Sociedade do cansaço

Sociedade do cansaço Han B.C.
Byung-Chul Han




Resenhas - Sociedade do Cansaço


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Gustavo.Romero 09/11/2018

Perspicaz
Para apresentar o livro por seu ponto mais forte, recorro à seguinte citação: "Problemática não é a concorrência entre os indivíduos, mas o fato de se tornarem a si mesmos como referência e se aguçar neles, assim, sua concorrência absoluta. O sujeito de desempenho concorre consigo mesmo e, sob uma coação destrutiva, se vê forçado a superar constantemente a si próprio. Essa autocoação, que se apresenta como liberdade, acaba sendo fatal para ele." (p. 99)
Com essa tônica o peculiar Byung-Chul Han apresenta mais um de seus também inusitados trabalhos de filosofia. Inusitados pela forma de apresentação de seu problema: sempre brevíssima. Temos, nesse sentido, prós e contras: muitos conceitos que o autor coloca em curso ao longo do livro pegam desprevenidos leitores que não tem uma familiaridade mínima com dialética ou com conceitos de Nietzche e da psicanálise - o autor não perde nenhuma linha discutindo como ele se apropria dos conceitos e os apresenta já articulados. Em alguns momentos, inclusive, creio que Han exagera um pouco no movimento dialético considerando sua proposta de filosofia “enxuta”. Entretanto, os “contras” do livro são justamente o que o torna mais interessante. Desafiando o senso comum da filosofia moderna alemã, que se estende interminavelmente em ressifignicações, Han vai direto ao ponto e, fazendo isso, “assume a bronca” sozinho – em nenhum momento identifiquei qualquer tentativa do autor compartilhar sua responsabilidade ao flexionar algum conceito, tentando se “esconder” à sombra de outrem. Isso torna o livro muito autêntico, sendo as fragilidades do livro suas maiores forças; a dialética, por assim dizer, aplica-se à própria forma da obra. O texto que encerra o livro, transcrição de uma palestra do autor (p. 109-128), é essencial para desanuviar essas distorções formais e deixar clara a proposta de intervenção do autor.
É aqui que passo ao mais importante, ao conteúdo do texto. Não há como negar a pertinência do argumento de Han. Mesmo que em alguns (poucos) momentos o autor se atrapalhe com a relação entre negatividade ou positividade e a alteridade (ossos da dialética), e ainda que tenha enrijecido um pouco a concepção de sociedade disciplinar de Foucault (que é um autor mais “instrumental” do que conceitual), ainda sim o principal foi preservado: a ideia de que não estamos presenciando a supressão do indivíduo, mas sim sua extrapolação em oposição à ideia de coletividade. A oposição, saliente-se, em termos dialéticos, não significa a negação de que vivemos em conjunto; pelo contrário, é justamente a presença extenuante da sociedade que torna possível a negação do outro, em forma de excesso de (auto) positividade. Han alimenta essa problemática por três canais distintos: um, a “base” do trabalho, que reforça a tese do último humano ou “super-humano” nietzchiano como “corpo saudável” e como executor do mero trabalho, que Han alicerça na oposição aristotélica da “vida” e “boa vida” (esse ponto é magistralmente exposto às p. 107-109, que encerra com a provocação: “[Os homine sacri] estão por demais vivos, para morrer, e por demais mortos, para viver”.) O segundo, o “mecanismo de movimento” do livro, que muitos até hoje acreditam ser incompatível com a leitura nietzschiana, é a releitura dos conceitos de mercadoria e mais-valia de Marx (intenção discreta e explicitamente apontada apenas na p. 116, mas que percorre todo o texto). Han aproveita o que há de melhor e descarta o que ainda “emperra” a literatura marxista: leva às últimas consequências a ideia de mercadorização, descartando qualquer possibilidade de que a sociedade das mercadorias possa levar, dialeticamente, à “utopia socialista” (leitura, convenhamos, um tanto datada), para isso reforçando o conceito de exploração via trabalho não apenas pela sua significação econômica, mas pelas suas consequências funestas sobre a psique humana. Aqui se encontra o terceiro e “dinâmico” canal do livro: as apropriações que o autor faz da psicanálise enfocando os processos de depressão e hiperatividade que repercutem no esgotamento da capacidade contemplativa humana. O problema da sociedade de desempenho está além das esferas econômica ou sociológica, cujas barreiras já foram há muito superadas pela violenta lógica de reprodutibilidade dos padrões de expropriação; o desempenho (não mais somente o “lucro do capital”) apresenta-se com tal autoridade que um antigo alerta sobre a barbárie iminente de nossa “civilização” nunca pareceu tão próxima.
Deve-se lembrar que discussões de corte psícanílitco-nietzchiano tendem perigosamente à exagerada admiração pela “antiguidade” na figura da polis grega, se esquecendo que ela estava apoiada nas costas do trabalho escravo. Han, todavia, foi suficientemente prudente para salientar o aspecto da lentidão (o que nos remete à belíssima obra homônima de Milan Kundera) da contemplação como defesa à hiperatividade, esta que, incessantemente, assedia o espaço de auto-reflexão (atemporal por natureza) para ocupá-lo com o espaço de desempenho (que não é apenas temporal, mas dura e cronologicamente temporal). A sensação de tempo “livre” oculta a supressão do tempo “suspenso”, o “tempo da arte”, imputando-lhes a qualidade de “tempo perdido”. É nisso que Han insiste: o tempo “produtivo” é considerado preferível ao tempo “ocioso” nessa sociedade de desempenho. Quanto mais persevera essa ideia do tempo dito “perdido”, mais próximos estamos da derradeira conversão daquela que seria a capacidade que nos torna verdadeiramente “sencientes” em capacidade meramente produtiva – o já mencionado super-humano de Nietzche. Em suma, o advento da individualidade em associação ao desempenho representa a possibilidade antitética de supressão da própria individualidade; individualidade não no sentido raso de “unidade componente”, que é a própria síntese dialética da sociedade de desempenho (tão bem registrada pela imagem do “brick in the wall” do Pink Floyd, recentemente difamada pelo “esclarecido” eleitorado brasileiro), mas no sentido de singularidade e autenticidade, a tese dialética do que é, justamente, ser humano em sua mais pura forma.
PS.: cheguei a este livro pelas referências da excelente peça teatral “Os insones”, dirigida pelo também excelente Kiko Marques (de “Sintia” e “Do cais ou a indiferença das embarcações”). Recomendo a leitura do livro junto à audiência da peça.
Ester 16/11/2018minha estante
Comentários tão lúcidos e próprios quanto o próprio livro. Encantadoramente esclarecedor. É como uma re-leitura para os que têm alguma limitação de entendimento, como eu, por exemplo. Obrigada. Gustavo.


