se confunde com realidade e o cinema, como em outros livros do autor, é um dos elementos presentes na narrativa, desta vez com a inserção de atores reais (geralmente de obscuras produções do tipo "classe B") na trama do romance, tais como Jack Palance, Shirley Eaton e Herbert Lom em uma homenagem clara de Javier Marías à sétima arte. Algumas cenas do romance são antológicas e demonstram, de certa forma, o gosto cinéfilo de Marías, principalmente naquelas passagens em que De Vere "espiona" os demais personagens e, por exemplo, passa a seguir por conta própria a esposa de seu patrão em uma espiral crescente de desejo, passando de observador passivo a agente dos acontecimentos.

"Assim começa o mal" não é o melhor romance de Marías, mas foi escolhido pelos críticos do caderno literário Babelia do jornal El País como o melhor livro lançado na Espanha (prosa e poesia) em 2014, o que não é pouca coisa, e certamente ficará marcado como um dos melhores lançamentos traduzidos no Brasil em 2015. A capa da edição brasileira, produzida por Raul Loureiro, foi um acerto em cheio da Companhia das Letras, a imagem de uma pintura de Tamara de Lempicka é elegante e sensual, como o estilo de Javier Marías.
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