ANDER CELES 24/09/2023
Desses livros que usam um título que nada dizem da história
Qual é a primeira expectativa quando vc lê um livro com esse título e com a premissa de que a menina segue um "coelho" através de um buraco? Que pelo menos a obra original irá influenciar muitas coisas por aqui, não é? Pois é...desse título do Brasil, só "armadilha" tem um sentido, não o que a editora queria, com certeza, mas outro. Porque esse livro é uma verdadeira armadilha para quem pensa que vai ser algum tipo de releitura da obra original. Não tem nada a ver. Poderia se chamar qualquer coisa, que não faria sentido.
Dito isso, a premissa da história até é legal. Um mundo pós apocalíptico (eu adoro), um monte de mortos vivos, poucas cidades restaram e uma conspiração e inversão de papéis sobre quem é o vilão aqui nesse mundo, já que, logo no começo da leitura, fica claro que os mortos-vivos não são o problema aqui, mas os humanos. Beleza, isso é legal, né? Se desenvolvido direito.
Por exemplo, a gente tem aqui uma personagem que poderia ser muuuito bem trabalhada, a Rainha. Ela é a personagem, de longe, mais interessante. Mas é tão mal aproveitada. É uma pena. Acho que no terceiro livro da série, é focado nela. Pena que não lerei...
Falando sobre personagens, vamos pra protagonista. Ela até começa sendo uma personagem interessante, apesar de terem escolhido uma menina branca, de cabelos louros, pra ser protagonista na Índia. Gente, por qual motivo isso foi decidido? Por que não uma indiana? Aí vc pode falar que é pq na capa do livro da Rainha tinha uma Alice loura. Desculpa, mas a versão que eu tenho de Alice no País das Maravilhas é de uma menina de cabelos pretos. Então, não seria obrigatório que fosse desse jeito. Na verdade, só uma desculpa pra colocar uma branca no papel de protagonista quando isso não faz sentido nenhum. Mas ao longo da história, fui achando ela tão chata. Ela é uma menina de 15 anos que, de repente, tá organizando uma resistência contra um governo armado até os dentes. Claro que muita coisa dá errado (isso pelo menos é plausível), mas ela simplesmente vai. E acho ela tão sem sal. Os outros personagens seguem na mesma, tão plásticos, tão artificiais.
Pegando carona no fato da protagonista ser uma branca na Índia, no livro o "inimigo" é ninguém mais, ninguém menos que o governo chinês. Eu me senti desconfortável em alguns momentos, porque o livro trabalha com essa ideia de que o governo chinês faria de tudo (inclusive lançar um vírus mortal pelo mundo) só pra prejudicar os Estados Unidos. Sabe, esse negócio de transformar um país, que já é muitas vezes vítima de teoria da conspiração, em vilão nesse livro, não me passa uma mensagem muito boa. Beira, só beira, a xenofobia.
Até um momento da história, eu até tava me entretendo, quando a narrativa ficava em diálogos sobre o que tinha acontecido, sobre esse novo mundo. Mas a partir de um momento ficou só cena de ação, e não muito bem escrita. E cenas meio previsíveis. Então é isso. Acho que poderiam ter usado muitas referências sobre a obra original, ter focado mais nos personagens e menos em cenas de ação que aconteciam muitas vezes e sem ajudar na construção da história.