Matheus 11/05/2021minha estante
A melhor resenha que já li no skoob.


Gustavo.Romero 11/05/2021minha estante
Valeu Matheus. Fico honrado. Espero que curta a leitura, é de deixar os cabelos arrepiados.


Hügø 23/05/2021minha estante
Resenha mais que perfeita!! Nossa, o que deveria estudar para conseguir ter tal nível de compreensão??


Gustavo.Romero 30/05/2021minha estante
Eu diria que nada ra. Se seguir seus sentimentos, certamente perceberá que é rotineiramente agredido por essa exigência de ser "produtivo ". É a isso que Han está apelando durante todo o livro.


Hügø 30/05/2021minha estante
Realmente! Ficou bem perceptível esse reconhecimento de produtividade, apesar do vocabulário técnico, a idéia do livro ficou bem clara!
Obrigado obrigado!


stelajanuzzi 16/06/2021minha estante
Muito boa sua resenha! A citada obra de Milan Kundera seria qual?


Gustavo.Romero 16/06/2021minha estante
Oi Stela. O livro do Kundera é "A lentidão " (de 1995, se não me engano). Curtinho e enigmático rs


stelajanuzzi 16/06/2021minha estante
Obrigada!! Só li A insustentável leveza do ser mas fiquei tao apaixonada que pretendo ler outras obras do autor


Flor.Braz 04/10/2021minha estante
Ótima resenha, colocou em palavras muitas das sensações que tive ao ler o livro!

