Nana Barcellos | @cantocultzineo 09/11/2017
Para todas as garotas que cresceram...
"Por favor, nunca leia isto, a não ser que eu já tenha morrido e, mesmo assim, não antes de vinte e cinco anos (ou mais) e partir de agora."
A permissão foi concedida - epa tenho vinte e oito anos - então, pude xeretar os fatos da adolescência de Minnie, tranquilamente. Ha! Bom, meu primeiro contato com essa história, foi com a adaptação indie lançada em 2015, protagonizada por Bel Powley - que está maravilhosa interpretando a Minnie -, Kristen Wiig e o mozi Alexander Skarsgård. Fiquei entorpecida com toda trajetória da Minnie porque enquanto eu assistia, foi como passasse um filme na mente, de coisas proibidas e impulsos que cometi durante a adolescência. Mesmo não fazendo algumas das coisas citadas aqui, eu conheci quem fez e por vivenciar bem de perto, acabou se tornando parte de mim, da minha história.
Diário de Uma Garota Normal é um livro adolescente para gente grande. As descobertas de Minnie se moldam em São Francisco na Califórnia, nos anos setenta. Iniciando seu diário, ainda com quinze anos - quase dezesseis -, ela nos relata sobre sua recente atração por Monroe, após uma noite bêbados em que ele a assedia e isso a deixa sexualmente curiosa. E então, ela não pretende manter em segredo para o mesmo que deseja transar com ele. Monroe é mais velho que Minnie e, namorado da mãe dela. Porém, o livro não é sobre o relacionamento entre eles, mas sim sobre como esse relacionamento abre a mente de Minnie para um mundo cheio de altos e baixos, até o amadurecimento.
Após perder a virgindade, Minnie se sente mais autoconfiante e isso gera novas atrações, amizades e aventuras em sua vida. Ela que não não valoriza suas qualidades físicas, agora interessa garotos populares, é convidada para festas e decide entrar de cabeça nesse novo mundo. É nítido como essa confiança se esvai em todos os momentos em que está com sua dita, melhor amiga, Kimmie. Sabe aquela amiga da adolescência que adorava ficar medindo feitos com você? Essa é a Kimmie. Quando Minnie conta que está com Monroe e perdeu a virgindade, Kimmie a cada hora surge com uma nova aventura sexual ou um conto mais cool e até demonstra interesse por Monroe também. A protagonista confessa que "não tá a fim de lidar com ela" ou coisas o tipo, em vários momentos da narrativa. Kimmie me lembrou demais uma amiguinha que eu tinha nessa fase. Além dela, Minnie também é amiga de Chuck, um rapaz com quem sempre frequenta shows, e nessas saídas com ele, é quando ela conhece Tabatha.
Tabatha é quem trás o resto do caos para a vida de Minnie. Apesar de gostar de Monroe, ela nunca se prende ao relacionamento - o tornando exclusivo - porque, é aquela coisa da fase, de querer viver tudo de uma vez. Quando ela conhece Tabatha, as coisas já não andam tão boas para os dois e Minnie, mesmo com avisos de alguns amigos, se joga de cabeça nesse novo relacionamento. O problema é que Tabatha é viciada e acaba introduzindo Minnie a esse mundo. Ela já convivia com drogas em casa, com as pessoas que a mãe recebia para festas. Mas, a situação se torna cada vez mais pesada e no fim, só depende de Minnie se libertar e escolher o caminho que seguir.
A vida escolar é um dos pontos mais atingidos com todas essas novas descobertas. Seu rendimento desmorona cada vez mais e acaba expulsa de algumas escolas. Apesar de ter sempre seu padrasto Pascal - ex da mãe que ela e a irmã consideram como figura paternal - a incentivando, lhe enviando cartas e demonstrando interesse por seu futuro, Minnie tem outros planos: ela deseja investir em seus desenhos e histórias. Ela é muito cultural, criativa, desenha, monta quadrinhos, escreve poemas e quando quer desabafar, escreve cartas em seu próprio diário. Em vários momentos da narrativa, dá vontade de sentar e trocar uma ideia com ela.
"Não podemos esperar ter uma relação tão perfeita com um ser humano. Seria pedir demais. Os seres humanos são naturalmente egoístas e não podem sacrificar por completo seu orgulho e seu ego e dar todo o seu coração e sua alma a outro ser humano."
É visível o quanto Phoebe Gloeckner se colocou na personagem nesse coming-of-age. Pesquisando sobre ela, a gente encontra várias coisas em comum com Minnie, como a mãe que trabalhava numa biblioteca e alguns fatos sobre a época que se mudaram para São Francisco. Ela define suas histórias como semi-biográficas. Phoebe, que também é cartunista, constrói uma narrativa polêmica e madura. Um universo real e livre de clichês que em alguns momentos, nos deixam chocados e/ou incomodam. É uma leitura que realmente de tira da zona de conforto.
Nenhum personagem nesse livro é perfeito - talvez o gatinho Domino e a irmã mais nova -, todos têm suas qualidades e defeitos, e essa dualidade, deixa toda narrativa ainda mais interessante, pois é difícil saber qual será o próximo passo ou decisão de Minnie e os que a rodeiam. Posso citar Charlotte, a mãe de Minnie, que óbvio, ficamos ansiosos por sua reação ao descobrir o que a filha anda aprontando e a autora, nos deixa várias dicas, pelo comportamento dela e o passado da personagem. E não posso deixar de comentar sobre a quantidade de personagens masculinos que interagem com Minnie - de maneira positiva e negativa - e que toda mulher, certamente, irá reconhecer uma parte do comportamento de cada um deles, com os que já conheceu ou conhece.
O enredo é cheio de referências musicais, poéticas, dentre outras coisas que estavam super em alta na época. O que eu gostei mesmo, foi o alvoroço com Rocky Horror Picture Show - que estreou em 1975 - e fiquei imaginando os adolescentes da época, fantasiados e surtados com a produção. Apesar que, a autora nos leva a uma parte difícil, usando o encontro de fãs - é quando Minnie conhece Tabatha - e parece que o lugar não era tão bem visto.
A edição está incrível! Você se sente, realmente, lendo um diário e as páginas repletas de ilustrações, só acrescentam ainda mais. Os quadrinhos de Minnie estão por toda parte - alguns mais adultos - de tom erótico, e bem inteligentes. Gostei muito da ilustração da protagonista, com traços rústicos, sem idealização de perfeição. Trabalho lindo com a capa e arte, de uma das ilustrações que compõe o livro.
"Eu nunca soube o que é ter alguém que realmente me amasse. Ter alguém que me ame é o que eu sempre quis, acho, alguém que me ame aconteça o que acontecer e que me deixe saber, disso, alguém que eu poderia amar...Eu gostaria de saber como receber amor livremente."
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