Lucy 17/03/2021
Stephen King decepciona sim... E como!
Revival começou do jeito que eu gosto: com a marca e assinatura do Steve. Os capítulos envolvendo a infância de Jamie, sua bela família e o Reverendo Charles Jacobs foram deliciosos de se ler. Eu me sensibilizei com o que aconteceu a Jacobs, e não conseguia compreender exatamente como esse personagem seria o "nêmeses" do nosso protagonista. Então avançamos para a adolescência de Jamie. E aí a história começa a dar uma grande esfriada. Até irmos para sua vida adulta como guitarrista nada excepcional e viciado, quando gela de vez.
Não há absolutamente nada de interessante em Jamie e sua trajetória de vida. Ele nunca foi especial em nada que fez, não tem o mínimo de carisma, além de ser muito apático a todo instante. Não existe uma grande motivação para continuarmos lendo sobre ele, e Charles, seu "quinto personagem", aparece muito esporadicamente. Eu não dava a mínima para Jamie, mas queria ter mais de Jacobs, além de que estava lendo uma obra de Stephen King, ora! Não podia ser tão ruim! Então prossegui.
Com exceção da infância de Jamie, nada é aproveitável. Seu ódio por Charles não faz sentido e soa gratuito na maior parte do tempo. A denominação de Charles como um "vilão" soou demasiada e muito abrupta. Charles podia não ser nenhum inocente, mas, no decorrer de anos, ele nunca demonstrou ser o monstro que Jamie idealizava e do qual acabamos nos deparando em sua velhice. Por mais errada que tenha sido suas atitudes, consegui me solidarizar mais com ele e sua jornada do que com a do protagonista. A vida de Jamie depois de se curar do vício é um porre sem tamanho. Não me recordo e nem me importo com o nome do seu chefe e sua colega de trabalho. E seu caso fortuito com Bree, a linda jovem negra com metade de sua idade? E vamos de mais uma trama chata e desnecessária. Além de um tanto irreal, sinceramente. Mais de 80% do livro é puro tédio.
Revival, inicialmente, me lembrou muito Joyland (que chega a ser citada aqui), A Zona Morta e Doutor Sono. Ambos têm em comum o fato de a história girar em torno da vida e do desenvolvimento de seus personagens. Nós os conhecemos intimamente e nos importamos com eles e as pessoas que cruzam seus caminhos. Porém, Revival não tem o que esses livros têm: personagens carismáticos e interessantes e uma história acontecendo. Mesmo Doutor Sono, que mostra Dan tendo uma vida muito modesta e parada após largar seu vício (é exatamente a mesma coisa que vemos aqui), tem tramas acontecendo em paralelo. Temos o POV dos vilões, conhecemos seu modus operandi, suas motivações. Temos também a história da outra garota iluminada. Sem contar na iluminação do próprio Dan e toda a bagagem que ele carrega por conta dela. Mas Jamie não tem nada e o livro todo é em seu ponto de vista, o que faz Charles ser um vilão muito superficial, e o os outros personagens terem nenhum desenvolvimento. Nem o próprio protagonista é desenvolvido. É só um monte de nada com coisa alguma por páginas e mais páginas.
Mas "alguma coisa aconteceu". E eu queria saber o que era. Queria saber qual o rumo que essa história sem graça iria tomar. Quais eram os reais planos de Jacobs. Então chegamos à "grande" revelação. Naquele que foi considerado por muitos "o final mais assustador já escrito pelo mestre". De fato, foi bem assustador. É assustador o fato de que nem quando o Steve vivia louco nas drogas escreveria um final tão viajado. Era tanta viajada, no pior sentido da palavra, que só me fez ficar de queixo caído, me sentindo a maior otária do mundo por ler algo tão absurdo e ridículo quanto isso. Rose Madder já havia me incomodado com tanta fantasia sobrenatural escrita de maneira pouco crível e bagunçada. Mas aqui foi pura ofensa. Formigas?! Sério?!? Mano! Eu demorei esse tempo todo para isso? Para o final mais niilista e enfadonho que já li desse cara. Era para eu me importar com o que aconteceu a esses personagens? Era para eu sentir pena de alguém? Era para eu me importar com a primeira vez de Jamie com a Astrid que ele insiste em falar o tempo todo? Cara, a minha primeira vez foi muito mais memorável (por falta de palavra melhor) que a sua, e eu não penso nela com tanta frequência. Qual o sentido disso tudo? Qual é exatamente a ligação entre isso e a "eletricidade secreta"? Eletricidade que era a menina dos olhos de Jacobs, mas que sabemos muito pouco sobre, já que Jamie também sabe pouco sobre ela.
Não preciso dizer que Revival foi pura decepção. Começou de maneira tão promissora, saiu dos trilhos em menos da metade do livro e descarrilhou completamente em seu final, que apenas posso definir como patético. Se nunca leu SK, faça um favor a si mesmo e pule esse engodo.