Se me permite, queria trazer para discussão um ponto que me peguei discordando tanto no livro, quando em sua resenha - enquanto o argumento de que a auto-exploração supera a exploração do outro me parece válido em países "de primeiro mundo", países ricos onde as políticas de bem estar social ainda perduram, não consigo enxergar o mesmo recorte aqui, senão para uma pequena fatia mais "privilegiada" que consegue com seu trabalho receber um salário digno, suficiente para todas as necessidade básicas, além de conseguir gerar reservas de emergência.

A grande maioria da nossa população sofre com a sombra do desemprego, da fome, que leva a sujeição a salários miseráveis e/ou aos novos mecanismos de super exploração do trabalho (Uberização).

Portanto, enxergo que, ainda que a sociedade do desempenho tenha sim muito impacto social e psicológico na nossa população, o principal mecanismo para a exploração ainda é econômico.

Partindo desta perspectiva, a visão de Marx segue a pleno vapor - é principalmente através do domínio econômico que a classe dominante exerce sua exploração sobre a classe trabalhadora.


Gustavo.Romero 04/10/2021minha estante
Oi Flor!
Ótimas observações, e acrescento: eu tanto concordo que entendo que os mecanismos de exploração e auto-exploração se complementam. Afinal, no momento que a exploração puramente econômica encontra o limite mínimo dda taxa de reprodução da mão de obra, o capital dá um passo além para cooptar o mecanismo psíquico do sujeito a ponto dele crer que o "lazer" ou descanso físico que, a princípio, está no cálculo da taxa de reprodução, é um ato de "preguiça ". O ócio tornou-se aquilo que foi a lepra durante tanto tempo - dispositivo de segregação através de algo alheio à própria vontade da pessoa. A culpa do doente ou da pobreza do trabalhador é do próprio doente (não da bactéria) ou do "luxo" de dormir 6 hs por noite.


Heloisa.Agibert 16/12/2021minha estante
Muito bom e obviamente atual e nos mostrando o efeito e consequências dessa realidade.


Ronney.Reis 14/01/2022minha estante
Excelente resenha. Comentários lúcidos e que nos auxiliam na reflexão do livro.


anapachecoeumsm 07/07/2022minha estante
Resenha maravilhosa, esse livro é um dos primeiros contatos que tive com filosofia e sociologia fora da sala de aula e internet, achei muito legal como você abordou os pontos fortes e fracos do livro!




annacsfraccaro 26/01/2022

Muitas reflexões!
Achei um livro interessantíssimo, porém, em alguns momentos a leitura fluía melhor e outros era como se eu fosse analfabeta.
É um livro que traz muitas reflexões sobre os tempos atuais, que faz altas críticas ao capitalismo e outras coisas.
É um livro que precisa ter uma certa bagagem acadêmica e filosófica pra ler.
Recomendo para quem quer refletir sobre o mundo em que vivemos.
Ivan 27/01/2022minha estante
Parece interessante, foi para a minha lista!


Igor.Camilo 25/02/2022minha estante
Sua resenha reflete a experiência que tive na leitura!




Vênus_Alice 13/07/2023

Sociedade do cansaço
Este é um dos famosos livro de cabeceira (esseciais para a vida), muito pontual e objetivo.
Viemos de uma geração anterior que era paltada na disciplina e delimitação da vida e dos lugares. Já a nossa sociedade tem como prescrição o desempenho, a autenticidade e a falsa ideia de liberdade dentro da autonomia, isso faz com que tenhamos que produzir o tempo todo, absorver milhares de fatos diariamente, estar por dentro de tudo, sem inovar... até que pifamos.

"O depressivo não está cheio, no limite, mas esgotado pelo esforço de ter que ser ele mesmo." O cansaço que nos acompanha vem dessa necessidade da fazer e dar conta de tudo, está todo mundo exausto de tudo e de nós. Estamos tão preocupados e ocupados com a rotina, com o cumprimento de metas e de encaixar em grupos que não conseguimos apreciar e presenciar nada ao nosso redor, não vivemos o momento, não paramos e re-paramos.

