breno_evange 03/12/2023
Publicado originalmente em 2011, o livro Short movies, de Gonçalo M. Tavares, traz uma coletânea de pequenas histórias, que vão nos apresentando o que parecem ser cenas cotidianas, até o momento que nos é mostrado algum elemento de maldade ou violência.
Essas pequenas histórias não são vistas como contos pelo autor, ele as coloca mais como curtas ( daí o nome Short movies, ou pequenos filmes, numa tradução literal), a medida que vamos lendo, fica evidente o motivo dessa denominação, cada “curta” carrega elementos cinematográficos, seja no modo como as cenas são descritas, ou nas vezes em que o próprio narrador parece, assim como nós, não estar vendo por completo cena, como se ele estivesse vendo somente o que a “câmera” está focando, como por exemplo no trecho de “Um braço, várias mulheres”: “E a cruz vai e vem e só um braço masculino aparece no plano” (Tavares, 2015, loc. 145).
Outro elemento que perpassa todos os 69 “curtas” é a indiferença com que as situações terríveis, presentes em todas essas pequenas narrativas, são tratadas pelos personagens e pelo narrador. Esses momentos são sempre descritos de forma direta, rápida, como detalhes sem importância, dando a essas situações um ar cotidiano, algo comum e não digno de atenção, como no “curta” “O Importante”, em que um menino se coloca em pose para uma foto enquanto há um incêndio enorme atrás dele.
Essa banalização do terrível serve para nos causar uma quebra de expectativa a medida que lemos as narrativas, o que torna a leitura cansativa, a medida que se vai passando pelos pequenos filmes, o efeito surpresa se perde, você passa a já esperar por esse momento, os tornando somente narrativas de situações aparentemente normais com momentos terríveis ( as vezes nem tão terríveis assim) completamente destoantes. Esse esforço para demonstrar a indiferença dos personagens/narrador faz com que o próprio leitor se torne indiferente e tão pouco se importe tanto com a narrativa ou com o momento que deveria ser o clímax da história.
Tavares consegue fazer uma boa relação da linguagem cinematográfica com a linguagem escrita, e consegue muitas vezes nos trazer esse desconforto, ou choque, no modo como seus personagens se comportam, ou no contexto e informações que ele nos dá da cena, como no pequeno filme “o Piano”, que abre o livro. Porém, muitas ele não consegue nos apresentar algum momento realmente terrível ou interessante, fazendo com que alguns “curtas”, como “O crescimento dos animais”, seja completamente desinteressante, e passe como somente mais uma descrição de cena aleatória.
Com pontos fortes e fracos, a leitura de Short movies se vê melhor aproveitada quando feita aos poucos, lendo espaçadamente um pequeno filme por vez, para que não se torne tão repetitivo e para que o elemento de surpresa, choque ou desconforto seja mantido. Ainda que com seus pontos fracos, o livro é uma ótima demonstração de como a busca de Tavares por diferentes formas de se narrar histórias dá resultado, trazendo uma obra que se diferencia, muitas vezes de forma positiva, de outras obras do gênero, fazendo de Short movies uma escolha interessante para quem quer conhecer o autor.