Hoje em dia só se é bem visto se morrer de tanto trabalhar, sempre conquistando e progredindo, não abrindo espaço para o negativo, o estranhamento (que também faz parte do crescimento pessoal e, pasmem, da vida).

A falta de repouso inibe o contemplativo.
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Otávio - @vendavaldelivros 06/04/2021

“A sociedade do cansaço, enquanto uma sociedade ativa, desdobra-se lentamente numa sociedade do doping. Nesse meio-tempo, também a expressão negativa “doping cerebral” é substituída por ‘neuro-enhancement’ (melhoramento cognitivo).”

É muito difícil perceber mudanças sociais significativas em nosso dia-a-dia. A tecnologia vai evoluindo, nossos hábitos e nós vamos nos acostumando. O que antes era inviável, vira rotineiro. O que antes era ficção-científica se torna prática normal e costumeira. Assim, vamos nos envolvendo e não percebemos que determinadas mudanças podem não ser completamente positivas.

Em Sociedade do Cansaço, o coreano Byun-Chul Han traz um panorama do que vivemos hoje com as cobranças diárias que ajudaram a desenvolver doenças e condições psicológicas que antes não eram comuns. Mesmo lançado em 2010, o livro pinta um retrato que hoje é cada vez mais claro de tudo que vivemos. Se antes tínhamos uma sociedade disciplinar, hoje vivemos em uma sociedade que tem na liberdade individual seu carro-chefe.

A grande questão aqui é que a liberdade se tornou uma grande prisão. Somos livres para sermos o que quisermos, então somos cobrados cada vez mais de sermos a melhor versão possível de nós mesmos. E diferente de uma cobrança externa, essa feita pela liberdade é interna, particular e crescente. Somos desafiados por nós mesmos em sermos seres humanos livres de defeitos, com uma história perfeita.

Soma-se a essa cobrança o avanço das redes sociais e como elas estimulam ainda mais o nosso próprio ego. Vemos nos stories e no feed famílias e relacionamentos perfeitos, trabalhos dos sonhos, férias maravilhosas, mas nos esquecemos que essas mesmas publicações são um retrato de momentos, não de todo o tempo. Assim, nos cobramos em sermos, também, o ser perfeito a ser exposto.

Curto, mas repleto de fundamentação e de informações essenciais para a compreensão, Sociedade do Cansaço é uma leitura necessária para entendermos os tempos que vivemos. Mais do que isso, é um livro que nos ajuda a enxergar a sociedade que vivemos e como podemos ser livres de verdade, sem prisões de nossas próprias exigências.

site: https://www.instagram.com/p/CNTGZA7D1cw/
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Ceci 09/12/2021

E que cansaço
Realmente a sociedade do cansaço está desgovernada. O que fazemos com a pseudo liberdade? Temos que refletir como conduzimos nossas vidas
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Ariane.Monteiro 04/09/2022

O autor fala sobre como estamos atolados numa sociedade de excessos que acaba levando boa parte da humanidade à depressão e à sensação de fracasso por não atingir um desempenho que seja considerado bom.
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13marcioricardo 14/10/2022

Vida do século XXI
A sociedade do cansaço fala sobre a exaustão da vida moderna, em que temos que dar conta de tudo. Carreira profissional, família, a casa, etc. Pensei que ia achar um livro mais tranquilo, porém não é uma obra assim tão fácil. Exige alguma reflexão, mas não é tão difícil assim. O autor acaba dialogando com vários nomes, uns mais conhecidos que outros, entre os quais estão Nietzsche, Freud e Arendt.

Sinceramente, acho que qualquer pessoa que não ande a dormir já pensou no que foi escrito aqui. De fato, a correria da vida atual não é fácil. Dar conta de tudo, viramos máquinas e não temos tempo pra nós.

Penso que o autor teve um pouco de dificuldade em sair da sua bolha. Quer dizer, por muito que hajam cada vez mais donos de empresas, senhores de seus próprios negócios, autônomos e afins, os trabalhadores por conta de outrém continuam a ser a grande maioria, parece-me.. Identifica um problema real, mas não aponta uma solução concreta.

Com tanto desemprego, com tantos países subdesenvolvidos, em plena era digital, em que existem máquinas pra tudo, com tanto desperdício de produtos; com certeza trabalhar menos horas deixaria muita gente feliz e um mundo mais equilibrado.

Por isso é uma obra que vale a pena ler, que vale a reflexão pelo confronto da vida ativa vs vida contemplativa e também pela ideia de deixarmos de ser escravos dos outros pra sermos de nós próprios.
rfalessandra 14/10/2022minha estante
A impressão da leitura, de uma boa reflexão




anicca 15/07/2021

O excesso de elevação do desempenho leva ao infarto da alma
Neste livro, Byung-Chul Han, filósofo coreano radicado na Alemanha, argumenta que o século XXI passou por um rompimento de paradigma e que, se antes vivíamos a sociedade do controle, atualmente vivemos "a sociedade do cansaço". Diferencia-se da configuração social anterior, porque enquanto aquela é demarcada por rigidez de valores e horários, controle exercido pela pressão social e imposição explícita de regras, esta camufla seus sórdidos objetivos sob um verniz de prosperidade: o sujeito moderno nada mais é que um hamster na rodinha, perseguindo o inalcançável infinitamente. 

A hiperprodutividade, uma das características principais da sociedade do desempenho, se veste com uma máscara de liberdade e convida o sujeito moderno a assumir-se senhor de si, a se desvincular de vínculos empregatícios formais e a conduzir seus horários e projetos por conta própria. Contudo, na verdade, o indivíduo age sob a influência escamoteada da exigência contínua, mantendo-se constantemente em atividade sob o pretexto de "ser útil". Assim, acaba cedendo à exigente demanda por produção e se convertendo em um escravo, mas como as cobranças agora partem de si mesmo, já que acredita estar sendo guiado pelos próprios interesses, torna-se o próprio algoz. É vítima e agressor ao mesmo tempo. 

A palavra-chave que define a sociedade do cansaço é: positividade. Corrompe a mentalidade do indivíduo e o aliena quanto às suas necessidades ao convencê-lo, por meio de apelos midiáticos ou de pares já mimetizados pelo modelo, de que precisa daquele aparelho eletrônico para ser feliz, ou de outro ser humano para ficar completo, ou de iniciar/cumprir mais uma meta e mais um projeto para se satisfazer. Oferecer tantos estímulos quanto for possível, mantendo-o ativo e alerta, é uma forma sutil de violência, pois satura e exaure, mas ele sussurra para si que faz parte do processo natural da evolução humana e tecnológica e segue em frente. E o ciclo se retroalimenta: o ambiente disfuncional promove carências infundadas, desmantela o vigor das pessoas envolvidas e, ao mesmo tempo, sugere que é algo típico e natural.

Com isso, as nuances entre trabalho e diversão se diluem a ponto de o segundo momento perder o sentido e ser subjugado em prol do primeiro, afinal, se você não gerar lucro como deveria, poderá ser instantaneamente substituído. E por que não estudar em vez de ver o filme? Como encaixar aquele curso de aperfeiçoamento na rotina? Então, uma onda de pessoas é induzida a perseguir metas cada vez maiores sem que o devido acompanhamento psicológico seja fornecido, daí surge o esgotamento, as síndromes nervosas e a insistente noção de fracasso por não entregue "tanto quanto poderia". E é esse o maior êxito da sociedade do desempenho: adestrar o indivíduo para querer consumir e produzir sempre mais, mesmo quando seu organismo dá sinais de falência.

Para Han, TDAH (transtorno de déficit de atenção e hiperatividade), depressão e a síndrome de burnout são consequências diretas dessa configuração social e econômica, pois que ela impõe um estilo de vida descaracterizado aos indivíduos, e estes, ameaçados pelo fantasma do desemprego, têm sentido necessidade de desenvolver "habilidades paralelas", de se preparar para suprir eventuais necessidades mesmo sem haver recompensa financeira. Além disso, devido à absorção do tempo que poderia destinar ao autocuidado pelo mercado, as pessoas tendem a se sentir deslocadas e incompreendidas e, por conseguinte, a se isolar, a ter menos resiliência e a se cansar mais rápido do contato humano, gerando assim um ciclo vicioso. 

E como se as chagas psíquicas e a fratura das relações humanas não bastassem, a sociedade do cansaço compromete a atenção plena, profunda. Submete o sujeito do desempenho a adotar  o formato disperso e fragmentado, denominado multitasking. Com ele, depositamos atenção em várias tarefas ao mesmo tempo, o que, em tese, acelera nossos processos mentais e práticos e mantém nosso tempo rentável. Mas, a longo prazo, mina nossa capacidade de resiliência, de determinação e de perseverança, nos tornando sensíveis em excesso (ou até inaptos) ao tédio, a concentrar o foco somente em um objetivo, a destinar atenção prolongada a algo, entre outros. Byung-Chul o compara ao comportamento animal, que se divide entre buscar alimento, manter-se vivo e proteger a prole, isto é, não passa de um mecanismo de sobrevivência, e seres humanos são dotados de criatividade, pensamento elevado e cultura complexa para se resumirem a subsistir. 

Para superar a sociedade do cansaço, ele sugere a assunção de uma vida contemplativa, que é caracterizada pela autonomia do sujeito em relação ao meio em que vive, isto é, administrar os próprios planos e metas com base em suas necessidades pessoais, não em relação ao que o externo impõe. Consiste em deixar de realizar diversas tarefas ao mesmo tempo sob a pressão extenuante da produtividade, em desenvolver a capacidade de contemplar seu entorno, em dialogar com o tédio e dele extrair epifanias, em reeducar sua forma de perceber e de lidar com o mundo e em assumir sua individualidade autêntica, intransferível. 

Dito isso, enquanto o lia, muito pensei em um poema compartilhado por Guilherme Terreri em seu canal no YouTube, o Tempero Drag. Reproduzirei-o a seguir: 

mundo insano (1991)

teu saber são farrapos cobrindo a humilhação 
de uma vida à tua frente sem nenhuma condição 
ainda andas e falas, espantalho tão real
és a imagem perfeita da situação atual
foste outrora um elo da corrente que partiu
para trás ficou um todo e à frente um grande vazio
foi tentando aparar as arestas do teu meio 
que vieste a descobrir que o certo é o mais feio
partiste sem rumo e sem fé, te tornaste um desumano 
para poder suportar e partilhar um mundo insano

Ainda no YouTube, há um documentário em que o próprio autor retrabalha os conceitos abordados no livro: https://youtu.be/VbPvH515KoY.

E, por fim, sua leitura envolve camadas elaboradas por outros pensadores, nos quais o autor pauta sua análise acerca da sociedade ocidental contemporânea. Os principais são:
> Vigiar e punir, de Michel Foucault 
> A condição humana, de Hannah Arendt 
> Ensaio sobre o cansaço, de Peter Handke
> Bartleby, o escrivão, de Herman Melville
> Homo sacer, de Giorgio Agamben 
> Humano, demasiado humano, de Friedrich Nietzsche 
> O eu e o id, de Sigmund Freud
Hügø 15/07/2021minha estante
"Sem palavras"(?o?;), necessitarei entender melhor os conceitos utilizados antes de lê-lo... Não sei realmente como dizer mas ótima resenha!


anicca 20/07/2021minha estante
https://youtu.be/Y-nI5VZaU_k aqui um dos conceitos, ó. Acabei de ver.


Hügø 20/07/2021minha estante
Ócio ?
Realmente estou precisando de um tempo somente para isso... Obrigado por me trazer o vídeo!




Eric Rocha - Ersiro 04/01/2024

Uma sociedade cansada e apressada
Terminei em um dia porque não queria arrastar essa leitura para outros. Engana-se quem vê o livro pequeno e curto e ache que é uma leitura mais “facilitada”. A escrita não é acessível e é um texto que eu, por vezes, precisei reler várias e várias vezes um mesmo parágrafo para compreender. É um livro técnico indicado mais aos pares do autor, os filósofos, educadores, atuantes na área de psicologia e sociologia, o que, de certa forma, me decepcionou, pois esperava ser um livro para todo tipo de leitor.

Minha estratégia de leitura se baseou em focar em compreender os momentos-chave do texto, visto que o autor por vezes inicia e dá voltas e mais voltas numa mesma discussão mais técnicas e sisuda que, no fim, só vão servir mais como base para a compreensão mais importante do que ele quer passar a cada capítulo: com isso em mente, nesses momentos-chave, me retive nos trechos, fiz marcações e comentários de compreensão, abstração ou de minhas próprias vivências sobre o tema, ignorei o que não concordava com o autor e explorei o texto para além do livro, tomei para mim o que foi proveitoso e expandi para minha própria vivência, na espera de eu poder levar as coisas de uma maneira mais tranquila e lenta, pois há muitos pontos proveitosos que o autor levanta; nesse sentido, além das marcações e comentários, criei trechos para mim mesmo baseado nisso, como “mantras” para me atentar quando estiver em desequilíbrio e sempre ter isso em mente. É um livro que pode servir não como uma verdade absoluta (como muitas coisas na vida), mas como um texto inclusive a ser contestado a partir de suas próprias vivências enquanto leitor no século XXI, como um texto a ser incrementado com sua jornada e visão de mundo, que é o caso do tipo de leitura que fiz.

A maior parte das referências que ele traz são de autores que escrevem em alemão, tornando o viés de visão do autor enviesado e eurocentrado. A partir disso, trata de assuntos de uma maneira excludente a muitas peculiaridades, características, vivências e sobrevivências em outras partes do mundo e até mesmo do ocidente. Um exemplo é o trecho “O sujeito de desempenho está livre da instância externa de domínio que o obriga a trabalhar ou que poderia explorá-lo. É senhor e soberano de si mesmo.”, claramente quem é brasileiro e pobre sabe que a realidade não é exatamente essa e os termos não são estes, que o buraco é mais embaixo, temos a pressão e obrigatoriedade do trabalho para sobreviver. Soa quase como se dissesse: olha, o sistema diz que você pode fazer isso e isso (quase como o fruto proibido de Gênesis) e você só fica maluco se aceitar entrar nesse esquema de pirâmide. O que é um absurdo, como se apenas e simplesmente escolhêssemos participar do sistema e não que estamos condicionados a ele. Nesse sentido, o texto do autor por vezes aparenta adentrar no fio tênue de ser liberal, forçando uma visão de mundo focalizada apenas em um grupo específico, o burguês e seus inúmeros privilégios. Esses momentos tornava a existência do livro completamente contraditória, pois há momentos em que ele menciona que trabalhamos para sobreviver, ou seja, precisamos pagar para consumir e somos sim impelidos e obrigados a trabalhar para conseguir renda. Só lá para os dois textos de anexo no fim do livro o autor parece começar a incluir e apontar, por exemplo, o capitalismo e o neo-liberalismo como um dos grandes influenciadores para tais patologias psíquicas.

Ao mesmo tempo que tem capítulos que trazem uma boa reflexão, tem outros completamente dispensáveis que pareciam servir só para incrementar a retórica do autor. Esses dispensáveis, quando claramente não eram proveitosos para mim enquanto leitor e humano (e não pesquisador do assunto), não me esforcei para compreender estritamente 100% do que estava escrito.

Nota 2.
Raissa Barros 04/01/2024minha estante
vish


Brunogallt 05/01/2024minha estante
Ótima análise do livro!
Realmente foi uma leitura decepcionante pra mim




Layla.Ribeiro 27/05/2023

"A vida desnuda, que acabou se tornando radicalmente transitória, reagimos com hiperatividade, com a histeria do trabalho e da produção."
Byung Han traz em seu livro um tema social que ganhou muito ênfase, principalmente durante a essa era em que os Coachs dominaram, de certa forma, a internet ao ajudar a compor a sociedade do desempenho, termo esse muito utilizado pelo autor no decorrer de sua obra. O livro é composto por sete capítulos, na qual os seis primeiros servem de introdução e argumentação para a ideia final do autor. O filósofo utiliza de argumentos como o excesso de positividade, a autocobrança que a sociedade acaba impondo a nós mesmo e um argumento que me chamou bastante atenção foi sobre a falta de fé que nos deixou mais ciente da nossa finitude, logo queremos fazer tudo de forma apressada. “A possibilidade da morte impõe limites ao agir e torna a liberdade finita. [...]A perda moderna da fé, que não diz respeito apenas a Deus e ao além, mas é própria realidade, torna a vida humana radicalmente transitória. Jamais foi tão transitória como hoje. Radicalmente transitória não é apenas a vida humana, mas igualmente o mundo como tal. Nada promete duração e subsistência. Frente a essa falta do Ser surgem nervosismos e inquietações.” Uma outra parte que achei bem interessante nesse ensaio foi sobre a análise que o escritor faz sobre o personagem Baterlby de Herman Melville que o excesso de positividade o fez adoecer abandonando seu próprio eu. Embora, é um livro com discussões ricas, eu tinha muitas expectativas sobre essa obra e achei que ficou faltando algo a mais, além de também ter imaginado que seria uma leitura acessível tive muitas dificuldades inicialmente de entender o que o filósofo propunha em suas análises e demandou muito da minha atenção e releitura aos parágrafos.
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Onyxia 13/03/2022

Sociedade do esgotamento
"O sujeito de desempenho explora a si mesmo, até consumir-se completamente (burnout)."
O tema do livro é atual e explora mostrar ao leitor a situação da nossa sociedade atual e como nós forçamos sempre ter positividade em nossas vidas sendo um dos maiores vilões para nós devido a auto exploração.
Para mim, a leitura foi densa. Precisei pesquisar algumas coisas no decorrer da leitura. Mas de modo geral é um bom livro.
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B.norte 12/06/2022

Passo...
É um livro que (ainda bem) não tenho ele na versão física. Só li por estar disponivel no kindle unlimited.
Não é que ele seja ruim, não o é, mas sinceramente... pra mim também não foi um bom livro.
8 meses de leitura e pouca coisa entrou na minha cabeça.

A sensação que tive foi a de ler diversos temas dentro do tema geral, mas que nenhum deles foram realmente finalizados. Não gosto dessa sensação. Resumo da obra: não é pra mim, não curti, não seria um livro que recomendaria e não fiquei com vontade de ler outras obras do autor.
Fred 13/06/2022minha estante
8 meses? Caraca!!!
Isso explica o pq do "cansaço" no título do livro ????


B.norte 13/06/2022minha estante
Sim... acho que comecei com uma expectativa muito alta e não era o que eu pensei que fosse, aí desanimei.


babeatricce 14/07/2022minha estante
a escrita cansa demais! você entende, mas fica com a sensação de não estar entendendo nada


B.norte 15/07/2022minha estante
Sim, foi essa sensação que eu tive... não é que seja um livro ruim, mas senti que perdi tempo, pq o que consegui absorver foi pouca coisa ?


Pedro Braga 27/07/2023minha estante
A versão do kindle na verdade é um resumo da obra. Cheguei a comprar, mas devolvi quando percebi que era um resumo e não a obra completa.




kathrein.oliveira 14/03/2021

Meu primeiro livro filosófico
Um livro doloroso de ser lido. Mas não no sentido de o livro é ruim, mas no sentido de que o livro é uma revelação crua e verdadeira do que nos tornamos com sociedade.

É tão viceral que chega a doer.

Quanto a escrita. Confesso que não achei fácil, é uma escrita pesada e densa, como a maioria dos livros de filosofia acredito. E por ser minha primeira experiência com o gênero tive alguma dificuldade pois é um livro que exige bastante concentração.

Um livro chocante, atual, revelador e incrível!! Vou com certeza ler toda obra do autor.
Livinha 14/03/2021minha estante
Já está no meu carrinho da Amazon!




Agnaldo 02/10/2021

A competição contra seu melhor eu
Foi uma leitura boa, tem bastante aspectos filosóficos, mas não vi nada diferente dos demais. Um dos grandes pontos é a questão da positividade e da individualidade. Ambos são bons se feitos de forma correta, caso contrário vai nos levar a exaustão, pressão, negatividade e outros pequenos detalhes que acumulados de forma errada vai fazer a gente se tornar um vulcão preste a entrar em erupção. Para mim todo conhecimento é bem vindo e esse livro foi muito interessante por mostrar a forma como o mundo mudou nesse século XXI.
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